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Vidas negras importam: Camila Pitanga fala sobre desigualdade e racismo

Saiu no site COSMOPOLITAN:

 

Veja publicação original: Vidas negras importam: Camila Pitanga fala sobre desigualdade e racismo

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Por Camila Pitanga

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A convite da COSMO, a atriz Camila Pitanga nos chama a refletir sobre o alto número de homicídios de negros e negras no Brasil

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Convido você para uma conversa urgente. Existe hoje no Brasil uma realidade que mata uma pessoa a cada 23 minutos. Uma realidade que vitima milhares de jovens todos os anos. Toda uma geração dragada por essa injustiça que tem cara e nome, mas preferimos não discutir. Hoje quero falar com você sobre o assassinato da juventude negra.

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Segundo o Atlas da Violência 2017, feito pelo Ipea, quase 60 mil brasileiros são mortos todos os anos. Um número trágico e que segue crescendo. A maioria, jovens entre 15 e 29 anos. Nesse grupo, os negros têm quase três vezes mais chance de serem vítimas de homicídio. É o que lembra a campanha “Vidas Negras”, da ONU, que quer o fim da violência contra os jovens negros no Brasil. Um jovem negro é assassinado a cada 23 minutos — mais de 23 mil por ano.

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Todas as vidas importam, é indiscutível. Nenhuma vida deveria valer mais ou menos, mas não é essa a regra aqui nos trópicos. De cada dez pessoas assassinadas no Brasil, sete são negras. Número digno de guerra e que não se alardeia. Os que ousam falar são menosprezados ou, pior, passam a compor esses dados. Essa é a urgência em denunciar e criar comoção sobre tantos crimes bárbaros que passam despercebidos em nossos noticiários, já tão banhados de sangue.

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Quando eu digo que a vida negra importa, não relativizo a vida dos brancos. Pelo contrário, estou convocando você à luta. Lembrando a você, irmão e irmã, o óbvio: que a vida do negro também importa e que estamos abandonados. Estou gritando por uma união que representa “socorro” em um país onde todo jovem negro parece ter um alvo na testa.

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O Senado brasileiro já reconhece esse cenário inaceitável. Nosso país foi denunciado diversas vezes por essas violações aos direitos humanos. E não há empenho em reverter esse quadro. Nenhum de nossos governos jamais deu importância ao investimento na inteligência de nossas polícias, nunca se comprometeu com o fim do tráfico de armas ou nem sequer cogitou rever nossas políticas ultrapassadas de combate às drogas. O resultado não poderia ser outro além desse verdadeiro caos em que estamos mergulhados. E se continuarmos nos calando, se não gritarmos que essas vidas importam, seguiremos enterrando nossos filhos.

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Talvez o mais triste seja perceber que não há “um culpado”. São vários e incontáveis momentos históricos que tornam isso algo estrutural no nosso país, o último a abolir a escravidão. A Lei Áurea, uma canetada, não garantiu nenhum tipo de compensação aos homens e mulheres que foram sequestrados e torturados. Fomos abandonados sem educação, sem dinheiro, sem comida, sem emprego, sem casa… Quem ontem era propriedade virou resto. Fomos isolados em guetos, favelas e periferias. Ou, como eram chamados, nos “bairros africanos”. Esse contexto diz muito sobre o nosso presente. Negros excluídos em lugares sem o básico para sobreviver. A única mão que o Estado brasileiro estendeu à população negra, até o momento, é a que nos açoita.

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Hoje, o que existe é uma ideia de maquiar nossas vivências com a falácia “Ah, que bobagem! Somos todos iguais”, “Parem de se vitimizar”. Não, não somos todos iguais. E não, não estou me vitimizando. Como os dados mostram, no meu país a cor da pele determina quem tem três vezes mais chance de ser assassinado. Que igualdade é essa?

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A história da pele negra, daqueles que vieram antes de mim, me torna diferente. E apresentar a realidade, pedir respeito e conclamar a sociedade a lutar conosco não é vitimismo. Gritar pela própria vida, definitivamente, não é vitimismo.

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Mantenho a esperança de reverter esse quadro, de um futuro mais igual. Vejo uma juventude que sobrevive às estatísticas e constrói sua própria narrativa. Que busca o diálogo. Uma juventude que resiste, que se orgulha de sua história e é consciente de sua importância.

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Ser brasileiro é exaustivo para todos nós. Ser brasileiro e negro é quase insustentável! O negro é marginalizado. Do trabalho ao lazer, da educação às relações afetivas. Morre apenas por ser negro. Aos montes. E isso não é uma suposição, fake news ou opinião. É estatística. Dados e mais dados comprovam o que falo. O mundo assiste incrédulo à violência brasileira e à matança desenfreada das pessoas pretas deste país. E o que fazemos?

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É urgente nossa mobilização. É urgente a conscientização de todos para essa realidade dura. Precisamos construir um novo projeto de Brasil que seja efetivamente de todas e de todos nós. Um Brasil que não mate seus filhos.

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Mexer na estrutura social, implementar políticas públicas que diminuam a desigualdade social e racial e, consequentemente, a violência. Todos nós, ou a maioria, pelo menos, queremos um país justo para todos, sem distinção de cor, classe ou credo. Eu clamo ao Brasil: Pare, por favor. Pare de matar a gente! Vamos pensar sobre a nossa gente!

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Marielle Franco alertou, foi ouvida e, por ser tão ouvida, foi morta; mas jamais silenciada. Não posso finalizar essas palavras sem citar essa mulher negra, nascida e criada no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, defensora dos direitos humanos, socióloga, mestra em administração pública e vereadora do Rio. Seguimos na luta, como estamos acostumados. E também não acredito que seja possível mudar esse cenário sem você contribuindo com isso. Te convido a vir junto, a ser responsável pela garantia de que estaremos presentes e vivos, o que em muitos casos não é a mesma coisa.

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Marielle, presente. Camila, presente. Todas as vidas negras, presentes.

 

 

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