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Veja publicação original: Vera Macedo, a dona da crença de que só há liberdade com autonomia financeira
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Ela já foi garçonete, motorista de carro de som, babá e revendedora de planos funerários, roupas, cosméticos e bijuterias: “Eu tive que me virar”, conta ao HuffPost Brasil.
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Aos 51 anos, Vera Macedo traz consigo um semblante de força e tranquilidade. Daqueles de quem já superou inúmeras dificuldades a ponto de ser capaz de tirá-las de letra e transformá-las em história. Ela nasceu em São Paulo, mas cresceu em Acajutiba, sertão da Bahia, e talvez seja daí a origem da força que carrega em seus olhos. E tudo o que conquistou hoje foi junto com ela, a força. Ela já trabalhou como garçonete, motorista, babá, revendedora de roupas, bijuterias, cosméticos e até de de planos funerários. Mas esse é só uma parte de quem ela é. “Desistir nunca foi uma opção para mim”, conta em entrevista ao HuffPost Brasil.
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Aos 13 anos, Vera já cuidava dos 6 irmãos e vendia cosméticos para ajudar a sustentá-los. É claro que ela gostaria de não ter precisado fazê-lo, mas teve sua infância roubada pelas circunstâncias. “Éramos 7, não tinha dinheiro pra sustentar todo mundo. Eu precisava me virar”, conta, sem nenhuma aspereza. Aos 17, ela se mudou pra Salvador – usando suas próprias palavras, “com a cara e a coragem”. Na cidade grande, trabalhou como babá em uma casa de família enquanto cursava o ensino médio à noite em uma escola da rede estadual. “Eu comecei a trabalhar cedo porque eu não tinha uma casa pra morar em Salvador”. Essa foi a primeira vez em que ela precisou recomeçar.
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Desistir nunca foi uma opção pra mim.
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Seu segundo emprego na capital baiana foi em uma loja de artesanato no Mercado Modelo. Na época, seu salário era de 50 centavos por semana. “Não dava nem pro transporte: eu usava os vales-transportes pra ir à escola, e ia pro trabalho à pé”. Todo esse esforço estava empenhado em um objetivo, que sempre foi o norte de vida de Vera: ter autonomia. Ter uma família, entretanto, também era um sonho para ela. Conheceu seu único marido numa roda de violão e a o casamento durou 30 e rendeu 2 filhas, hoje adultas, e 2 netos.
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Quando a 1ª filha nasceu, seu casamento estava em crise e a hipoteca estava atrasada. “Recebi uma carta de despejo. Estava sozinha com uma filha de 2 anos e em breve ficaria sem teto”, lembra. Foi então que resolveu revender bijuterias de porta em porta e, como não tinha quem cuidasse de sua filha, sempre a carregava nos braços. Com o suor do próprio rosto, garantiu seu teto e o de sua filha. Essa foi a segunda vez em que precisou recomeçar.
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Já recomecei do zero várias vezes, e sei que ainda vai ser preciso recomeçar.
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Foi então que ela e o marido se mudaram para Sapeaçu, uma pequena cidade no interior da Bahia, e foi preciso pensar em outra maneira de manter o sustento, agora longe da cidade grande. Foi então que ela decidiu revender roupas nas zonas rurais da cidade: mais uma vez de porta em porta, levava uma mala cheia de calças, blusas, vestidos e jaquetas. Viveu alguns anos na cisade até se divorciar do marido e mudar-se para Alagoinhas, também no interior da Bahia, onde vive atualmente. Foi a terceira vez que precisou recomeçar.
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Lá, trabalhou como revendedora de plano funerário, garçonete e motorista de carro de som, até vir a se tornar a primeira mulher motorista de aplicativo da pequena cidade, que está desacostumada a mulheres em postos de trabalho ditos “masculinos.”
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“Só ouvi falar de uma motorista de ônibus mulher em Alagoinhas até hoje. De aplicativo, eu sou a única”. Ela diz que muitas clientes ficam satisfeitas quando descobrem que serão transportadas por mulheres. “Elas ficam mais seguras, mais confiantes.” E não só isso: elas têm a sutil confirmação cotidiana de que lugar de mulher é onde ela quiser.
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Eu sempre valorizei isso de ganhar meu próprio dinheiro, e honestamente.
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Perguntada sobre qual teria sido a lição mais valiosa que aprendera, aquela que procura transmitir para as filhas, ela responde, sem titubear: “A melhor coisa é a gente não depender de ninguém. E não existe autonomia sem trabalho duro”. De autonomia, recomeço e muito trabalho ela entende.
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Ficha Técnica #TodoDiaDelas
Texto: Nathali Macedo
Imagem: Juh Almeida
Edição: Andréa Martinelli
Figurino: C&A
Realização: RYOT Studio Brasil e CUBOCC
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