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Veja publicação original: Tendências suicidas de crianças refugiadas preocupam Nauru, pequena ilha do Pacífico
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Por Mridula Amin e Isabella Kwai
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8.out.2018 – Atendente do Médicos Sem Fronteiras com criança refugiada em Nauru
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Ela tinha 3 anos quando chegou a Nauru, uma criança fugindo da guerra no Sri Lanka. Agora, Sajeenthana tem 8. eu olhar é vazio. Às vezes ela bate nos adultos e fala com tranquilidade sobre a morte.
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“Ontem eu cortei minha mão”, conta ela, na remota ilha do Pacífico para onde foi enviada pelo governo australiano após ser resgatada no mar. Ela aponta para uma cicatriz em seu braço. “Um dia vou me matar. Pode esperar, quando eu encontrar uma faca. Não me importo com meu corpo.”
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O pai tentou acalmá-la, em vão. “É igual estar em uma guerra ou aqui”, conta.
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Sajeenthana é uma dentre os mais de 3.000 refugiados e requerentes de asilo que foram enviados para centros de detenção além da costa da Austrália desde 2013. Nenhuma outra política australiana é tão condenada por ativistas de direitos humanos do mundo e tão fortemente defendida pelos líderes do país, que há muito argumentam que ela salva vidas, ao dissuadir contrabandistas e imigrantes.
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Mas agora o desespero atingiu um novo nível, em parte devido aos Estados Unidos. Sajeenthana e seu pai estão entre as dezenas de refugiados em Nauru que deveriam ser transferidos como parte de um acordo da era Obama que o presidente Donald Trump relutantemente concordou em honrar, permitindo o reassentamento de até 1.250 refugiados dos campos além da costa da Austrália.
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4.set.2018 – Refugiados em Nauru
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Segundo funcionários americanos, cerca de 430 refugiados dos campos já foram reassentados nos Estados Unidos, mas pelos menos 70 pessoas foram rejeitadas nos últimos meses. Isso inclui Sajeenthana e seu pai, refugiados tâmeis que fugiram da violência no país, após o governo do Sri Lanka esmagar uma insurreição tâmil.
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Uma porta-voz do Departamento de Estado americano não respondeu às perguntas sobre as rejeições, sob o argumento de que os refugiados em Nauru estão sujeitos aos mesmos procedimentos de seleção que outros refugiados de todo o mundo.
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O Departamento de Assuntos Internos da Austrália argumenta que Nauru dispõe de “avaliação e tratamento apropriados de saúde mental”.
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Mas o que está claro, segundo médicos e requerentes de asilo, é que situação vem deteriorando há meses. Em Nauru, sinais de crianças suicidas começaram a surgir em agosto. Dezenas de organizações, incluindo a Médicos Sem Fronteiras (que foi expulsa de Nauru em 5 de outubro), soaram o alarme. E, com a diminuição da esperança de reassentamento nos Estados Unidos, o governo australiano foi forçado a ceder: no início do mês, as autoridades disseram que trabalhariam para retirar todas as crianças de Nauru para tratamento até o Natal.
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Mais de 90 crianças foram transferidas desde agosto (Sajeenthana foi evacuada logo após a entrevista), mas ainda restam cerca de 20 delas em Nauru, centenas de adultos e nenhuma solução de longo prazo.
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4.set.2018 – Quarto de adolescente no campo de refugiados de Nibok, em Nauru
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As famílias enviadas para a Austrália para cuidados não sabem se serão enviadas de volta a Nauru. Alguns pais, deixados para trás enquanto seus filhos são tratados, temem nunca voltar a vê-los caso peçam por reassentamento nos Estados Unidos, enquanto os requerentes de asilo de países proibidos pelos Estados Unidos, como Irã, Síria e Somália, não têm nem mesmo essa possibilidade.
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Para todos os requerentes de asilo que passaram a chamar Nauru de lar, os efeitos psicológicos persistem.
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“Eu vi sangue, estava por toda parte”
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Nauru é uma pequena ilha-nação de cerca de 11 mil habitantes que pode ser percorrida de carro em apenas 30 minutos. Uma linha de mansões dilapidadas ao longo da costa sinaliza o rico passado da ilha. Nos anos 70, era uma nação rica em fosfato com renda per capita que só perdia para a da Arábia Saudita.
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Agora, as reservas de fosfato estão virtualmente esgotadas e o país depende em excesso da ajuda australiana, responsável por 25% do produto interno bruto de Nauru no ano passado.
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Matthew Batsiua, um ex-legislador nauruano que ajudou a orquestrar o arranjo de centros de detenção, disse que visava ser uma solução de curto prazo. Mas é difícil largar o hábito. “Nossa principal renda é controlada pela política externa de outro país”, conta.
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Em Topside, uma área de carros velhos e arbustos empoeirados, fica um dos dois centros de processamento que abrigam cerca de 160 detidos. Centenas de outros vivem em campos comunitários de casas modulares. Eles foram transferidos de tendas compartilhadas em agosto, antes do Fórum das Ilhas do Pacífico, uma encontro intergovernamental do qual Nauru foi sede neste ano.
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Sukirtha Krishnalingam, 15, conta que os dias são um tédio repetitivo enquanto ela e sua família de cinco pessoas, refugiados certificados do Sri Lanka, aguardam para saber se os Estados Unidos os aceitarão. Ela se preocupa com seu problema cardíaco. E tem pesadelos. “Ela grita à noite”, revela seu irmão, Mahinthan, 14.
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No ano passado, a conversa sobre suicídio na ilha se tornou mais comum. Homens jovens como Abdullah Khoder, um refugiado libanês de 24 anos, diz que a exaustão e desesperança têm um preço. “Eu cortei minhas mãos com lâminas por estar cansado”, revela.
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Ainda mais alarmante: as crianças agora comentam suicídio como se fosse uma tempestade. Desde 2014, 12 pessoas morreram após serem mantidas nos centros de detenção da Austrália em Nauru e na Ilha Manus, parte de Papua-Nova Guiné.
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Christina Sivalingam, uma menina tâmil de 10 anos em Nauru, falava com naturalidade em uma entrevista sobre ver uma morte, a de um homem iraniano, Fariborz Karami, que se matou em junho.
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“Nós descemos do ônibus escolar e vimos o sangue, estava por toda parte”, ela conta, com calma. Foram precisos dois dias para limpá-lo. Segundo ela, seu pai também tentou suicídio depois que seu tratamento para um problema de tireoide foi adiado.
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Ver alguns de seus amigos serem reassentados nos Estados Unidos enquanto ela espera por sua terceira apelação por asilo apenas a faz se sentir mais solitária. Ela disse não ter mais vontade de comer. “Por que sou a única aqui?, questiona. “Quero ir para outro lugar e ser feliz.”
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Campo de refugiados em Nauru
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Alguns observadores, mesmo em Nauru, se perguntam se as crianças estão se recusando a comer em uma tentativa de forçar a partida, mas profissionais de saúde que trabalham na ilha dizem que as rejeições pelos americanos contribuem para uma rápida deterioração do estado mental das pessoas.
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Beth O’Connor, psiquiatra que trabalha com a Médicos Sem Fronteiras, conta que, quando chegou na ilha no ano passado, as pessoas se agarravam à esperança de reassentamento nos Estados Unidos. Em maio, uma série de rejeições mergulhou o local em desespero. A morte de Karami minou ainda mais a moral das pessoas.
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“Pessoas que ainda tinham algum brilho nos olhos o perderam”, lembra O’Connor. “Elas se sentiram mais abandonadas e deixadas para trás.”
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Muitos dos detidos não mais esperam por um assentamento na Austrália. A Nova Zelândia oferece receber 150 refugiados de Nauru por ano, mas Scott Morrison, primeiro-ministro australiano, diz que considerará a proposta apenas se um projeto de lei for aprovado proibindo as pessoas de Nauru de entrarem na Austrália. Parlamentares da oposição dizem estar abertos para discussão. Enquanto isso, Nauru continua chamando atenção.
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Foto aérea da pequena ilha de Nauru no Pacífico, em outubro de 2018
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“Não vou voltar para Nauru’
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A opinião pública na Austrália está mudando: em uma pesquisa recente, cerca de 80% dos entrevistados apoiaram a retirada de famílias e crianças de Nauru. O governo conservador da Austrália, com a proximidade de eleições, também está começando a mudar.
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“Estamos tratando disso discretamente”, declarou Morrison. “Não estamos agindo de forma ostentosa.” Mas ainda há dúvidas sobre o que ocorrerá a seguir.
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No mês passado, Sajeenthana parou de comer. Após passar 10 dias tomando soro em um hospital nauruano, o pai dela foi informado que tinha duas horas para fazer as malas para a Austrália.
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Falando por vídeo de Brisbane, Sajeenthana estava radiante. “Me sinto muito melhor agora que estou na Austrália”, ela disse. “Não vou voltar para Nauru.”
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Mas o pai dela tem menos certeza. Os Estados Unidos rejeitaram seu pedido de reassentamento em setembro. Há guardas posicionados do lado de fora do quarto de hotel deles em Brisbane e apesar de comida ser entregue diariamente, eles não têm autorização para sair. Ele se pergunta se eles trocaram um tipo de limbo por outro, ou se serão forçados a voltar a Nauru.
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O ministro dos Assuntos Internos da Austrália afirma que as crianças de Nauru não serão autorizadas a permanecer no país. “Qualquer pessoa trazida para cá ainda está classificada como em uma situação transitória”, afirma Jana Favero, diretora de defesa e campanhas do Centro de Recursos ao Requerente de Asilo. “A vida com certeza não se tornará cor-de-rosa assim que chegarem à Austrália.”
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Tradutor: George El Khouri Andolfato
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