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“Recebi um pedido de socorro num papel amassado, e salvei uma mulher torturada”

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE

 

Veja publicação no site original:   “Recebi um pedido de socorro num papel amassado, e salvei uma mulher torturada”

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A técnica em radiologia mineira Cidiane Marra estava no mercadinho do bairro quando recebeu um bilhete da caixa pedindo socorro. Ela fez a denúncia e o dono do estabelecimento, um foragido da polícia acusado de homicídio, com quem a moça era casada, foi preso. Com a ajuda, a vítima finalmente conseguir se libertar do homem que a mantinha presa havia seis anos

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Por Cidiane Marra em depoimento a Kizzy Bortolo

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“No fim de agosto deste ano, passei por uma situação que nunca antes imaginei passar. Cerca de dois meses antes, abriu um mercadinho de frutas e verduras próximo à minha casa e, pelo menos duas vezes por semana, fazia compras lá. Sempre que ia, notava uma moça jovem que ficava próxima ao caixa com a cabeça sempre baixa e um olhar triste, perdido. Atrás dela, no caixa, ficava um senhor com cara de poucos amigos. Ela empacotava as compras e percebi que tinha um bebê de poucos meses de vida em seus braços. Pelo sotaque, percebi também que não eram brasileiros. Logo soube que eram sírios. A moça estava sempre vestida com aqueles vestidos longos e lenços na cabeça, cobrindo todo seu cabelo. Quando eu ia lá, brincava com a criança e a mãe permanecia quieta, retraída e nunca dava nenhum sorriso.

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Na última vez que estive lá, ao chegar no estabelecimento, o senhor idoso estava na porta do mercado conversando com um cliente e ela estava no caixa sozinha com o bebê no colo. Ao me entregar o troco das compras, junto às notas veio um papelzinho amassado escrito por ela. Olhei para o seu rosto e ela fez o sinal de silêncio com o dedo sob a boca. Já no carro, li:  ‘Socorro! Me ajuda! Meu marido me tortura!’. E estava assinado com o nome dela: Rayna. Fiquei perplexa. Bateu uma angústia, uma dor no peito…. Parecia que era alguém da família pedindo ajuda.

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Saí do carro correndo e fui até a padaria que fica ao lado do mercadinho. Mostrei para a gerente e, imediatamente, chamei a polícia, que chegou em menos de 20 minutos. Contei tudo para os policiais, mostrei o bilhete e eles partiram para o estabelecimento. Fui atrás. Lá, Rayna mostrou a eles suas pernas marcadas e muito machucadas. Contou que a amarrava à noite para que não conseguisse se levantar ou fugir. Fora isso, ela ainda estava cheia de queimaduras de cigarro nas costas e nas partes íntimas.

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Os policiais chamaram uma ambulância para leva-la ao hospital, onde ele ficou internada três dias, muito machucada. Ele, por sua vez, foi para a delegacia prestar queixa. Lá, os policiais viram que ele era foragido da polícia e tinha um mandado de prisão por homicídio a cumprir. Foi preso na hora.

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Também tive que dar meu depoimento, pois fui eu que fiz a denúncia. Logo depois, fui ao hospital para saber notícias dela. Vocês não tem noção do forte abraço que Rayna me deu e o quanto me agradeceu por libertá-la daquele homem. Ela me disse que o motivo maior de ter tomado coragem e me pedido ajuda foi que, dias antes, ele havia dito que a filha deles já estava ficando grandinha, “no ponto”. Morrendo de medo, ela resolveu pedir ajuda, pois achou que ele poderia abusar sexualmente da criança.

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A assistente social do hospital, que conversou muito com Rayna antes de eu chegar, me relatou as barbaridades que ela havia sofrido. Soubemos que seu marido tem 76 anos e ela, 19. Ela tem mais 14 irmãos e seu pai a vendeu para esse homem quando ela ainda tinha 13 anos e vivia em Damasco, na Síria.

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Na verdade, eles não se casaram, ele tinha a guarda dela, que era menor de idade quando a trouxe para o Brasil. Antes, eles moraram em São Paulo, onde ele cometeu o homicídio e era procurado pela polícia. No final de 2016, eles foram morar em Brasília, fugindo da polícia.

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Há seis anos, Rayna mora no Brasil com este homem. Aqui, engravidou e teve uma filha, Rebeka. A menina aparentava ser recém-nascida, mas já tinha sete meses quando tudo isso aconteceu. Hoje, está com quase dez meses. A mãe disse que a bebê estava desnutrida, por isso estava tão magrinha.

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Ainda no hospital, muito assustada, calada e falando pouco, Rayna me confidenciou que mercadinho está no nome dela. E disse que todo dinheiro que ganhavam era guardado pelo marido no quarto da casa em que moravam, no fundo do estabelecimento.

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No dia seguinte, a enfermeira do hospital me contou que, por sorte, conseguiram fazer contato com uma tia da Rayna que mora em Goiânia. A tia nem sabia que ela estava aqui no Brasil, pois não tinha nenhum contato com a sobrinha, nem com a família dela na Síria. O contato foi feito através da Embaixada da Síria e a tia foi buscá-la no hospital.

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Rayna e sua filha moram hoje com a tia em Goiânia. Ela anda muito calada e, segundo sua tia me contou, tem picos de depressão. Chora constantemente, está com síndrome do pânico e há dias não quer conversar com ninguém. Segue assustada e com muito medo de tudo e de todos. E eu, acabei ficando próxima à família, me sentindo responsável e com uma agradável sensação de dever cumprido.”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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