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Como resolver um problema se as pessoas no poder não o enxergam?
Neale Godfrey A voz financeira dos baby boomers
Comemoramos o Dia Internacional da Mulher há poucos meses, no dia 8 de março de 2017. O tema deste ano foi “As Mulheres no Mundo do Trabalho em Processo de Transformação: Paridade no Planeta até 2030”, que foi acompanhado pela hashtag #BeBoldForChange (#CrieCoragemParaMudar). O problema é que a maioria das mulheres no planeta acha que isso não passa de mais conversa da boca para fora sobre apoiar a paridade de gênero, sem que haja qualquer engajamento real.
Fatos assustadores por trás da conversa “da boca para fora”
- Segundo o Instituto Gallup, as mulheres hoje recebem 83 cents por cada dólar recebido por um homem. Essa situação “quase não mudou em mais de uma década”.
- Segundo relatório da ONG americana National Women’s Law Center, “as mulheres que trabalham em tempo integral sofrem perda salarial média de mais de US$460 mil ao longo de 40 anos, devido apenas à disparidade salarial. Para compensar por isso, precisariam trabalhar 12 anos mais que os homens.”
- Um estudo da LeanIn.Org e da McKinsey indicou que “as mulheres têm menos probabilidade de receberem a primeira promoção crítica para gerente, por isso muito menos delas acabam trilhando o caminho da liderança e elas têm menos chances de ser contratadas para cargos seniores. As grandes empresas americanas promovem 30% mais homens que mulheres nas etapas iniciais de suas carreiras.”
- As mulheres não estão vendo acontecer os avanços que desejam nos locais de trabalho e por essa razão estão saindo do mercado de trabalho. O Instituto Gallup informa que a porcentagem de mulheres que integravam a força de trabalho dos EUA era de 59,9% em 2000, mas caiu para 56,7% em 2015.
- As mulheres têm grau de instrução superior ao dos homens, segundo o Centro Nacional de Estatísticas Educacionais. No ano letivo de 2013-14, mais de metade dos diplomas de bacharelado (57,1%) foram dados a mulheres, além de 59,9% dos mestrados e 51,8% dos doutorados.
- Em 2015, segundo a Catalyst, “73,1% dos novos cargos de diretoria em empresas do índice S&P 500 eram ocupados por homens e 26,9% por mulheres”.
- As mulheres são as consumidoras mais poderosas do mundo, segundo a Oxfam International. Elas controlam US$12 trilhões, ou 65% dos gastos dos consumidores.
Devemos realmente esperar 170 anos pela igualdade?
Conforme Alan Jope, da Unilever, falando na reunião do Fórum Econômico Mundial deste ano, “as coisas se agravaram em 2016, e a igualdade econômica entre homens e mulheres só será alcançada dentro de 170 anos”.
Para mim, outra descoberta desanimadora, revelando que as pessoas estão perdendo a esperança, foi observada na Pesquisa Multi-Geracional da Western Union, Unlocking Gender Inequality & Education. Quando perguntados sobre que porcentagem “de mulheres e meninas se sentem muito otimistas quanto à possibilidade de alcançar a paridade de gêneros em seu país e globalmente”, apenas um terço se disse muito otimista.
As pessoas no governo são homens brancos e republicanos
É ainda mais deprimente observar que uma pesquisa da PerryUndem, TheState Of The Union On Gender Equality, Sexism, And Women’s Rights, descobriu que muitos homens republicanos, que estão no poder nos Estados Unidos, nem sequer percebem que existe um problema de disparidade de gêneros.
Há uma desconexão preocupante entre a percepção e a realidade. Segundo a pesquisa, 39% dos homens republicanos não veem um problema de disparidade de gêneros e dizem que a igualdade de direitos das mulheres já foi conquistada. Quase dois terços deles (64%) acham que as mulheres têm estabilidade financeira igual ou superior à dos homens, e quase metade (46%) consideram que o número de mulheres em cargos de poder na sociedade é igual ou superior ao dos homens. E 51% os homens republicanos tendem a dizer que o momento atual “é um bom momento para ser mulher na América”.
A agressão sexual não está na pauta
O estudo concluiu ainda que “quatro em cada dez homens (40%) acham que as mulheres gostam de atiçar os homens e depois rejeitar as investidas deles. Três em cada dez (29%) acham que tocar a genitália de uma mulher sem o consentimento dela não é agressão sexual ou não têm certeza se é. Dois terços dos homens republicanos (65%) não se incomodaram com a fala e o comportamento de Donald Trump expressos na fita do Access Hollywood.”
Ainda segundo a pesquisa, “menos de metade dos homens republicanos entrevistados na pesquisa diz que os seguintes fatores afetam os direitos ou a igualdade das mulheres: o machismo (48% consideram que ele afeta a igualdade), a violência contra as mulheres (47%), a responsabilidade desigual por cuidar dos filhos e da casa (36%), o racismo (35%), o acesso ao aborto (34%) e o acesso a métodos contraceptivos (32%). Apenas um em cada quatro homens republicanos (24%) opina que a escassez de mulheres em cargos públicos afeta os direitos e a igualdade das mulheres.”
A transformação precisa vir de nós
Phumzile Mlambo-Ngcuka, diretora executiva da ONU Mulheres, disse: “Queremos construir um mundo de trabalho diferente para as mulheres. Enquanto estão crescendo, as meninas precisam ser expostas a uma gama grande de opções de profissão e incentivadas a fazer escolhas que não se limitem às opções tradicionais de trabalho como empregadas ou cuidadoras, mas incluam trabalhos na indústria, no setor de artes, no funcionalismo público, na agricultura moderna e na ciência.”
Precisamos criar nossas filhas (e nossos filhos) para que entendam que a igualdade é um direito, não um privilégio. Todos nós temos direito a um ambiente seguro e humano em casa e no trabalho. Precisamos poder viver sem medo de não sermos respeitadas e valorizadas, sem medo de não receber o mesmo pagamento que homens por trabalho igual aos deles e de não termos acesso ao ensino e à formação profissional.
A Prêmio Nobel da Paz Malala Yousafzai expressou isso com mais eloquência. “Não podemos vencer quando metade de nós é impedida de avançar.” Precisamos todos abraçar o ditado chinês antigo segundo o qual “as mulheres sustentam metade do céu”, entendendo que essa é de fato a realidade.
Publicação Original: Quando quem está no poder não enxerga problemas de gênero