Saiu no site FOLHA DE S.PAULO
Veja publicação no site original: Projeto que obriga reeducação de agressores esbarra em falta de oferta de grupos e regras
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Texto aguarda sanção presidencial; 15 unidades federativas informaram ter grupos reflexivos para homens
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Por Júlia Zaremba
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O Senado aprovou na última semana um projeto de lei que inclui no rol de medidas protetivas à vítima de violência doméstica a frequência do agressor a um centro de educação e recuperação e seu acompanhamento psicossocial. O texto aguarda sanção presidencial.
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Mas, caso entre em vigor, a nova lei enfrentará obstáculos: a falta de oferta de grupos reflexivos para homens, de investimento e de diretrizes e regras comuns a todos.
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Hoje, homens com medidas protetivas ou condenados (geralmente a regime aberto ou semiaberto) já podem ser encaminhados para centros do tipo por meio de decisões judiciais.
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O que muda é que a penalidade ficará explícita no artigo 22 da Lei Maria da Penha. Caso não cumpra a medida, o homem poderá ser preso, explica o juiz Mário Filho, da vara de violência contra a mulher que atende os bairros de São Mateus, Guaianazes e Itaquera, na zona leste da capital.
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Juntam-se a outros cinco incisos da Lei Maria da Penha que tratam de medidas protetivas de urgência, tais como a suspensão da posse de armas do agressor e o afastamento do homem do lar. Os juízes têm até 48 horas para conceder (ou não) a medida protetiva à vítima.
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Para Filho, um dos méritos do projeto é obrigar o agressor ser reeducado no início do ciclo de violência, não apenas após a condenação. “A reincidência costuma ser maior no início, quando começam as agressões. É um momento crítico. A medida protetiva ajuda a estancar a violência”, diz.
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O problema é que faltam centros do tipo no país, diz a juíza Teresa Santana, integrante da Comesp (coordenadoria para a mulher vítima de violência do Tribunal de Justiça) e juíza da 2ª Vara Criminal de Santo André: “Como política pública, a iniciativa não foi implementada de maneira universal.”
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Mais importante do que fazer um projeto de lei sobre a questão seria regulamentar os centros, definindo como devem operar e qual a entidade responsável por eles, diz a socióloga e especialista em violência de gênero Wânia Pasinato.
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A socióloga critica a falta de metodologia e de diretrizes de funcionamento comuns entre eles e a ausência de fiscalização e dados: “Não sabemos hoje no Brasil como as perspectivas de gênero e masculinidades são trabalhadas nesses grupos.”
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Em 2008, houve uma proposta da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres para a implementação de serviços de responsabilização de agressores e definição de padrões, mas, segundo Pasinato, não foi adiante.
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Os centros têm formatos variados: são operados por ONGs, criados por varas especializadas, feitos por coletivos. A carga horária e o número de encontros variam. Abordam temas como machismo e violência contra a mulher e costumam desenvolver atividades voltadas para a desconstrução de padrões tóxicos.
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Sobre os centros, a Lei Maria da Penha se limita a dizer que “a União, o Distrito Federal, estados e municípios poderão criar e promover” centros de educação e reabilitação para agressores. Mas não é taxativa ao afirmar quem deve financiá-los e mantê-los.
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A Folha procurou os tribunais de Justiça de todos os estados e o Distrito Federal. Destes, 15 unidades federativas informaram ter programas voltados para agressores: BA, CE, DF, GO, ES, MA, MT, MS, PE, RN, RS, RR, SE, SC e SP.
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Em São Paulo, o primeiro grupo reflexivo para homens foi criado em 2009 pelo Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde. Atende hoje homens denunciados por mulheres com base na Lei Maria da Penha. “Não é um curso, mas um grupo para pensar o que é ser homem, as mudanças na sociedade e propor um outro tipo de socialização masculina”, explica o psicólogo Tales Mistura.
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Há notícias e vídeos, discussões e compartilhamento de experiências. Uma das atividades, por exemplo, consiste em escrever vantagens de ser homem e de ser mulher, seguida por um debate. No início, conta, os homens chegam “muito revoltados, com um sentimento de injustiça”.
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Os participantes devem participar de ao menos 16 encontros de duas horas cada. Pode servir como atenuante de uma futura condenação. Cerca de 1.000 homens foram atendidos em 10 anos e a taxa de reincidência de violência foi de cerca de 5%.
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A maior dificuldade, diz, é conseguir investimento para realizar o curso, realizado de forma voluntária. Eles têm uma parceria com o Fórum da Barra Funda.
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Outro projeto no estado é o “Tempo de Despertar”, criado em 2014 pela promotora Gabriela Manssur. “É melhor forma de lidar com a violência contra a mulher, porque é uma questão comportamental. Mas não de forma isolada.”
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O projeto virou política pública no município de Taboão da Serra e, no fim do ano passado, passou a ser apoiado pela prefeitura de São Paulo. Os encontros, oito no total, são realizados às terças e quintas no Fórum da Barra Funda (zona oeste da capital) durante duas horas.
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Os participantes são acompanhados por um ano após a conclusão e diz que a taxa de reincidência entre eles foi de 2%. Espera que 700 homens participem do projeto neste ano —cerca de mil homens já foram atendidos.
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Na última semana, a promotora foi a Brasília para sugerir ao governo a implementação da ação em todo o país. “É um projeto barato e que oferece um resultado satisfatório. Por que não adotar um programa nacional?”, diz. “Hoje, existem pouquíssimos.”
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Há também o “E Agora, José?”, que atende a cidade de Santo André. Segundo o psicólogo Flávio Urra, coordenador da ONG que realiza o projeto, a fila de espera para participar dos encontros já chega a 50 pessoas (são atendidos 40 homens todas as quartas). São 26 encontros no total.
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“Em todos os espaços que o homem frequenta, da escolinha até o bar, o machismo prevalece. Procuro criar um ambiente não machista, e provoca uma mudança neles: começam a falar de coisas que não falam em outros ambientes”, diz.
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O perfil dos alunos varia. Tem desde os que cometeram agressão verbal até abuso sexual no transporte público. O mais velho tem 95 anos.
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Se mantém à base de penas pecuniárias recebidas pelo fórum que são revertidas ao projeto. “O trabalho deveria ser transformado em uma política de segurança pública. Se faz, rompe com todas as violências: urbana, de torcidas, de trânsito. São todas fruto de machismo”, diz.
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Caso a política pública comece a ser implementada desde a escola, o resultado pode ser ainda mais eficaz, diz a juíza Teresa Santana. “A violência doméstica é fundamentada em uma questão cultural. Se não muda, a tendência é que se repita.”
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A Folha entrou em contato com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos para saber se há alguma política pública nacional sobre a questão em desenvolvimento, mas não obteve retorno.
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