Mas eu ganho mais que o meu namorado e faço de tudo para esconder isso dele. E por que estou ocultando essa parte essencial de eu quem sou?.
Uma pesquisa de 2017 sobre esse tema viralizou recentemente. Uma das suas descobertas principais foi que as mulheres da geração millennial ainda se sentiam constrangidas ou preocupadas em ganhar mais do que seus parceiros. Uma participante anônima disse para o pesquisador que ficou “chocada” com o fato de que sua reação inicial ao descobrir que ganhava mais que seu marido tenha sido de vergonha.
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Em seguida, a pesquisa gerou zilhões de tuítes e alguns artigos sobre como as jovens se sentem ok com ganhar mais que seus parceiros. Estamos em 2018, nós estamos buscando acabar com o fosso salarial entre homens e mulheres e celebramos quando as mulheres conseguem ser bem-sucedidas e bem-pagas.
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Isso foi exatamente o que eu disse, tanto em conversas com amigas como em postagens nas redes sociais. Eu argumentei que nós só vamos conseguir reverter o desequilíbrio entre homens e mulheres no ambiente de trabalho – o mesmo desequilíbrio que fez com que o assédio sexual prosperasse em diversos setores econômicos pelo mundo – quando as mulheres ganharem o mesmo, senão mais que os homens. Eu inclusive citei estatísticas: em 2017, o Fórum Econômico Mundial alertou que vai levar 217 anos para acabar com o fosso salarial, o que torna esse assunto extremamente urgente.
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Apesar de tudo isso, entre quatro paredes, eu guardei o meu segredo. Em casa, eu ainda não pratico aquilo que eu prego.
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Nesse momento, eu e meu namorado estamos desesperados para sair de férias. Nós ainda não viajamos desde que nos conhecemos, justamente porque a gente não consegue pagar pelas férias. Em vez disso, eu tenho apenas trabalhado, trabalhado… e trabalhado.
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Direito de imagem ZEB MCGANN/BBC THREE Image caption ‘Eu escondo isso dele, porque eu tenho medo que ele se sinta mal’
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Mas isso poderia ter sido diferente. Depois de conseguir fechar um bom contrato, eu poderia pagar pelas férias. Eu poderia pagar para nós dois. Mas, em vez de me oferecer para assumir os custos, eu mantive silêncio sobre o fato de ter mais de 5 mil libras (R$ 25,5 mil) em uma poupança que ele desconhece. Eu escondo isso dele, porque tenho medo de que ele se sinta mal por isso.
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Quando conheci meu namorado, ganhava mais de 20 mil libras (R$ 102,2 mil) por ano a mais que ele. Ele é jardineiro e eu trabalho no mercado editorial. Com uma breve exceção entre 2016 e 2017, quando aceitei um corte salarial por um trabalho que eu queria muito, tenho ganhado mais que ele ao longo dos nossos seis anos de relacionamento. Nós continuamos juntos – e eu espero que continuemos juntos até que um de nós morra – mas ele ainda não sabe a verdade sobre o meu salário.
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E esse é um ponto chave da questão: a melhor fase do nosso relacionamento foi quando, por um curto período, ele foi o provedor.
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Ele me emprestou dinheiro e pagou pelas nossas férias. Quando a gente comia fora, a conta era dele. Algumas vezes, ele até comprou minhas roupas. Eu odiava essa situação, mas eu sabia que ele se sentia como se estivesse correspondendo à pressão social para ser o “homem da casa”. Ele até chegou a dizer que sentia que estava fracassando se não pudesse pagar minhas contas.
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Durante o ano em que eu estava ganhando menos, eu ganhei um prêmio pelo meu trabalho. Ele ficou feliz por mim, genuinamente, e sentiu que tinha desempenhado um papel nessa vitória, porque ele pode torná-la possível, financeiramente. Naquele ano, eu me lembro de irmos jantar para comemorar meu aniversário. Ele pagou a conta, nós pegamos um táxi para casa e tivemos uma grande noite de sexo. Na verdade, ao longo daquele ano, o sexo foi melhor que nunca. Parecia que, de alguma forma, nós tínhamos encontrado o nosso equilíbrio.
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Meu namorado é brilhante e bem sucedido. Mas, por mais que eu saiba que ele se sente orgulhoso com meu sucesso, eu também sei que ele se sente bem que eu precise dele. Será por isso que eu continuo a esconder a verdade dele? Eu me fiz essa pergunta muitas vezes, insone na cama ao lado dele.
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Então, o que acontece comigo? É uma boa questão. E como se minha hipocrisia não fosse ruim o suficiente, o pior de tudo é que as mulheres que são provedoras nos seus relacionamentos têm motivos para se sentirem preocupadas. Um estudo da prestigiada universidade americana de Harvard, de 2016, descobriu que os casais são mais propensos a se divorciar se o marido trabalha meio período ou não trabalha. Segundo a pesquisadora, Alexandra Killewald, a razão é que a “norma do homem provedor persiste”.
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Direito de imagem ZEB MCGANN/BBC THREE Image caption Como nós poderemos superar o fosso salarial entre homens e mulheres, se algumas de nós não conseguem nem ganhar um pouco mais que seus parceiros sem se preocupar?
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Eu não sou de uma família rica e a minha poupança não é nada comparado com as de Rihanna, Beyoncé e Meghan Markle . Mas, para mim, que cresci vendo minha família se virando como podia, que abri a porta para pessoas e oficiais de justiça cobrando contas e escutei minha mãe ao telefone se recusando a vender todos seus objetos de valor, o que eu tenho é importante.
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Os meus pais são de origem humilde. Mas, nos anos 1980, meu pai teve uma fase próspera trabalhando no mercado financeiro. Ele não tinha tido nenhuma qualificação e ninguém na nossa família jamais havia imaginado que seria possível ganhar a quantidade de dinheiro que a gente ganhava. Mas, nos anos noventa, tudo ruiu. Meu pai perdeu o emprego e, logo depois, nós perdemos nossa casa.
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Depois de alguns anos de batalha, minha mãe abriu seu próprio negócio e se tornou a provedora. Isso acabou levando à separação dos meus pais. Por quê? O ego frágil do meu pai não podia lidar com isso. Eu lembro que ele fingia que a empresa da minha mãe era “dele, na verdade”. Eu ouvia quando eles discutiam porque ele tinha gastado em um só dia todo o dinheiro que ela havia dado para ele passar a semana. E também recordo dos comentários sarcásticos do meu avô sobre aquela situação.
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Eu vi o que aconteceu com minha família depois que minha mãe se tornou a provedora. E, mais recentemente, eu vi o que isso provocou no relacionamento de algumas das minhas amigas. Uma delas é uma fotógrafa bem sucedida. Nos últimos anos, ela comprou uma casa para ela e seu namorado, o apoiou quando ele não estava trabalhando, pagou pelas férias, organizava as contas e compras domésticas.
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Em público, ele dizia o quanto amava estar com uma “mulher forte”. A dois, eu sei que eles brigavam constantemente, porque eu vi as mensagens manipuladoras que ele enviava para ela, fazendo com que se sentisse culpada por estar trabalhando.
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Também há o caso de outra amiga. Ela é consultora administrativa e ganha mais que o dobro do que seu ex-namorado. Repare no “ex”. No fim das contas, ele a deixou logo depois de terem se mudado para uma casa mais barata, para deixá-lo mais confortável. Até recentemente, ela tinha medo de contar a verdade sobre sua renda para qualquer um dos caras que ela conhecia no Tinder.
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Apesar de sempre dizer para ela que “isso não importa” e encorajá-la a “ser ela mesma”, já que “a pessoa certa não vai se importar”, a verdade é que eu provavelmente faria a mesma coisa se estivesse solteira.
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Tendo visto o que ocorreu com os relacionamentos de mulheres que eu amo e que eram as provedoras, e sentindo o que aconteceu quando o meu namorado sentiu que podia me ajudar financeiramente, eu me sinto em conflito.
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Eu também sinto vergonha. Eu tenho vergonha por não estar sendo honesta com a única pessoa do mundo com quem eu deveria poder falar de qualquer coisa. E, mais do que isso, eu tenho vergonha por nós ainda não vivermos em um mundo onde eu possa ser uma jovem mulher bem sucedida e não viver em conflito por causa disso.
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Como nós poderemos superar o fosso salarial entre homens e mulheres, quanto mais conseguir que mulheres ocupem cada vez mais postos de comando, se algumas de nós não conseguem nem ganhar um pouco mais que seus parceiros sem se preocupar o que isso pode fazer com o ego deles?
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No meu caso, espero sinceramente que as coisas possam mudar entre mim e meu namorado. Eu quero poder ser sincera sobre minha renda, sem ter medo de que ele se ressinta. Além disso, eu não quero me sentir pressionada a contribuir mais do que ele na nossa vida a dois. Eu não quero ser ajudada por ele, nem quero ajudá-lo financeiramente. Eu apenas quero que nós sejamos iguais, independentemente do dinheiro que temos no banco.
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