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Veja publicação original: Por que “ciúme” ainda é tão usado para justificar crimes contra mulher?
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Por Jacqueline Elise
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Resumo da notícia
- Tribunal de Justiça de Goiás afirma que a palavra “ciúme” foi usada em mais de 50 mil ações judiciais
- “Ciúme” é lido como sentimento de posse por parte de um parceiro e pode ser enquadrado na lei do Feminicídio e na Maria da Penha
- Especialistas explicam que machismo da sociedade contribui para que crimes contra a mulher sejam justificados como “ciúme”
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Um levantamento feito pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), divulgado ontem (em 11 de março), informa que há mais de 67 mil processos em tramitação relacionados à Lei Maria da Penha. Dentre eles, a palavra “ciúme” foi usada 51.760 vezes em atos judiciais, despachos e sentenças. O relatório também aponta que, só nos primeiros dois meses de 2019, foram protocolados 2.858 pedidos de medida protetiva.
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Em 2018, em São Paulo, o Ministério Público do Estado também lançou um “Raio-X do Feminicídio“. Das 364 denúncias de feminicídio protocoladas pelo MPSP entre março de 2016 e março de 2017, 30% delas tiveram como justificativa “ciúme, sentimento de posse ou machismo”.
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“Até a publicação do Código Penal de 1940, considerava-se que agir no calor da emoção e da paixão eram justificativas suficientes para amparar um crime. Essas emoções seriam formas de defender a honra em casos de traição, por exemplo”, explica a advogada de família, especializada em feminicídio, Christiane Faturi Angelo Afonso, de São Paulo. “Mas o Artigo 28 do código atual, afirma que ‘não excluem a imputabilidade penal a emoção ou a paixão’. Agredir ou matar alguém por ciúme não é uma defesa da honra, e quando a vítima é mulher, o caso entra na definição de feminicídio, de atentar contra a vida de uma mulher por conta de seu gênero”.
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A promotora de justiça e coordenadora do Núcleo de Gênero do MPSP, Valéria Scarance, explica que, na jurisprudência, ciúme significa sentimento de posse de uma pessoa sobre a outra — na maioria das vezes, do homem sobre a mulher.
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Ela afirma que o ciúme ainda é usado como “explicação” em casos de violência doméstica e feminicídio por causa do machismo reinante na sociedade. “Ao longo do tempo se ensinou que a mulher deve ser do lar, destinada aos filhos, obediente ao homem. A raiz disso está no sentimento de que ela é propriedade dele. Tanto é assim, que a ameaca mais comum ouvida em casos assim é ‘se ela não for minha, não será de mais ninguém’. O homem agressor desconsidera a mulher como uma pessoa, e prefere vê-la morta do que com outro”, afirma a especialista.
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Valéria Scarance explica que a melhor forma de cortar o ciclo de abusos e de impedir que eles aconteçam é a mulher mantendo “suas bases de sustentação: não permitir que um relacionamento afete suas relações com a família, com os amigos, sua autonomia e também a autoestima”.
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Atitudes criminosas motivadas por “ciúme”
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Thaís Perico, advogada membro da Rede Feminista de Juristas e cofundadora da ONG Hella, de combate à violência contra a mulher, cita algumas atitudes motivadas pelo sentimento de posse que podem ser enquadradas criminalmente:
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Perseguição/Stalking
“A perseguição pode ser incluída em crime de ameaça. Por exemplo, o homem não aceita o fim da relação, sabe os lugares que a ex-mulher frequenta, e começa a aparecer nesses lugares. Ela começa a pensar ‘ele abandonou a vida dele para ir atras de mim;do que mais ele é capaz?’, diz. Perseguir alguém, segundo a advogada, configura crime de ameaça do direito da mulher de ir e vir;
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Ela incentiva que as vítimas coletem todas as provas dessa perseguição, por exemplo, tirando fotos do stalker, para que seja mais fácil a obtenção de alguma medida protetiva. “Para quem tem medida protetiva, em caso de descumprimento, deve haver prisão preventiva”.
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Clonagem de WhatsApp
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Recentemente, surgiram diversos aplicativos que clonam nossas conversas de WhatsApp. Eles são bastante utilizados pelo par de um relacionamento que quer monitorar a vida do outro. “A legislação brasileira ainda está engatinhando quando se fala de crimes virtuais. Mas em situações de clonagem das conversas, a mulher pode denunciar o parceiro na Delegacia de Crimes Cibernéticos de seu Estado, alegando o crime de invasão de privacidade”, aconselha Thaís Perico.
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Obrigar o par a fornecer suas senhas de redes sociais e email
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Há parceiros que monitoraram o outro por meio de email e redes sociais, depois de exigir que ele entregue suas senha. “Isso configura violência psicológica, crime contemplado pela Lei Maria da Penha no artigo 70, parágrafo II”.
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Controlar gastos de cartão
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Limitar o uso do cartão da vítima, barrar acesso ao próprio dinheiro e até mesmo impedi-la de trabalhar são atitudes também enquadradas na Lei Maria da Penha sob o o crime de violência patrimonial.
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Controlar o contato da vítima com outras pessoas
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Quando a mulher não pode entrar mais em contato, ou tem sua comunicação extremamente limitada, com familiares e amigos por causa de “ordens” do parceiro, este homem pode ser acusado, segundo Thaís Perico, de cárcere privado e violência psicológica.
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