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Veja publicação original: ‘O silêncio não pode mais caber nos casos de violência doméstica’
Por: NIVIANE RODRIGUES
AGOSTO LILÁS. Promotora Maria José Alves destaca campanha do MP contra agressão às mulheres
A Lei Maria da Penha (lei 11.340/06) completa 11 anos e trouxe avanços significativos no combate à violência da mulher. O cenário ainda está longe do ideal, mas é considerado bem diferente de quando muitos entendiam que briga entre marido e mulher devia ser resolvida na seara do lar.
Sancionada em 7 de agosto de 2006, a norma é um marco na legislação brasileira. O dispositivo legal aumentou o rigor das punições para os crimes considerados domésticos, física ou psicologicamente.
Para marcar a data, o Ministério Público Estadual em todo País lançou a campanha “Agosto Lilás”, que alerta sobre a violência contra a mulher e a importância de denunciar o agressor. A campanha segue durante o mês e em Alagoas tem despertado a atenção pelo formato onde homens dos mais diversos segmentos se colocam como protagonistas na luta contra a agressão à mulher.
Ontem, um ato público em aniversário aos 11 anos da promulgação da Lei Maria da Penha foi realizado na Praça Deodoro, em frente ao Tribunal de Justiça (TJ). De acordo com o Comitê de Mulheres em Defesa da Democracia, Alagoas é o 10º Estado mais violento para as mulheres, e de janeiro a junho deste ano, 2.314 mulheres foram atendidas no Estado, segundo registros da Secretaria de Segurança Pública (SSP).
Na tarde de ontem, a promotora de Justiça Maria José Alves, da 38ª Promotoria de Justiça da Capital, por onde passam os casos de violência doméstica contra a mulher, conversou com a Gazeta, a quem concedeu a entrevista que segue.
Gazeta. De onde surgiu a ideia dessa campanha?
Maria José Alves. O Agosto Lilás está em seu segundo ano, começou em 2016. Não é uma criação do Ministério Público de Alagoas. Foi elaborada no Mato Grosso do Sul, que apresentou para o Compromisso e Atitude, um projeto que faz parte da Secretaria de Políticas Públicas da Presidência da República. Todos os estados do Brasil abraçaram essa campanha e desde então ela está acontecendo. Aqui em Alagoas, tiramos a proposta, a assessoria de comunicação conversou com o procurador-geral de Justiça, Alfredo Gaspar, que abraçou com unhas e dentes, e foi, inclusive, incluída no calendário oficial do Ministério Público de Alagoas a partir de 2017 em diante.
O que é o Agosto Lilás?
Primeiro por que agosto? Porque hoje, dia 7 de agosto de 2017, a Lei Maria da Penha está completando 11 anos. Onze anos que entrou em vigor, de muitas lutas, batalhas, muita dor, de muita surpresa com o número de casos, mas também de muitas conquistas. A cor Lilás, por quê? Quando estudamos a teoria das cores, aprendemos que a cor lilás é a síntese, a fusão das cores azul e rosa. E o azul, por questões culturais, no mundo inteiro é conhecido como a cor masculina, e o rosa a cor feminina. Fazendo a sínteses dessas duas cores, que dá o lilás, é o recado que essa batalha não é uma luta de mulheres contra homens. Muito pelo contrário, é uma luta de homens e mulheres que entendem que têm que ser dado um basta na violência e que estamos todos juntos no mesmo barco, de uma sociedade em que a mulher não tenha que sofrer violência e seja respeitada como pessoa de grandes direitos e, claro, de deveres também.
É por isso então que a campanha tem presença masculina marcante?
Exatamente. As mulheres não foram chamadas para fazer nossos cards. Via de regra, toda campanha que envolve a luta pelos direitos da mulher, são as mulheres que estão à frente falando. Nesta, nós chamamos os homens, para mostrar para toda sociedade que os homens estão nessa batalha, estamos todos no mesmo barco, procurando lutar por uma sociedade sem violência contra a mulher, especialmente sem violência doméstica e familiar. Estamos contando com representantes da sociedade, empresários, integrantes do meio artístico, com o Tribunal de Justiça, servidores, promotores que abraçaram a causa, procuradores, juízes, que fizeram questão de participar, mostrando para a população que os homens estão conosco, com as mulheres nessa campanha.
Vocês perceberam algum impacto com a campanha?
Com certeza. E olhe, eu integro a comissão nacional de promotores do combate à violência doméstica, composta por procuradores e promotores de todo Ministério Público, estadual, da União, Distrito Federal e do Trabalho. E os colegas têm dado parabéns à campanha do MP de Alagoas, por ser a que mais tem chamado a atenção. No dia do lançamento, sábado no calçadão do comércio, eu pude sentir a resposta da comunidade, das mulheres.
E os resultados efetivos de campanhas como essa, quais são?
O nosso Agosto Lilás é uma campanha de conscientização toda sociedade, inclusive para o sistema de justiça de direitos. E também é um convite, um alerta às mulheres vítimas de violência doméstica para elas quebrarem o silêncio, porque os maiores aliados do autor de violência doméstica são o silêncio da vítima e a omissão de quem sabe que aquela mulher sofre violência doméstica, da vizinhança, na escola, no trabalho. Omissão porque é aquela história ainda de que em briga de marido e mulher não se mete a colher, o que é uma falácia, e o silêncio da vítima.
Então essa é uma campanha que vai chegar às mulheres menos favorecidas economicamente?
Claro que sim, porque a violência doméstica não tem perfil. Ocorre em todas as camadas sociais, em todas as esferas socioeconômicas e culturais. Quando a gente escolheu o calçadão, em vez de irmos para a área nobre, é porque ali no calçadão nós iríamos alcançar todas as classes sociais. Ali passa tanto quem vem da periferia, dos grotões, como vem também quem está na área nobre. Se nós fôssemos para a área nobre não alcançaríamos toda a sociedade alagoana. Mas além de uma campanha, ela um convite especialmente para a quebra do silêncio e é para dizer à mulher: você que é vítima, o Ministério Público de Alagoas está aqui. A Defensoria Pública, o Juizado, a Secretaria da Mulher, os Centros de Referência. Há toda uma rede funcionando para ouvir você, especialmente o MP. Mulher, você é vítima de violência: grite, denuncie porque nós estamos aqui para ouvir sua voz. O ligue 180, por exemplo, é um canal muito importante nesse combate de violência familiar e doméstica contra a mulher.
Como funciona? Quantos casos são registrados por ano nesse canal?
É um canal importantíssimo. Eu recebi no último ano através do Ligue 180, 432 denúncias das próprias mulheres, familiares ou outras pessoas de Maceió. Não precisa se identificar, pode ficar no anonimato. Isso é um número representativo. Quando eu digo que mesmo que fosse uma mulher que a gente salve, faz a diferença. Sob a forma da Lei Maria da Penha. De junho de 2016 a junho de 2017, em Maceió, tivemos 794 casos, feitos, crimes. E em 2017, até o momento, a 38ª Promotoria já ofertou 432 denúncias. É muita coisa.
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