Saiu no site CARTA CAPITAL
Veja publicação original: Novas Masculinidades
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A masculinidade clássica, tradicional, é um modelo baseado na exclusão e no domínio do outro, na subordinação do diferente
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Por Mônica Dallari
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A Libraria de Mulleres Lila de Lilith, fundada por feministas em 2011, na zona antiga de Santiago de Compostela, na Espanha, se distingue por oferecer um amplo acervo quase exclusivo de escritoras de todo o mundo. O objetivo é dar visibilidade e promover a produção literária feminina e feminista em todas as suas formas, na poesia, nos livros infantis, na ficção ou em ensaios sobre economia, saúde, direito ou sexualidade.
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Lilith, diz o mito, foi a primeira mulher de Adão, ambos criados do barro por Deus. Por não aceitar a submissão ao marido, e exigir direitos iguais, Lilith abandonou Adão e fugiu do Jardim do Éden. Para aplacar a tristeza de Adão, Deus tirou um pedaço de sua costela e criou Eva, uma mulher submissa e dependente. Lilith foi para o Mar Vermelho e se tornou um demônio noturno.
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No pequeno espaço tão interessante, rico e diversificado de produção cultural, um livro, entre os raríssimos autores masculinos, chamou a minha atenção “Novas masculinidades – O feminismo a (de) construir o homem”, do sociólogo Jorge García Marin, professor da Universidade de Santiago de Compostela. A vendedora me explica que os homens devem participar do debate sobre uma nova sociedade igualitária e como o autor defende as causas feministas, teve o seu espaço garantido. Imediatamente o tema me interessou.
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Sou mãe de três jovens rapazes de 19, 21 e 22 anos e convivi com os questionamentos diários que sofreram suas posturas, ideias, opiniões e comportamentos feitos por meninas adolescentes, colegas nas escolas, feministas convictas, empenhadas em “derrotar o machismo”. Fiquei curiosa em saber o caminho desse debate.
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“As novas masculinidades são um produto ou uma consequência do feminismo”, explica o psiquiatra português Marcos Gonçalves. Para Luísa Monteiro, escritora e atriz portuguesa, ambos autores dos prefácios no livro, a nova masculinidade é afetiva. “Já não se trata do admirável, do sedutor, do apaixonado, mas do afetuoso.”
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Jorge Garcia Marin argumenta que as novas masculinidades são compatíveis com diversas reivindicações do feminismo. “A repressão das emoções nos homens tem um alto custo e os obriga a viver a masculinidade como fator de risco: brigas, guerras, uso de drogas, tráficos de seres humanos ou suicídios são ações claramente masculinizadas, e demonstram as dificuldades dos homens para criarem vínculos afetivos e íntimos”.
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Marin explica que a masculinidade clássica, tradicional, é um modelo baseado na exclusão e no domínio do outro, na subordinação do diferente.
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Ser homem é estar numa posição que implica poder. A cultura da violação, mostra vergonhosa da construção de identidades masculinas, constituída historicamente pelo controle, violência, competividade e força, agora se depara como uma nova sociedade. As mulheres deixaram de ser “objetos” e se tornaram indivíduos independentes. Nas manifestações violentas, o homem considera a mulher sua possessão e necessita demonstrar constantemente a sua virilidade. Esta seria a explicação à violência machista que aumenta em ritmos galopantes, inclusive em países desenvolvidos.
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Há um ano, a Associação Americana de Psicólogos divulgou um documento alertando sobre os problemas provocados pelo machismo. “A socialização de meninos para corresponder à ideologia tradicional de masculinidade limita o desenvolvimento psicológico de homens e seu comportamento, resultando em pressões e conflitos relacionados ao papel de gênero e influencia negativamente a saúde física e mental”, diz o texto. Profissionais devem trabalhar aspectos positivos para a nova masculinidade, como flexibilidade e coragem.
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A violência de gênero é um comportamento masculino inaceitável, argumenta o americano Jackson Katz, PhD em Estudos Culturais e Educação pela Universidade da Califórnia. Para ele, combater o crescimento assustador do feminicídio exige um novo olhar crítico para o problema, colocando em evidência os autores dos crimes, os homens, e não apenas as vítimas. “Soluções duráveis para o problema da violência de gênero só podem ser atingidas nos níveis institucionais, políticos e culturais, onde os homens detêm uma influência desproporcional”. O diálogo precisa ser ampliado.
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Marin considera surpreendente a escassa presença de homens em foros de igualdade e de reflexão sobre temas de gênero. Os chamados estudos das masculinidades surgiram timidamente nos anos 1970, sobretudo nos países anglo-saxões, se fortalecendo a partir dos anos 1980 como consequência do crescimento brutal da violência contra as mulheres.
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A construção cultural do gênero não só determina o papel social das mulheres, mas também o dos homens. A intenção é dar visibilidade a todo o tipo de violência contra as mulheres e discutir saídas através do pacifismo, da educação não violenta e do feminismo.
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Para a feminista nigeriana Chimamanda Ngozi Adiche, a educação é fundamental para desconstruir os “papéis de gênero”, muito difíceis de serem desaprendidos. Se não empregarmos a camisa de força do gênero nas crianças pequenas, daremos a elas espaços para alcançarem todo o seu potencial. “Os estereótipos de gênero são tão profundamente incutidos em nós, que é comum os seguirmos mesmo quando vão contra nossos verdadeiros desejos, nossas necessidades e nossa felicidade”. É importante valorizarmos para as crianças a ética do cuidado, da responsabilidade, da preocupação pelos outros, dos sentimentos e dos afetos.
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Na Austrália, o ativista Michael Flood, professor da Universidade de Tecnologia de Queensland, pesquisa há 30 anos sobre como envolver os homens na prevenção primária da violência contra as mulheres. Entre 1990 e 1998, Flood publicou a revista “XY: Men, Sex, Politics”, focada em temas relacionados às masculinidades e em políticas de gênero comprometidas com o feminismo.
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Hoje, mais de 670 artigos estão disponíveis no site xyonline.net, com temas como o trabalho desenvolvido com lideranças estudantis masculinas para a prevenção de violência sexual dentro dos campus universitários; as características do novo homem ômega – confiante, criativo, seguro, que não precisa de reconhecimento público e respeita qualquer orientação sexual; a razão da predominância de homens em grupos terroristas; ou sobre a grave violência de gênero contra homossexuais e minorias.
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No Canadá, o 27º Annual Men and Masculinities of American Men’s Study Association, na Universidade de Brandon, em Manitoba, entre os dias 12 e 14 de junho de 2019, irá debater o “Nas Fronteiras de Nós Mesmos: Masculinidades e Descolonialidade”. Embora tenha havido alguns progressos na segunda metade do século XX, inclusive com o movimento #MeToo, uma nova geração de “homens fortes” assumiu o controle de países desenvolvidos, apresentando um modelo de masculinidade “neo-tradicionalista”, classificado pela Associação Psicológica Americana como “explicitamente patológico”.
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Em Istambul, na Turquia, o 2º Simpósio Internacional sobre Homens e Masculinidades irá discutir os “Desafios e Possibilidades em Tempos Difíceis”, entre 12 e 14 de setembro. Há um ano, reunidos na Nicarágua, o grupo “Homens por uma nova masculinidade” elaborou um manifesto em defesa da igualdade de gênero. “Rejeitamos categoricamente a afirmação de que os homens são superiores às mulheres, bem como todo o sistema de subordinação, degradação e violência contra as mulheres que essa ideia prejudicial, errada e perversa criou. Nós nos opomos enfaticamente, com todas as nossas forças, às maneiras pelas quais as mulheres são desprezadas, menosprezadas, exploradas, agredidas e assassinadas em nome dessa assim chamada masculinidade.”
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No Brasil, o debate sobre novas masculinidades, ainda bastante tímido, começa a ganhar força, especialmente em relação à paternidade. De 27 a 29 de setembro acontece o 2º Grande Encontro Homens em Conexão, em Brasília. Para Guilherme Nascimento Valadares, editor do site Papo de Homem, é preciso estar alerta para não condenar qualquer tipo de masculinidade. Todos saem perdendo. “Se instala uma dinâmica de acusação, ódio, denúncia e cabo de guerra. Tenho observado esse ciclo ganhar cada vez mais força nas viagens e atividades que conduzo pelo Brasil, infelizmente.” Se quiser saber mais sobre o assunto, Valadares preparou uma lista com diversos sites brasileiros que trabalham com o tema https://papodehomem.com.br/transformacao-homens-masculinidades-projetos-iniciativas-pessoas/ . Boa sorte a todas e todos nós!
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