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Veja publicação original: “Nosso país possui uma cultura patriarcal, onde a mulher tem sido vítima de uma violência alarmante”, afirma juiz
Os recentes casos de abusos e atentado ao pudor, cometidos contra mulheres, têm gerado revolta na população pela impunidade. No último dia 2, um advogado foi detido em Tangará da Serra após se masturbar em frente à residência de uma mulher, mas acabou sendo solto. Caso de certa forma semelhante ao do homem que ejaculou em uma mulher em um ônibus em São Paulo, e também foi solto. Dois casos de assédio também foram registrados na última quinta-feira (5).
Duas mulheres que andavam de ônibus em Cuiabá foram apalpadas por homens e nenhum dos suspeitos ficou preso. O juiz da Primeira Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher de Cuiabá, Jamilson Haddad Campos, afirma que diversos fatores influenciam a conduta de homens que cometem abusos, inclusive fatores genéticos. Ele acredita que a solução seria um maior investimento em políticas públicas e em educação.
“Cada caso tem que ser analisado pela autoridade competente. Eu como juiz não posso dar mais informações sobre casos em andamento, mas são várias questões que influenciam o comportamento das pessoas. Têm questões genéticas, as pessoas herdam caracteres, dores profundas, traumas, de gerações anteriores, transmitidas através do DNA. Além de que as pessoas são programadas do dia em que nasceram até a vida adulta, o meio em qual a pessoa cresceu, se desenvolveu, ele tem influência sobre a parte estrutural da personalidade e do caráter das pessoas”, afirmou o juiz.
Ele também avalia que a atual situação do país gera uma certa influência no comportamento das pessoas.
“O Brasil tem passado por aflições humanas de toda ordem, as pessoas estão depressivas, estão surtando, um percentual considerável da população, nós temos muitas famílias com crescente em endividamento e esta taxa alta também de desemprego gera um impacto no emocional das pessoas, uma influência. Nosso país possui uma cultura patriarcal, onde a mulher tem sido vítima de uma violência alarmante, o Brasil é o quinto país mais violento do mundo contra a mulher, e isso é um absurdo”.
O juiz acredita que todos estes fatores podem gerar influências no inconsciente do indivíduo, que o levam a cometer os crimes.
“Tem várias situações que precisam ser pontuadas em cada caso. Além deste estresse da população, com a criminalidade exercendo uma grande pressão na vida em sociedade, tem também relevância o fato de que cada indivíduo recebe influência da carga genética e do meio em que vive. Um menino que vê o pai agredindo a mãe, ele muito possivelmente vai repetir, até inconscientemente, esta mesma conduta por achar que isso é normal. O inconsciente responde por pelo menos 90% de tudo o que fazemos. Tem as pessoas que tem grau de psicopatia, tem pessoas co problemas mentais, tem pessoas com formação de caráter desestruturado, personalidade desequilibrada, transtorno de pedofilia, são vários fatores que vão influenciar as pessoas”.
Nesta última quinta-feira (5), mais dois casos de assédio contra mulher foram registrados em Cuiabá. Um idoso de 74 anos foi detido após apalpar a nádega de uma grávida e um homem de 40 foi preso depois de passar a mão nas partes íntimas de uma jovem de 20 anos. Os dois não ficaram presos. Mesmo com a sensação de impunidade, nestes casos de abusos e atentados, o magistrado afirma que é essencial que a vítima sempre procure a polícia, para que o caso não passe em branco.
“As vítimas devem levar ao conhecimento do delegado para que as providências sejam encaminhadas ao Ministério Público para chegar ao poder judiciário. E fatos como estes têm sido cada vez mais noticiados pela imprensa nacional, e tem vários movimentos da sociedade organizada, movimentos de parlamentares no congresso nacional, redefinindo, estudando, buscando o aperfeiçoamento da legislação, no sentido de tipificar condutas que a sociedade reclama como vítima, e que eventualmente não tenham tipificação na Lei, para que as pessoas sejam alcançadas pelo sistema de justiça e respondam por este mau”.
Ele recomenda que a sociedade busque seus representantes políticos para que façam alterações na Lei, a fim de proteger as vítimas de abusos.
“Em determinados casos, onde está havendo um questionamento se a legislação abrange ou não a tipificação de determinadas condutas como crime, como vem sendo noticiado pela imprensa, a sociedade pode, através de seus representantes, buscar a análise, se eventuais fatos estão sendo nocivos à sociedade e se devem ou não ser tipificados como crime”.
Para o juiz, a solução seria um maior investimento em políticas públicas e em educação, a fim de alterar a maneira como a sociedade encara estes problemas.
“Eu acredito muito em políticas públicas, eu acredito muito no sistema de educação. Eu acredito muito que isto pode colaborar para uma mudança. Uma boa educação, com o Governo desenvolvendo programas, inclusive pelos meios de comunicação que impactam diretamente na formação de opinião das pessoas, para que aquelas que não tiveram uma educação adequada possam ver programas educativos. Para que possam diminuir consideravelmente este índice de criminalidade, como em países desenvolvidos, onde a criminalidade é bem menor do que no Brasil. Então eu acho que a criminalidade, de forma geral, está ligada à ausência de políticas publicas eficientes. A ética em sociedade e o reforço da vida escolar com período integral de estudo, inclusive na grade curricular, de tópicos com relação a crimes, para que as crianças fiquem atentas, de comportamentos no trânsito, para que haja ética desde o início da vida escolar, e eu acredito que isto colabora com a diminuição da criminalidade”.
Agindo nesta direção, ele afirma que o Poder Judiciário já vêm trabalhando com ações de educação e conscientização, através de palestras e seminários.
“O Judiciário têm feito palestras preventivas, ilustrativas, sobre a cultura da violência contra a mulher, de que nada justifica a violência. O Judiciário tem feito além dos processos, os juízes têm feito palestras, em colégios públicos e universidades, em instituições.Fazemos um trabalho social, preventivo, além do combate àqueles que praticam os crimes. É importante que as pessoas saibam identificar comportamentos nocivos, que agridem a honra, a moral, que agridem o aspecto físico, a dignidade, e registrar estas questões com as autoridades competentes, para que sejam combatidos todos estes crimes”.
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