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Veja publicação original: No Pirelli, mulheres são menos objeto de desejo e mais o centro de narrativas
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Por Silas Martí
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Nova edição, com direção artística de Albert Watson, tem nomes como Gigi Hadid e Laetitia Casta
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Uma das modelos mais badaladas do planeta, Gigi Hadid pensa que a luz às vezes se esconde na escuridão.
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Numa tarde recente da primavera americana, a top trocou os raios de sol que inundavam a maior suíte do último andar do Carlyle, em Nova York, por um mezanino sem graça do mesmo hotel, onde falou sobre tudo o que ela sentiu ao posar para o novíssimo número do calendário Pirelli.
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“Há um lado escuro mesmo nas coisas que parecem brilhantes e bonitas”, dizia a modelo americana, rodeada de jornalistas, vestindo um suéter-saia estilo maria-mijona. “Mas podemos encontrar forças mesmo nessa escuridão.”
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Hadid comentava, no caso, o desafio de posar para uma folhinha de borracharia que se tornou um instrumento publicitário glamoroso em plena era MeToo, o movimento de uma série de mulheres que vêm denunciando o assédio sexual em Hollywood e derrubando pilares da indústria do entretenimento, entre eles o produtor Harvey Weinstein.
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Essa já é a segunda vez que Hadid estampa as páginas do tradicional calendário da fábrica italiana de pneus. Há três anos, retratos dela com trancinhas emoldurando o rosto e um maiô de vinil preto coladíssimo ao corpo, lembrando rituais sadomasoquistas, ilustravam o mês de novembro do número clicado pelo fotógrafo Steven Meisel.
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Mas o sexo está virando tabu mesmo num projeto famoso por retratar mulheres peladas ou quase nuas em poses pensadas para alegrar oficinas mecânicas ao redor do globo e dar verniz artístico a essa indústria não muito charmosa.
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No novo número, com direção artística do britânico Albert Watson, Hadid e outras modelos, entre elas a atriz francesa Laetitia Casta e a bailarina americana Misty Copeland, vestem trajes bem mais comportados. São menos objetos de desejo e mais o centro nevrálgico de narrativas visuais, uma espécie de film noir que se desenrola mês a mês.
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Hadid, por exemplo, é uma aristocrata entediada com a vida que busca refúgio numa suíte do Carlyle na companhia do melhor amigo, vivido nas fotos pelo estilista e seu colega nas baladas Alexander Wang.
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“Eu me identifiquei muito com essa personagem, porque às vezes eu me sinto sozinha e quero fugir para pensar na vida”, diz a modelo. “Há uma tristeza nisso, mas é também um momento para a reflexão.”
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Wang, que no dia do ensaio ainda pensava ser o primeiro homem a figurar no calendário, também tentou esboçar ali reflexões moldadas pelos tempos sensíveis para a representação de mulheres fogosas.
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“Estamos fotografando uma campanha que mostra muito mais a inteligência e todo o contexto de uma narrativa do que os aspectos físicos”, dizia o estilista, num intervalo da sessão em Manhattan. “Trabalhando com Gigi Hadid, é difícil não prestar atenção na beleza, mas há uma narrativa e um diálogo bem maior agora.”
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Quando tentou desenvolver mais o raciocínio, no entanto, Wang foi logo reprimido por uma assessora esbaforida da Pirelli, que o impediu de falar sobre as mudanças na indústria da moda, em especial nos episódios de assédio sexual. Ela também lembrou que outros homens já foram retratados para a folhinha desde que ela estreou, na década de 1960.
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Essa preocupação faz todo o sentido. Fotógrafos dos números anteriores do calendário da marca, entre eles Bruce Weber, Mario Testino, Patrick Demarchelier e Terry Richardson, já foram alvo de denúncias de assédio sexual contra modelos homens e mulheres.
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Tanto que o nome à frente da nova edição, que deve ser lançada em dezembro, tenta se distanciar de imagens mais ousadas, castigando quase toda a nudez ali e criando personagens menos rasas e mais poderosas para as suas musas.
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“Quero dar mais peso a essas imagens”, diz Albert Watson, fotógrafo famoso por retratos de celebridades que marcaram época, como o do cineasta Alfred Hitchcock segurando um ganso morto pelo pescoço. “Vejo muitas imagens feitas agora que já não me parecem muito fortes, poderosas ou até memoráveis.”
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Watson, no caso, diz querer evitar que a fotografia de moda continue calcada numa estética imediatista, que compara a um gosto meio fugaz.
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“Não é um desastre total, como se já não houvesse mais densidade, mas a fotografia de moda agora é como uma colher de açúcar”, compara o fotógrafo. “O açúcar derrete na hora, e você nem pensa nele.”
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Ou esquece com o mesmo amargor do passar dos meses na folhinha da borracharia.
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