Saiu no site AGÊNCIA PATRÍCIA GALVÃO
Veja publicação original: NEGRAS MOVIMENTAM R$ 704 BI POR ANO, MAS SÃO ESCANTEADAS PELA PUBLICIDADE
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Mulheres pretas e pardas formam o maior grupo da população brasileira, mas permanecem imperceptíveis para grande parte das empresas
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Por Marina Estarque e Priscila Camazano
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As mulheres negras, contingente que reúne pretas e pardas, movimentam cerca de R$ 704 bilhões por ano no Brasil, segundo levantamento feito pelo Instituto Locomotiva, especializado em pesquisa de mercado consumidor, a pedido da Folha.
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O valor, estimado a partir do cruzamento de dados de renda e consumo do grupo, representa cerca de 16% do consumo nacional.
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Mas o presidente do instituto, Renato Meirelles, afirma que elas têm um poder de decisão financeira maior que o percebido, pois muitas administram as compras do lar e influenciam nos gastos dos parentes. “As negras formam um mercado gigantesco, mas que não está no radar das empresas”, diz Meirelles, que também é publicitário.
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Em parte, isso ocorre porque as negras são uma espécie de maioria invisível na economia brasileira.
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Elas formam o maior grupo da população. Somam quase 60 milhões de pessoas —28% dos brasileiros, segundo a PNAD contínua do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
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Samantha Almeida, chefe de conteúdo na agência Ogilvy Brasil
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Ultrapassam os homens brancos em cerca de 17 milhões de pessoas, o equivalente às populações estimadas dos municípios de São Paulo, Brasília e Porto Alegre juntos. Também representam 24% da força de trabalho do país.
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No entanto, o mundo empresarial ainda tem dificuldade de reconhecer o potencial delas. As negras são as que mais sofrem com o desemprego e as que recebem salários menores. Nos quadros executivos das 500 maiores empresas do Brasil, a presença delas é de 0,4%, segundo pesquisa do Instituto Ethos de 2015.
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Para traçar a trajetória delas na geração da riqueza nacional, a Folha ouviu 26 mulheres pretas e pardas e apresenta os depoimentos numa série de quatro reportagens entre domingo (6) e quarta-feira (9). Na edição de hoje, o destaque é o papel delas como consumidoras e a inabilidade das empresas para lidar com esse mercado.
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Apenas 17% dos comerciais de TV protagonizados por mulheres são estrelados por negras, segundo pesquisa da agência Heads. A desconexão é percebida: 83% das consumidoras negras afirmam que as mulheres das propagandas são muito diferentes delas, de acordo com o levantamento do Locomotiva.
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O instituto entrevistou 1.001 mulheres negras em 46 cidades do país entre 5 e 15 de agosto. A margem de erro é de 2,6%, em um intervalo de confiança de 90%.
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Mulheres negras formam o maior grupo da população brasileira*
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Mercado consumidor
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Mulheres negras movimentam mais de R$ 700 bi por ano, mas não se sentem representadas nas propagandas
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O levantamento também identificou o que elas pretendem comprar no próximo ano: móveis (36%) eletrodomésticos (33%) e carro (27%) apareceram no topo da lista.
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Segundo Meirelles, a pesquisa mostra ainda que a mulher negra quer se ver representada e pode se afastar de marcas que não considerem a diversidade.
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Pelo levantamento, 82% dizem ter orgulho de ser quem são, e quase 90% gostam de produtos que melhorem a autoestima.
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Ter orgulho de ser negro é um dos fatores que explicam o aumento da autodeclaração da cor da pele, verificado pelo IBGE. Entre 2012 e 2016, por exemplo, enquanto a população brasileira cresceu 3,4%,
o número de pardos autodeclarados aumentou 6,6% e o de pretos, 14,9%.
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“Isso foi uma revolução: se reconhecer negro é o primeiro passo para consumir produtos específicos e cobrar diversidade das marcas”, afirma Adriana Barbosa, 42, fundadora do Festival Feira Preta, evento criado em 2002 para atender especificamente empreendedores negros.
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Um setor que começou a perceber a mudança de comportamento foi o de cosméticos, que nos últimos anos passou a trabalhar com linhas voltadas para cabelo crespo e maquiagem para peles negras.
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No entanto, a oferta ainda é pequena em relação ao tamanho da demanda, segundo a publicitária Raphaella Martins Antonio, que é negra e foi uma das líderes na implementação do programa de diversidade racial da agência J. Walter Thompson Brasil.
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“São poucas as marcas que fazem bases com tom de pele escuro aqui no Brasil, e são caríssimas. Não reflete a nossa realidade, porque uma mulher negra dificilmente consegue comprar uma base de R$ 300”, diz Raphaella.
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“A maioria das marcas está deixando de falar profunda e genuinamente com esse grupo. Ainda que não seja por consciência, mas por estratégia, a empresa precisa pensar nisso.”
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Segundo ela, há exemplos peculiares, mas ilustrativos, dessa incapacidade de perceber a diversidade na hora de conceber produtos: “há o caso de saboneteiras automáticas em que o sensor não reconhece a pele escura, porque a tecnologia é feita para brancos. Ou de airbags que são testados com bonecos homens, sem considerar a altura média da mulher”, diz ela.
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Mas pensar em produtos específicos também não é uma tarefa simples. Existe um debate em relação a esse tema.
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Há quem defenda que é preciso ter cuidado para não reforçar estereótipos. Nesta vertente está a publicitária Isabel Aquino, que coordena pesquisa sobre a presença de negros na propaganda, da agência Heads.
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“Como seria um cartão de crédito para mulher negra? O que é um carro para uma mulher negra? O risco de ser estigmatizado é muito grande. Acho que isso só faz sentido quando tem uma funcionalidade, como uma base para pele escura”.
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Para ela, um banco não necessariamente deve fazer um serviço voltado para negras, mas precisa ter uma comunicação em que elas estejam representadas positivamente.
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Nina Silva, criadora do movimento Black Money, defende outro ponto de vista.
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“Tem que ter serviços financeiros específicos para a população negra, sim, porque a grande maioria dos desbancarizados no país é negro. Não é questão de reforçar estereótipos”, afirma.
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Nina dá exemplos: diz que gostaria de ter um carro com o teto um pouco mais alto, para que tivesse mais conforto.
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“Meu cabelo black sempre bate no teto. Imagina se tivesse uma publicidade com uma mulher negra entrando facilmente no carro? Isso ia falar diretamente comigo”, afirma.
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Nina criou o movimento para incentivar que o dinheiro em poder dos negros circule o maior tempo possível dentro da própria comunidade.
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“Nós não inventamos a roda, outros grupos que também foram marginalizados, como judeus, trabalharam o desenvolvimento interno da comunidade para se reerguer. O movimento busca essa intencionalidade de consumo e no mercado de trabalho”, afirma.
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O Black Money faz capacitações voltadas para o empreendedorismo e a educação financeira, além de fomentar o networking e mentorias. “Queremos promover a circulação também do nosso capital social, não só do dinheiro”.
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O movimento ainda planeja oferecer serviços financeiros, como linhas de crédito e investimentos.
“Estamos desenvolvendo uma maquininha de cartão, com taxas mais justas para empreendedores.
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Vamos chamar de pretinha, e já temos um protótipo”, diz Nina, que é gerente de projetos em uma empresa global de tecnologia.
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Segundo ela, consumidores brancos podem ser aliados e “praticar black money”.
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“Não basta não ser racista, é preciso ter atitudes que promovam a quebra das desigualdades”.
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