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Mulheres nigerianas lutam para criar filhos frutos de estupros na Líbia

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Veja publicação original:   Mulheres nigerianas lutam para criar filhos frutos de estupros na Líbia

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Ela tinha apenas 18 anos quando deu à luz, sem a presença de um médico, dentro de um apartamento em Trípoli, na Nigéria. Estava segurando a mão de sua melhor amiga. As duas haviam acabado de voltar de uma jornada cujo destino final seria a Europa.

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Para Joy, que contou sua história à AFP sob a condição de que seu nome fosse mudado, aqueles sonhos de uma nova vida em outro continente haviam acabado.

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Sua filha era fruto de um estupro cometido por um seqüestrador líbio — um guarda de um campo de detenção para migrantes ilegais, onde ela foi detida pela primeira vez depois de ser pega por autoridades no país devastado pelo conflito.

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Ele pedira que ela se mudasse para o seu apartamento, e ela não estava em condições de dizer “não”. Uma vez lá, Joy ficou presa por um ano e se transformou em escrava dele.

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Quando engravidou, ele tentou forçá-la a sair do país e tentou de tudo para mandá-la finalmente na perigosa jornada de barco pelo Mediterrâneo, em direção à Europa.

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Depois de uma série de tentativas fracassadas de fazê-la sair, ele ameaçou matá-la e a criança, ela disse.

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— Eles dizem que somos negros e não somos muçulmanos, então é proibido ter um filho deles — disse Joy, agora com 19 anos.

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Joy conseguiu escapar e se esconder com um amigo. Ela nunca tinha ido ver um obstetra e temia que, se fosse ao hospital, seu bebê fosse tirado dela.

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— Eu ouvi muitas coisas assim — acrescentou ela: — Lá (na Líbia) eles podem bater em você, abusar de você, te estuprar. Eles podem até matar você. Eles não se importam.

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De volta para casa

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Joy voltou para sua terra natal, a Nigéria, em fevereiro do ano passado graças a um programa voluntário organizado pela Organização Internacional para as Migrações (OIM).

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Ela é uma das mais de 14.000 nigerianas que, desde 2017, voaram de volta em aviões fretados da Líbia. Cerca de 35% dos que retornaram são mulheres.

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Mas as Nações Unidas não dão números para o número de crianças “para sua própria proteção”.

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A OIM estima que permaneçam mais de 60 mil nigerianos na Líbia. São cerca de 600 mil imigrantes de 39 países, a maioria deles sem documentos legais, mantidos em acampamentos, prisões, casas particulares ou bordéis.

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Joy agora vive no Betsy Angels Shelter, um centro de reintegração e treinamento na cidade de Benin, no sul do estado de Edo, na Nigéria. Esse é um centro de tráfico de pessoas para a Europa, e sua filha de um ano e meio está numa creche.

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Sua pele mais clara faz com que ela se destaque das outras crianças.

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— Eu digo às pessoas que o pai dela é um homem branco — diz Joy, como se, de alguma forma, ela conseguisse viver um pouco da nova vida que tanto desejava na Europa.

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‘Crianças árabes’

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Migrantes falam que os bebês nascem mais frequentemente como resultado de estupro por traficantes, que transportam os migrantes através dos desertos, ou de sexo coagido com clientes da África subsaariana em bordéis da Líbia, onde as mulheres são frequentemente vendidas e trancadas.

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Quaisquer que sejam suas origens, na Nigéria essas crianças nascidas na Líbia são apelidadas de “crianças árabes” — estigmatizadas pelas circunstâncias de seu nascimento.

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— Alguns dirão “aquelas crianças árabes, não as queremos em nossa casa” — disse Jennifer Ero, coordenadora nacional da Rede de Proteção à Infância da Nigéria.

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Quando as mulheres partem para a Europa, as famílias esperam que elas acabem enviando dinheiro para ajudar os parentes em casa. Mas a realidade pode ser muito diferente.

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— Agora elas voltam, não chegaram à Europa, vêm com dívidas e com bagagem, uma criança sem nome — disse Ero.

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O centro de proteção que Ero opera na cidade de Benin também oferece apoio psicológico às mulheres.

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O cuidador diz que a maioria das mães cuidadas confidenciou que elas pensavam em abortar, se tivessem acesso à ajuda médica necessária.

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Alguns podem ser agressivos com seus bebês, acrescenta ela.

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‘Há esperança’

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Tiny Justice é pequeno para uma criança da sua idade.

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Mas aos 18 meses, ele já investiga cuidadosamente o quarto onde fica e imediatamente se agacha para abraçar sua mãe quando a vê chorar.

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Faith, que também pediu que seu nome fosse mudado, tinha 19 anos quando engravidou no que ela chama de “gueto” — um conjunto de prédios em Gatrone, no deserto do sudoeste da Líbia, onde os migrantes são mantidos.

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Os contrabandistas de Faith a venderam e outras dez pessoas para outra gangue de traficantes. Três anos depois, ela é a única que retornou à Nigéria.

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Um permanece preso na Líbia.

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“O resto de nós? Todos eles se foram. Só nós dois sobrevivemos “, disse ela à AFP.

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Faith disse que os traficantes, que vieram de vários países diferentes, governaram brutalmente as vidas de seus prisioneiros enquanto exigiam resgates para libertá-los.

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— Somos mantidos cativos, os homens que eles torturam, eles os penduram em uma cruz como Jesus, eles os queimam — ela contou.

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— Se não dormirmos com eles, não nos dariam comida. Eles nos dizem que, se não dormirmos com eles, eles nos venderão. Eles dormem conosco o tempo todo. Foi assim que engravidei — conta.

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Desde que retornou à Nigéria, não conseguiu encontrar trabalho e está lutando para reconstruir sua vida.

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Mas enquanto fala, a jovem mãe acaricia a cabeça do filho — e isso lhe dá força.

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— Enquanto meu bebê e eu estivermos vivos, há esperança — disse ela: — Por causa do que passamos juntos, eu amo muito meu bebê.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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