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Veja publicação original: Mães conectadas mostram suas dificuldades para criar filhos na era digital
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Por Marcela Paes
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“Só mais um pouquinhooooooo!” é uma das frases que a youtuber e especialista em educação Flavia Calina mais ouve durante o fim de semana. O pedido sai costumeiramente da boca de Victoria, sua filha, e não é uma súplica para prolongar o tempo no parquinho nem aumentar o tamanho da bola de sorvete: Victoria, 4, quer mais tempo no Youtube.
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“Durante a semana é mais fácil porque já existe uma rotina. No fim de semana os horários são flexíveis e é aí que começa o problema. Aquela coisa de se jogar no chão acontece, mas se eles perceberem que ficamos inseguros, é pior”, diz.
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Flavia não está sozinha nessa. Dúvidas sobre como criar os filhos num tempo em que todos estão ultraconectados são frequentes na cabeça de muitos pais que não conseguem fazer as crianças pararem de ver Galinha Pintadinha, largar as conversas no Whatsapp ou colocar o tablet de lado e dar um tempo nos joguinhos.
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A youtuber diz que tem identificação com pais que se veem ocupados e acham que a única maneira de distrair os filhos é colocando um tablet ou celular na mão deles, algo como uma chupeta virtual. “É normal fazermos isso, mas temos que saber que não dá pra ser a única opção.”
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A roteirista e cineasta da internet Talitah Sampaio também tem dificuldade em manter Yasmin, 8, longe das redes sociais. Como ela costuma gravar webséries para redes sociais como Musical.ly e Youtube em casa, é natural que a filha queira ver seu trabalho e o dos amigos da mãe na internet. “Eu acho inevitável que ela veja. Essa geração é assim. Mas eu fico de olho no tipo de conteúdo, monitoro e explico”, diz.
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Táticas para fazer com que as crianças passem menos tempo conectadas
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Tanto Flávia quanto Talitah apostam na conversa para convencer os filhos a se engajarem em atividades que não envolvam aparatos eletrônicos. As duas costumam estabelecer horários para que as filhas desliguem seus celulares e parem de ver canais de Youtube.
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“Ir avisando de pouco em pouco tempo que o horário de uso está acabando costuma funcionar. Assim como nós quando estamos entretidos não gostamos que alguém pare o filme na cena principal, eles também não podem ser pegos de surpresa”, explica. Se o horário limite para que a filha Victoria vá dormir é meia-noite, desde as 23h Flavia já vai avisando que o tempo está acabando.
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Talitah condiciona o uso do celular da filha. Yasmin não tem o Instagram instalado no aparelho, por exemplo. “Crianças não precisam de celulares ultramodernos cheios de memória e isso acaba fazendo com que tenham menos aplicativos de redes sociais instalados”. Fã de séries, a menina optou por ter o Netflix em seu aparelho.
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A psicóloga americana Elizabeth Kilbey, que lançou o livro “Como Criar os Filhos na Era Digital” – um grande manual para identificar problemas de crianças com a internet e solucioná-los – sugere atividades em família para substituir o tempo nas redes. Jogos de tabuleiro podem ser uma opção, ao menos nos finais de semana.
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Talitah também estabeleceu um horário de leitura para Yasmin. Sempre antes de dormir a menina cumpre o ritual de se desconectar e ler algo na cama, enquanto a mãe trabalha nos roteiros. “Comecei a levá-la nas livrarias e ela se interessou. Agora está lendo o livro da Malala [ativista paquistanesa vencedora do Nobel da paz], por exemplo”, diz.
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Curadoria de conteúdo
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Quando se torna impossível diminuir o tempo que os pequenos passam nas redes, é aconselhável saber exatamente o tipo de conteúdo consumido por eles.
Flavia consegue controlar melhor o que os filhos assistem conectando o Youtube à televisão. “É muito mais fácil para eu dar uma olhada no que eles estão vendo. Acho que mais do que proibir que assistam, é necessário só autorizar que eles vejam conteúdos de qualidade. Não é fácil monitorar desenho durante uma hora, mas tem que ser feito”, afirma ela, que também pensa que os filhos costumam ficar menos vidrados quando assistem aos conteúdos com maior distância de seus rostos.
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Talitah costuma conversar com a filha a respeito do que ela assiste. Assim como a mãe, Yasmin é vegetariana e o que não falta no Youtube são propagandas de produtos alimentícios não aprovados na filosofia alimentar de mãe e filha. “Uma vez ela estava vendo um vídeo em que um youtuber entrava numa banheira de Nutella. Além de desperdício de comida, coisa que eu não acho nada legal, nós não consumimos. Eu expliquei que não era legal e ela, sozinha, quis parar de ver.”
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Geração diferente
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Na opinião das duas mães, mesmo com os limites de acesso, é inevitável aceitar que a geração de crianças de hoje está mais conectada e que mudanças de comportamento são normais. Imaginar que crianças devam passar seus dias empinando pipa ou jogando futebol pode ser um pensamento anacrônico. “A Yasmin uma vez pediu patins e nunca usou. Ela gosta de ver séries como eu gostava de ver filmes. Não adianta forçar”, diz Talitah.
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“Todos, atualmente, estamos conectados. Não só as crianças. Não adianta proibir, a chave é usar o bom senso. Se não é legal para um adulto ficar 5 horas na internet, imagina para uma criança”, diz Flavia.
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