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Luiza Brunet: carta aberta ao homem agressor

Saiu no site JORNAL O GLOBO

 

Veja publicação original:   Luiza Brunet: carta aberta ao homem agressor

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É preciso entender a ponta fundamental que leva aos índices alarmantes de feminicídio. A sociedade não tolera mais a violência contra a mulher 

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Por Luiza Brunet

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Não é fácil olhar no olho de um homem agressor. São pessoas que cometem crimes e que devem prestar contas à Justiça. Diante de um quadro tão alarmante de mulheres agredidas e mortas, uma carta aberta ao homem agressor é uma forma de tratar o problema. Escrevo encorajada a falar diretamente com você que agride a sua mulher, a sua ex-mulher, a sua namorada ou uma mulher com quem você tenha um envolvimento amoroso. Dirijo-me a você que deu um tapa. Que empurrou. Que chutou. Você que deu um soco e desfigurou um rosto. É preciso que você se dê conta que essa prática é um comportamento criminoso, indigno e intolerável.

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Tenho estudado os arquétipos do machismo e os padrões do comportamento agressivo. Tenho me debruçado em exemplos pelo mundo. Tive a honra de ser homenageada pelo Senado do estado de Massachusetts, nos Estados Unidos, pela minha contribuição ao enfrentamento a violência contra a mulher. A comunidade brasileira em Boston vive problemas semelhantes. Recebi o diploma de citação oficial do senador americano James B Eldridge durante um jantar de gala da ONG Associação de Mulheres Empreendedoras (AME), liderada pela ativista Lilian Mageski. O trabalho de fortalecimento e suporte à mulher vítima de violência doméstica tem sido fundamental. Está se intensificando no mundo. Já me compadeci e me indignei com muitas mortes e casos de agressão. Mas ainda é complexo entender o que leva um homem a agredir a sua mulher. Não faz sentido que, em 2019, cenas medievais como essas ainda aconteçam.

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Conheço as motivações que persistem numa sociedade patriarcal como a nossa. Sei também que você, homem agressor, talvez tenha vivido em um lar violento quando criança. E, possivelmente, viu o seu pai agredir a sua mãe. Talvez você tenha chorado e sofrido. Mas nos caminhos tortuosos da mente, você foi interpretando as agressões como um comportamento aceitável e rotineiro.

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Luiza Brunet Foto: Leo Martins
Luiza Brunet Foto: Leo Martins

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O que o leva a usar covardemente a sua força bruta? Talvez a mulher que você agride ainda o ame. Mesmo tendo lhe denunciado, ela talvez acredite que o seu comportamento pode mudar. Também é possível que ela já tenha identificado que vive em uma relação abusiva. Mas, sem independência financeira ou emocional, ela permanece onde está. Mas ela vai mudar.

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As agressões evoluem. Começam com brigas verbais e manipulações psicológicas. Ganham força com humilhações, cenas de ciúmes despropositadas, abusos de todo o tipo, intervenções de dominação. As brigas físicas vão tomando corpo. E, sim, literalmente, vão tomando o corpo da sua mulher de marcas roxas. Sei que, muitas vezes, você bebe. O abuso de álcool o descontrola. E você banaliza a agressão. Você, homem agressor, enxerga a violência como um ato insignificante. No dia seguinte, a estratégia é fingir que nada aconteceu, o que é patético, rudimentar e, acima de tudo, trágico.

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Gostaria de compreender melhor como você, homem agressor, age repetidamente sem qualquer sensação de temor ou de culpa. Segue agredindo, mesmo já tendo sido autuado com medidas protetivas garantidas pela Lei Maria da Penha. Essa lei é reconhecidamente uma das melhores leis de proteção à mulher em todo o mundo. Ela já existe há mais de 12 anos. Com a mobilização da sociedade, será melhor aplicada e as medidas protetivas serão melhor fiscalizadas. A Câmara dos Deputados aprovou o divórcio imediato em caso de agressão, que ainda passará pelo Senado. São vitórias importantes em curso. A Lei Maria da Penha prevê a adoção de estratégias de reabilitação para pessoas como você. O desconhecimento desse assunto dificulta a criação de políticas públicas. Por isso, pesquisas sobre o homem agressor têm se desenvolvido no Brasil e no mundo.

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Um estudo recente da psicóloga e pesquisadora Natalia Bueso Izquierdo, da Universidade de Granada, na Espanha, divulgado no Portal G1, comparou o funcionamento de cérebros de maridos agressores com cérebros de outros criminosos. A conclusão foi que os cérebros dos homens que agridem mulheres funcionam de forma diferente dos de outros criminosos. Algumas das características descritas: inflexibilidade cognitiva, pensamentos distorcidos, impulsividade e a dificuldade de assumir os próprios atos. Não há um perfil único, e é difícil determinar qual o peso dos fatores biológicos e sociais.

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A punição do crime é questão fechada, mas a reabilitação é uma batalha necessária para que a prevenção seja eficaz. O psicólogo Adriano Beiras, professor do programa de pós-graduação do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), observou em artigo recente que, no passado, havia preconceito com os trabalhos relacionados ao agressor. Até então se entendia que trabalhar com os homens que cometiam violência doméstica era trabalhar contra as mulheres. Mas cresceu o entendimento de que isso é um esforço para deter a violência e um trabalho pelas mulheres.

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Especialistas em saúde mental deveriam se engajar cada vez mais nessa causa. Eu me remeto ao caso de Jane Cherobin, brutalmente espancada pelo namorado Jonas Amaral, no Espírito Santo. Em entrevista ao Fantástico, Jane contou que as constantes humilhações e agressões verbais a levaram a romper com o então namorado. Veio, então, a agressão física nefasta que não a matou por um triz. Dias depois, o corpo de Jonas, foragido e procurado pela polícia, foi encontrado. Ele teria cometido suicídio. O que levou este homem a agir assim? Era alguém que precisava de tratamento? Como esse quadro trágico poderia ter sido evitado?

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Homem agressor, eu me dirijo a você com serenidade e firmeza: pare. Mude. Se trate. Se cuide. Se observe. Faça uma autoanálise sobre o seu comportamento com a sua mulher. Perceba o mal que você faz para quem está ao seu redor e para o núcleo familiar a que você pertence. Isso interfere nos seus círculos de convivência. O homem que agride é observado pelas pessoas com quem convive. É julgado. Isso é ruim para um homem.

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Costumo sugerir às mulheres que se valorizem, se observem e que tentem entender o que as faz tolerar esse sofrimento. Convido você, homem que agride, a fazer uma reflexão sobre sua vida. Perceba esse sentimento e tome uma atitude.

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Há programas de reabilitação de agressores, a exemplo do “Tempo de Despertar”, coordenado em São Paulo pela promotora de Justiça Gabriela Manssur, com bons resultados de reabilitação. O tratamento contra o marido agressor se assemelha a um tratamento anti-drogas. É importante o homem reconhecer o problema para a mudança ocorrer. Muitos conseguem se reabilitar.

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Os homens de verdade, com H maiúsculo, não batem em mulheres. Entenda que, se você não mudar, não escapará da justiça. A sociedade mudou. Não vai mais tolerar a violência doméstica. Quem ama não bate. Quem ama não mata. Não atire a primeira pedra. Não atire-se para agredir sua companheira. Respeite as mulheres. Respeite seus filhos. Respeite-se como homem. Sempre é tempo de mudar.

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* Luiza Brunet é modelo, empresária e ativista no combate à violência doméstica

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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