Saiu no site OAB SÃO PAULO:
Veja publicação original: Leis ampliam proteção para mulheres
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Legislações que ampliam a proteção e criminalizam atos de violência cometidos contra a mulher trazem pontos significativos para ajudar a combater o desrespeito ao sexo feminino. Na linha de frente estão as leis 13.641/2018, que tipifica o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha; e a 13.642/2018, acrescentando atribuição investigativa à Polícia Federal nos delitos praticados pela internet que propaguem conteúdos de ódio ou de aversão. Ambas foram sancionadas pelo presidente da República em 03 de abril último. Também recebeu sinal verde no Senado o PLC 18/2017, para incluir no rol de imputações a chamada “vingança pornográfica”, praticada por meio da divulgação de imagens da intimidade sexual da mulher. Este projeto, como sofreu alteração no texto, voltou para a Câmara Federal.
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Institutos que fazem o mapeamento da violência demonstram que, apesar dos esforços e das leis vigentes, os índices continuam altos. De acordo com o Relógio da Violência, do Instituto Maria da Penha, a cada dois segundos ocorre uma agressão doméstica e a cada 6,9 segundos uma mulher é amedrontada ou sofre perseguição. Levantamento do Conselho Nacional de Justiça mostra que o Brasil registrou no ano passado 1.273.398 processos referentes à violência doméstica contra a mulher. O número corresponde a praticamente um processo para cada 100 brasileiras. “A melhor luta contra esse problema é a denúncia. A mulher não pode ter medo”, pontua Helena Regina Lobo da Costa, professora de Direito Penal da USP e membro da Comissão de Criminologia e Vitimologia da OAB SP.
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Especialista em crimes contra a dignidade humana e finalidade da pena, Helena Lobo acredita que o caminho correto não está apenas naampliação da punição. A alteração legislativa prevê detenção de três meses a dois anos para o agressor que desobedecer a decisão judicial nesse sentido; atualmente, pelo Código Penal, são de quinze dias a três meses. De acordo com a advogada, para a mulher alcançar um tratamento distinto, especialmente dentro de casa, é preciso repensar o papel masculino. “Não vejo como o Direito Penal possa ajudar nessa questão”, avalia.
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Um problema apontado para se fazer cumprir decisões judiciais protetivas está na falta de estrutura das delegacias especializadas. São Paulo foi pioneiro na instalação desses estabelecimentos e é o Estado com maior número (133), contudo, quando os casos saem dos grandes centros, a dificuldade aumenta. Há delegacias que não têm viatura e não há número de abrigo suficiente para colocar a mulher agredida num lugar mais seguro. “Essas leis acabam, na verdade, mascarando a falta de infraestrutura”, acentua a professora de Direito Penal, para questionar as formas de assegurar tranquilidade à população feminina, vítima de violência.
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Ao conceituar a agressão contra o sexo feminino, a Organização dos Estados Americanos (OEA) reconhece que há violências cometidas apenas pelo fato de as vítimas serem mulheres.
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Dentre alguns dos conceitos de violência mundial está a “pornografia de vingança”. No Brasil, a legislação atual sobre o tema é voltada apenas para quem comete esse tipo de crime contra menores de idade. “Hoje o que temos é uma previsão no Estatuto da Criança e do Adolescente. Então remete somente à proteção para menores de 18 anos”, afirma Cristina Moraes Sleiman, advogada especializada em Direito Digital e presidente da Comissão de Educação Digital da Ordem paulista. O PLC 18/2017 traz essa alteração, com penas de prisão tanto para quem produz quanto para aquele que dissemina o material pornográfico, independentemente da idade da vítima, com reclusão de dois a quatro anos, mais multa, para o infrator. Ele irá alterar a Lei Maria da Penha e o Código Penal, e enquadrará como crime o registro ou divulgação, não autorizada, de cenas da intimidade sexual da mulher, um ato geralmente praticado por ex-parceiros das vítimas.
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Para coibir esse tipo de crime, cuja disseminação é muito veloz, é importante que seja feita a denúncia de forma rápida. Assim, evita-se alcançar um maior número de usuários da internet e pode ajudar na identificação do culpado, facilitada pelo Marco Civil da Internet, que em seu artigo 15 obriga o provedor a fazer o armazenamento de informações e identificação do usuário, por meio do IP (Internet Protocol), no prazo mínimo de seis meses. O número desse IP é fornecido individualmente para cada computador conectado à rede mundial.
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A presidente da Comissão de Educação Digital pondera, no entanto, que a arma para a mulher não cair em armadilhas da rede mundial da internet, principalmente após o término de um relacionamento, é a preservação da intimidade, não deixando ser fotografada em momentos íntimos. “As pessoas têm o direito de fazer o que quiserem, mas precisam lembrar que, além do risco de o vazamento ser feito pelo próprio companheiro, há a ameaça de raqueamento do computador ou de perda do celular com todo o material de vídeo ou fotografia”, pontua.
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Discurso de ódio
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Quanto à Lei nº 13.642/2018, que amplia as atribuições de caráter investigativo à Polícia Federal nos crimes praticados pela internet, Helena Lobo não enxerga diferenças concretas. “A Polícia Civil já faz esse trabalho na esfera da Justiça estadual em cooperação com outros estados. Mais importante do que isso, é verificar bem as provas coletadas”, acredita. A advogada, por sua vez, acrescenta que os tribunais superiores têm tido posição mais dura com relação aos crimes praticados contra a mulher, com prisão, mesmo em penas menores que poderiam ser substituídas pelas alternativas. A mesma lei destaca que a rede mundial de computadores também serve como canal para disseminar o discurso de ódio e a intolerância de gênero. Nesse sentido, Cristina Sleiman faz um alerta: “O desconhecimento da lei não exime o criminoso de suas responsabilidades e ele tem de saber que não adianta se esconder atrás da tecnologia, pois será encontrado”.
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