Saiu na TRIP
Veja a Publicação Original
As luzes do Ministério Público do Estado de São Paulo estão apagadas. É tarde e não há quase mais ninguém no prédio. O segurança abre para uma mulher jovem. Ela procura a promotora de justiça Gabriela Manssur, 44 anos, que fez dezenas de atendimentos ao longo do dia. A advogada é uma máquina de trabalhar. Acorda às 6 horas para correr, passa pelo salão de beleza quando precisa, e às 8h30 está pronta para assumir a missão de defender mulheres vítimas de violência.
Gabriela é uma referência em sua área, tem um blog sobre o tema há cinco anos (justicadesaia.com.br). Faz parte do Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) – onde também é diretora da Mulher da Associação Paulista –, é membro da Comissão dos Promotores de Justiça, representante do MP paulista na Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário de São Paulo e idealizou diversos projetos, como o Tempo de Despertar – Ressocialização do Autor de Violência contra a Mulher, que visa diminuir a reincidência dos agressores e se tornou lei em São Paulo, e o Tem Saída, que atua na inserção de mulheres vítimas de violência doméstica em situação de vulnerabilidade econômica no mercado de trabalho. Ela faz, ainda, mestrado em direitos políticos e econômicos.
Não foi simples chegar até aqui. Gabriela precisou, primeiro, ganhar autonomia financeira para conquistar o respeito da família – seu pai, sua mãe e seus irmãos também têm cargos na Justiça. Em nome da independência e da liberdade de escolher seu caminho, trabalha desde os 16 anos.
Sem parar
Aos 25, deu à luz Camila, que hoje tem 19 anos e prefere trilhar o caminho da moda como carreira. Enquanto amamentava, Gabriela estudava para ingressar no Ministério Público. Demorou quatro anos, mas conquistou o segundo lugar no concurso, o que lhe garantiu boas comarcas. Ela queria mais, mas o casamento não dava espaço para voar tão alto. Quando perguntaram se ela sossegaria depois de conseguir a vaga no MP, ela respondeu: “Não, agora é que vou começar”.
Separou-se. Foi questionada se daria conta de cuidar da filha, mudar de cidade e das demandas da carreira. Persistiu, como tudo o que faz. Quinze anos depois, conquistou um gabinete na capital paulista. Casou-se de novo. Assim como ela, o ex companheiro e o atual são da colônia árabe, mas o segundo “tem uma visão mais moderna”, o que faz com que entenda melhor a rotina atribulada. Com o atual marido, o empresário Claudio Trabulsi, 49, teve dois filhos: Felipe, 9, e Artur, 6.
Encampa também o desafio de criar meninos que saibam respeitar as mulheres. E de ajudar a filha adolescente a reconhecer os sinais de relacionamentos abusivos. “A violência contra a mulher começa com sutilezas”, avisa.
Gabriela admite que, às vezes, essa rotina pesa e a deixa dividida, especialmente com as crianças e a filha. Lamenta quando chega em casa e todos já dormiram. Mas acha que vale a pena quando nota que os filhos entendem a importância do que ela faz.
Atualmente se sente isolada na sociedade machista na qual está inserido o sistema de Justiça, situação corroborada pela ministra do Supremo, Cármen Lúcia, que disse que as leis foram feitas para homens, sem considerar a realidade das mulheres. Mas garante que não vai desistir: o que a move é a certeza de que esse trabalho é indissociável de quem ela é. “É a minha razão de ser.”