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Veja publicação original: Duas a cada três agredidas são vítimas de companheiros e ex
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Parceiros são os autores de 34% das 144.957 ocorrências de violência registradas em 2018
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Por Rafaela Mansur
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Duas a cada três mulheres vítimas de violência doméstica e familiar em Minas Gerais são agredidas por companheiros ou ex-companheiros. Segundo dados da Polícia Civil, das 144.957 ocorrências registradas no ano passado, 34% (49.722) foram cometidas por cônjuges e companheiros, e os ex-parceiros foram autores de 32% (46.436) dos casos. Para especialistas, o machismo e a cultura patriarcal, que persistem, são as principais causas da violência dentro de casa.
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A violência física tem o maior número de registros: foram 62.599. Em seguida, com 55.557 vítimas, está a psicológica, que, geralmente, dá início ao ciclo e, em muitos casos, não chega a ser denunciada.
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“O processo começa com a limitação de pequenas condutas, com a ideia de que a mulher tem que ser como o homem idealizou e precisa atender o que ele acha certo: não pode usar determinada roupa, precisa se portar de determinado modo, não pode beber demais. Muitas vezes, essa correção de condutas é aceita pela sociedade, e a vítima passa a pensar que está errada”, afirma a delegada titular da Delegacia de Atendimento à Mulher de Diamantina, Kíria Orlandi.
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“Se, em algum momento, ela foge desses padrões que ele criou, começam as ameaças, seja de tirar os filhos, de lesionar ou matar. Depois, quando acontece outro episódio com que ele não concorda, a violência passa para física”, completa. Segundo a delegada, devido a essa característica peculiar de ser progressiva, a violência contra a mulher precisa ser denunciada na primeira vez – as agressões crescem enquanto o ciclo violento não é barrado.
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Machismo
De acordo com a policial, os casos são resultado de uma sociedade machista e de um processo de subordinação construído durante os relacionamentos. “Isso faz com que o homem tenha certeza de que é superior e produz um trauma tão grande, que a mulher passa a ter dúvida se, de fato, deve obediência a ele. Essa sensação faz com que, muitas vezes, ela nem procure ajuda”, pontua.
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Segundo a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marlise Matos, a violência não é resultado de um processo natural, e, sim, de interações pautadas por controle e domínio dos homens sobre os corpos das mulheres. “Os relacionamentos, que deveriam ser espaço de cuidado recíproco, confiança, afeto e amor, são espaços de dor e terror para muitas mulheres. Infelizmente, essa forma de violência é tão naturalizada, que algumas delas acham que casamento é isso mesmo”, diz.
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“A escola tem o papel de fazer com que as crianças compreendam que cada ser humano é único e que essas hierarquias são formas de opressão. As mulheres são sujeitas, não são objeto”, defende.
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Há desafios para aplicar a lei
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A Lei Maria da Penha, sobre a violência contra a mulher, é avançada e completa, mas, segundo especialistas, há desafios na aplicação da legislação. A melhora nos serviços públicos também pode contribuir para a redução dos casos.
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“Uma frente imediata é acabar com a impunidade. Infelizmente, o poder Judiciário trata agressor doméstico como um agressor qualquer, concedendo liberdade provisória na primeira oportunidade”, afirma Kíria Orlandi, delegada titular da Delegacia de Atendimento a Mulher de Diamantina.
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Para a promotora de Justiça Patrícia Habkouk, da Promotoria Especializada no Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belo Horizonte, é importante aumentar o número de delegacias, juizados e centros de referência especializados: “É preciso uma polícia estruturada e equipada”.
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Para a defensora pública Maria Cecília Oliveira, a capacitação constante dos agentes públicos designados a atender mulheres é necessária. Ela acrescenta que a flexibilização da posse de arma no país vai aumentar os números de violência.
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Legislação
Avanço. Cerca de 40 projetos de lei relativos a direitos da mulher foram apresentados à Câmara dos Deputados desde o início dos trabalhos legislativos, no dia 4. Metade é contra a violência.
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