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As investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid serão conduzidas exclusivamente por senadores homens.
Os grupos partidários não indicaram senadoras mulheres para as 11 vagas titulares e 7 suplentes da comissão que vai apurar as “ações e omissões” do governo federal diante da pandemia. Os nomes foram lidos pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, nesta quinta-feira (15).
A ausência de mulheres resulta em dois principais efeitos, segundo as cientistas políticas ouvidas pela BBC News Brasil.
O primeiro é reduzir as chances de a CPI discutir os efeitos da pandemia e da atuação do governo federal diante dela para as mulheres, que foram atingidas de forma específica nas mais diversas esferas.
O segundo é retroalimentar a baixa participação de mulheres em espaços de poder, já que parlamentares mulheres estarão de fora do que deve ser o principal palco político do país nos próximos meses.
A falta de mulheres na comissão que vai tratar dos efeitos da pandemia no Brasil é marcante mesmo se comparada à baixa proporção de senadoras na Casa.
Se a CPI tivesse uma composição que refletisse a proporção de mulheres eleitas para o Senado, teria 2 senadoras titulares e uma suplente.
Dos 81 parlamentares em exercício no Senado, apenas 12 são mulheres (menos de 15%). A proporção é muito diferente das ruas: o número de mulheres (51,8%) na população brasileira supera o de homens (48,2%), segundo o IBGE.
Se a representação das mulheres no Congresso já é baixa, o acesso a posições de mais destaque lá dentro é ainda mais difícil, diz Flavia Biroli, professora de Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB).
“O acesso das mulheres a comissões e cargos dentro do Congresso, que são importantes tanto pela influência que elas podem ter ocupando esses cargos tanto quanto pelo fato de que gera visibilidade, é um acesso ainda mais reduzido do que o acesso delas à própria Casa”, diz. “Esse grupo completamente masculino na CPI só confirma como tem sido esse processo, historicamente, de exclusão.”
A cientista política Letícia Medeiros, co-fundadora da ONG Elas no Poder, que atua para ampliar a participação das mulheres na política, diz que a busca por diversidade nos espaços de poder vai muito além dos números.
“Essa composição diz muito sobre o quanto as instituições e os parlamentares eleitos ainda não entendem que diversidade no processo de diagnóstico, de análise, de produção de política pública é essencial para ter mais qualidade na tomada de decisão.”
Para defender a importância da diversidade, Medeiros destaca a influência das trajetórias e vivências pessoais de políticos nos processos de decisão.
“A gente quer olhar para as instituições e pensar que as pessoas são robôs ou máquinas, mas não é assim. Política é essencialmente um jogo de emoções, sentimentos e paixões. Quantas vezes vemos parlamentares dizerem ´meu filho viveu isso e sei que esse projeto é importante por isso´, ou fala do cunhado, da mãe…? Eles trazem narrativas familiares e é isso que move.”
E ter vários homens brancos ricos ali… Eles têm diferença de opinião, mas muitas trajetórias parecidas. E você tem diversidade partidária, não dá pra dizer que é só um partido.”
A CPI deve responder pelo menos seis perguntas centrais sobre a resposta do governo Bolsonaro à pandemia, segundo especialistas nas áreas da saúde, direito, gestão pública e economia ouvidos pela BBC News Brasil. Entre os principais temas, estão a aquisição de vacinas, a falta de oxigênio em Manaus, o estímulo a um suposto tratamento precoce sem eficácia comprovada e a interrupção do pagamento do auxílio emergencial no início de 2021.
Efeitos violentos para mulheres, principalmente negras e pobres
Biroli diz que a falta de mulheres na CPI da Covid é especialmente preocupante devido ao efeito específico desta crise nas mulheres brasileiras, que deveria ser abordado no debate. “Neste caso, tem um agravante. Estamos vivendo uma situação de catástrofe humanitária que incide de forma específica sobre as mulheres.”
Ela destaca que ter mulheres na CPI não garante que essa perspectiva seja necessariamente discutida, mas aponta que ampliaria as chances.
Biroli e outras pesquisadoras brasileiras em diversas áreas formaram a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas para defender a implementação de políticas dirigidas às mulheres nos campos da saúde, violência, educação, segurança alimentar, trabalho e geração de renda e moradia.
Uma carta do grupo, ainda a ser divulgada, aponta que a crise pela qual o Brasil passa atinge principalmente as mulheres pobres, negras e moradoras de periferias. O texto enumera os efeitos nas vidas das mulheres e diz que há uma “ausência completa de políticas públicas voltadas a apoiar as mulheres e meninas neste momento de crise humanitária”.