Saiu no site SAÚDE:
Veja publicação original: Amamentação: um desafio das mães que precisa ser mais discutido
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Por Maria Tereza Santos
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Um documentário ilustra como o aleitamento materno é vital, mas pode ser penoso por desinformação. Entrevistamos um médico envolvido no filme sobre o tema
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Termina hoje (7 de agosto) a Semana Mundial da Amamentação, realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e que tem como objetivo informar e conscientizar mães sobre a importância do aleitamento materno. Proposta semelhante tem o documentário “De Peito Aberto”, lançado no último sábado (4 de agosto), em São Paulo – mas com uma boa dose de realidade.
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O longa-metragem, dirigido por Graziela Mantoanelli, retrata a história de seis mulheres de realidades diferentes durante a amamentação, incluindo obstáculos pessoais, sociais e familiares que enfrentaram. Além disso, conta com a participação de diversos profissionais, que discutem o tema do ponto de vista histórico, social e, claro, clínico.
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Confira o teaser:
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No evento de pré-lançamento, Graziela revelou que, ao acompanhar a trajetória das mães desde antes do parto, percebeu a necessidade de se concentrar apenas no período de amamentação. Segundo ela, esse é um momento normalmente deixado de lado.
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“A gente precisava contar essa história. Essa é a história que não tem espaço. É o lado B”, explicou a cineasta.
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A produção da Deusdará Filmes foi financiada coletivamente por 700 benfeitoras e já começou a ser exibida em cineclubes, universidades e ONGs de todo o Brasil. Você encontra os locais e datas das sessões no site da plataforma Video Camp.
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Um dos médicos que contribuíram com o enredo foi Moises Chencinski, pediatra de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). SAÚDE conversou com ele no pré-lançamento:
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SAÚDE: Por que o aleitamento materno é importante?
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Moises Chencinski: Aleitamento materno é a base da vida. Esse é o tema da Semana Mundial de Amamentação de 2018. Podemos dividir essa importância em duas partes: o leite materno e a amamentação.
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O leite é um alimento específico, natural e vivo, que se adapta a cada fase da criança. Enquanto ela é amamentada, é oferecido tudo que é necessário naquele momento. O leite materno fornece para o bebê até os anticorpos que ele precisa.
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A cada dia, são publicados mais estudos mostrando a importância do leite materno. Um leite de fórmula tem 50 componentes, enquanto o materno, 250. Isso não quer dizer que não existam situações em que você tenha a necessidade de usar fórmula, mas isso deve ser a exceção, não a regra.
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Agora, quando falamos da amamentação, há a questão do vínculo: o contato pele a pele, olho no olho e a segurança que o bebê recebe através disso.
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O que o senhor achou de participar desse documentário?
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Temos a seguinte questão: a mulher se planeja nove meses para o momento do parto, mas não se prepara adequadamente em nada para a amamentação. Aliás, não é que ela não se prepara. Na verdade, ela não é informada.
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A gente tem três filmes do “Renascimento do parto”, mas nada relacionado ao aleitamento. Agora, finalmente, temos o primeiro filme que toca na ferida e traz a realidade que vemos no nosso dia a dia. Não são apenas essas seis mulheres. Elas representam milhares de brasileiras que passam exatamente por essas situações.
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Temos o depoimento de vários profissionais conhecidos mundialmente, de alto padrão nacional e que colocam as suas visões da realidade. Amamentação não é uma unanimidade ainda e não tem o apoio devido da sociedade, do poder público, dos profissionais de saúde e da imprensa.
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Essa é uma iniciativa corajosa e bonita da Graziela e que deve fazer alguma diferença, se a gente souber trabalhar com ele na continuidade.
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Por que não há consenso entre os médicos sobre a necessidade da amamentação exclusiva?
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Todos concordam que o leite materno é o alimento ideal, mas acredito que é necessário ter uma ênfase maior a respeito disso nos cursos de graduação. Tanto de medicina, enfermagem, psicologia, nutrição, fonoaudiologia, odontologia… a informação sobre a importância da amamentação na formação básica dos profissionais é pequena. Eles não conseguem orientar as mães, porque não aprenderam.
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Existe uma pressão social e da indústria de fórmulas, que trazem dificuldades para que essas informações cheguem aos profissionais e, a partir daí, passem a atingir mães, famílias e a sociedade de maneira geral.
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É muito mais fácil prescrever uma fórmula. E é mais difícil você dedicar tempo a ensinar e orientar. A mãe passa o pré-natal inteiro sem ouvir ninguém falar a respeito de amamentação. Na maternidade, raramente ela tem apoio para amamentar. As consultas com os profissionais que acompanham esse bebê também não são tão estimuladoras.
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Quais as maiores dificuldades no aleitamento materno?
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As principais são falta de informação e de acolhimento, o excesso de julgamento e as cobranças feitas em cima dessas mulheres.
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A informação não vem espontaneamente. Um exemplo de algo que acontece muito: a criança pega errado, a mama fissura, a mulher sente dor, ocorre uma infecção, surge um abcesso e, quando o bebê chega a 15 dias de vida, a mãe fala: “doeu até o 15º dia e aí o peito calejou”. Isso não tem o menor cabimento!
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Amamentar não deveria doer. Se ela fosse informada, orientada adequadamente sobre posicionamento e pega, se fosse acompanhada, apoiada e escutada, com toda certeza a gente conseguiria acolhê-la para que pudéssemos ajudá-la naquilo que tiver interesse e quiser fazer.
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Além da informação, é importante ter continuidade. Não adianta começar bem e largar a mãe achando que ela já sabe o que fazer dali para frente.
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Quais ações o governo tem feito para incentivar o aleitamento?
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Durante esse tempo todo, foram criadas várias iniciativas governamentais que são reconhecidas mundialmente como referências: Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC), Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno, licença maternidade e paternidade e a Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano, que é a maior do mundo.
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Porém, a informação precisa ser mais democrática e palatável e chegar em toda a população. Não podemos esperar que as pessoas venham buscá-la. Nós devemos levá-la de uma forma ampla e irrestrita.
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O nome da campanha do ano passado era “Todos juntos pela amamentação”. É isso que realmente precisamos: todos juntos (governo, sociedade, empresas). O dia em que os empregadores compreenderem que uma criança amamentada adoece menos e, consequentemente, fará sua mãe faltar menos e trabalhar mais satisfeita, teremos um avanço.
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Se a empresa apoiar a amamentação, a mulher vai trabalhar melhor. Se tiver uma sala para retirar leite no local de trabalho então, todo mundo sairá ganhando. Isso é comprovado mundialmente. Há uma diferença enorme em termos de ganhos financeiros por conta do aleitamento.
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No filme, é falado que isso não é mais um assunto de saúde, mas de educação. A importância de cada bebê ser amamentado e do leite materno deveria ser tema constante nas escolas e faculdades.
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Tudo é positivo quando se trata da amamentação, mas não é fácil, nem simples. Então, se todos juntos não trabalharem constantemente em prol disso, mesmo que tenhamos muitas ações, isoladamente elas não irão alcançar a meta da OMS. A previsão da entidade é de que, em 2025, 50% das crianças do Brasil estejam sendo amamentadas exclusivamente até o 6º mês de vida. Estamos muito longe disso.
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