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Alessandra Negrini: “Com tantos casos de violência contra a mulher, quem não é feminista, é cúmplice”

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE

 

Veja publicação original:   Alessandra Negrini: “Com tantos casos de violência contra a mulher, quem não é feminista, é cúmplice”

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Ela ganhou o Brasil como a “engraçadinha”, se mantém no imaginário popular como a “moderninha” e, como não lhe cabem apenas diminutivos, costuma fazer grandes vilãs na TV. Em entrevista a Marie Claire, Alessandra Negrini, 48 anos, fala pela primeira vez sobre o assédio que sofreu de um diretor, a dor da separação do cantor Otto, as viagens lisérgicas de ácido em meio à natureza e o despertar recente para o discurso feminista que, ela acredita, inibiu as grosserias e cantadas nos bastidores das novelas e deve transformar o Carnaval em uma festa mais igualitária – e divertida – para todxs

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Por Maria Laura Neves

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lessandra Negrini está resfriada. “Quase desmarquei a entrevista”, diz, enquanto abro o portão para esta conversa – a atriz não gosta de receber a imprensa em sua casa. Antes de posar para as lentes da fotógrafa Helena Wolfenson, ela pergunta se há algo para gripe. Ofereço um comprimido e um copo d’água, do qual ela declina: “Tem leite?”. Abro a porta da geladeira, Alessandra dispara: “Tem desnatado?”. Nas prateleiras, tenho apenas caixinhas do integral sem lactose ou de amêndoas. Ela opta pelo vegetal. Coloco dentro de um copo e lhe ofereço. “Você poderia esquentar? Não tomo nada gelado.”

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Alessandra Negrini (Foto: Helena Wolfenson)

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Tantos detalhes não são à toa. Além de virginiana, Alessandra é adepta de um tratamento na medicina ayurveda que a impede de tomar líquidos muito frios. A personalidade criteriosa é o que a leva, por exemplo, a escolher a dedo as personagens que interpreta na televisão – geralmente vilãs de personalidade subversiva e que ela adora (“o bom geralmente é chato, né?”). Por isso, ficou quatro anos afastada das novelas até que, no ano passado, deu vida à polêmica e inteligente Susana Adonato, em Orgulho e Paixão, folhetim das 6. Depois das férias na Europa, seu ano de 2019 começa como rainha do Acadêmicos do Baixo Augusta, um dos blocos de Carnaval de rua mais tradicionais de São Paulo, que no ano passado arrastou 1 milhão de pessoas pelo centro da capital e que comemora dez anos este mês. “O Carnaval é resistência”, diz, sobre a importância da festa diante do avanço da onda conservadora no país. Em abril estreia uma peça, Whisky, e, ainda no primeiro semestre ela deve lançar o longa Acqua Movie, com direção de Lírio Ferreira, rodado no sertão nordestino.

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Filha de um engenheiro e uma pedagoga, foi criada em Santos, litoral de São Paulo, sendo a mais velha de três irmãos. Da infância, traz as memórias das brincadeiras sobre as estátuas no jardim da praia. Da adolescência, recorda-se da boate do Clube Internacional de Regatas. “A vida toda gostei de dançar, das luzes de discoteca.” Na juventude, mudou-se para São Paulo, onde cursou jornalismo e ciências sociais, até se tornar atriz. “Sempre quis ser intelectual.” Explodiu aos 25 anos como a Engraçadinha, de Nelson Rodrigues, em uma minissérie de 1995 da TV Globo. Desde então, faz parte do time A da emissora, embora tenha rompido contrato com a rede. Mãe de Antonio, filho de Murilo Benício, e Betina, fruto do relacionamento com o cantor Otto, ela diz que o feminismo faz parte da educação dos seus filhos mais como exemplo do que como discurso. Afirma também que o movimento de mulheres transformou os bastidores da televisão brasileira. Graças à união entre elas, diminuíram os casos de assédio sexual e, principalmente, moral de diretores contra atrizes.

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Marie Claire A nova onda feminista impactou o Carnaval?
Alessandra Negrini Acredito que o comportamento [dos homens] está mudando. Não espero que se transforme do dia para a noite,estamos engatinhando no respeito à mulher. Somos um país extremamente machista, violento, mas estamos melhorando. A cobrança bastante dura das feministas é importante para chegar ao equilíbrio.

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MC Você se considera feminista?
AN Não dá pra não ser feminista hoje, com tantos casos de abuso, estupro, violência contra a mulher. Quem não é feminista, é cúmplice.

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MC Como o ativismo entrou na sua vida?
AN O discurso entrou na minha vida como na de todo mundo: recentemente. Mas antes dele, vem algo profundo, que é você solitariamente querendo conquistar seu lugar no mundo. Para a mulher, é mais difícil ser livre. Desde pequena queria ser independente, brigava com meu pai, desafiava as ordens – embora ele e minha mãe sempre me incentivassem a ser independente. O feminismo surge aí. E depois nas relações amorosas. Talvez seja uma das questões mais difíceis para o feminismo hoje: a relação a dois.

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MC O que precisamos trabalhar na relação a dois?
AN Os homens ainda acham que mandam na relação. Não tenho a menor dúvida. Mesmo os mais “modernos”, os de esquerda, que são os “esquerdomachos” – é inclusive o que mais tem. O homem ainda espera que a mulher ceda mais do que ele, abra mão de mais coisas por ele, que cuide dele. Ainda acha que a mulher é mãe.

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“Meu maior problema é a ansiedade. Tenho crises e por isso as drogas não são tão atraentes para mim”

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MC Por que um movimento como o Me Too, em que as atrizes se uniram para denunciar o machismo na indústria do entretenimento, não toma corpo no Brasil?Mexeu Com Todas”, em que tratamos disso. Por que você acha que não?

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MC Aqui tivemos apenas o caso do José Mayer. Nos Estados Unidos, muitos abusadores foram denunciados…
AN No Brasil você tem um grande empregador, que é a Rede Globo. Talvez as pessoas tenham um pouco mais de medo. Coisas do passado talvez nunca venham à tona, mas daqui para a frente, pode ter certeza que não vai mais acontecer. A relação está muito mais profissionalizada do que antigamente. Não sofri nada sério ou muito agressivo. Mas sempre há um assédio de um diretor, que acabava achando normal. Mas não é agradável. E mesmo esse tipo de assédio está deixando de existir.

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MC Como é esse assédio “brando”?
AN Diretor querer te beijar. Aconteceu comigo. Você chega para o cara e fala: “Não, se liga, não tô a fim”, e tudo bem. Agora, acredito que outras pessoas possam ter passado por coisas mais sérias. Mas o que acontecia muito é de os diretores se sentirem mais livres para oprimir as mulheres. Não tem a ver com a questão sexual. Casos de grosseria, de machismo. Até diretores gays sendo agressivos com as mulheres. Mas isso, posso assegurar, está diminuindo. Porque agora temos como relatar, entregar a pessoa e ter proteção. Antigamente, estávamos sozinhas. Hoje, existe uma rede de apoio. Essa união faz toda a diferença. Sofremos uma grande violência, que é a de jogar mulher contra mulher ao longo do tempo. “Mulher é inimiga de mulher, mulher não gosta de mulher.” É corrosivo. Isso está mudando, somos parceiras.

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MC Você faz análise. O que te levou à terapia?
AN Como um amigo disse uma vez: “No jogo, a gente precisa de um técnico”. Análise é um descomplicômetro. É muito difícil viver, gosto de ter esse técnico. Análise é um lugar em que você se ouve. Porque, senão, você começa a viver no senso comum, com a opinião do outro, que é horrível. É um lugar onde você constrói sua subjetividade. Mas também tem gente que não gosta. Tenho uma amiga superresolvida, ela não precisa, toma Daime. Cada um tem um caminho para encontrar um bem-estar.

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MC Já tomou Daime e outras drogas lisérgicas?
AN Nunca tomei Daime. Já tomei ácido, umas quatro vezes, foi superlegal. Ia para Visconde de Mauá e descobria a natureza. Mas não bebo demais, não faço nada demais. Mesmo maconha. Não gosto de perder o chão. Por isso as drogas não são tão appealing [atraentes] para mim. Gosto da música, dança, sexo, amor e literatura.

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MC Já teve depressão?
AN De ter que tomar remédio, não. Só tomei remédios naturais, floral de Bach.

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MC E ansiedade?
AN Meu maior problema é ansiedade. Tenho crises e a droga não me faz bem. Por causa das crises, acabo ficando triste. A ansiedade é você querer muito alguma coisa e ao mesmo tempo não saber o que quer. Nada está bom, sou crítica ao extremo, uma pessoa insatisfeita, é um grande defeito. Mas estou melhorando. Agora, com meu trabalho, por exemplo, luto para achar o caminho divertido.

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MC Sobre sua vida amorosa, já viveu um relacionamento poliamoroso?
AN Não. Nunca me aconteceu. Ainda sou muito possessiva para isso. Deve ser incrível para quem consegue.

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MC Já ficou com mulheres?
AN Ah, já beijei, mas nunca fiquei. O que parece inacreditável, né? As pessoas se surpreendem quando falo isso.

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“Aconteceu comigo de o diretor querer me beijar. Disse que não queria e ficou tudo bem. Mas não é agradável, né?”

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MC Qual foi o momento mais difícil da sua vida?
AN Talvez quando me separei do Otto. Tinha uns 42 anos, estava no Rio e vim morar em São Paulo. A babá que cuidava do meu filho morreu, estava me sentindo um pouco desamparada lá, sozinha, sem trabalhar. Mudei para São Paulo para ficar mais perto dos meus pais, queria raízes.

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MC E o que falta conquistar?
AN Mais paz de espírito, mais calma, mais alegria. Não que seja triste, mas quero ter mais tempo. Ainda corro muito, faço mil coisas ao mesmo tempo. Tudo é muito urgente, quero melhorar. Ter paz é um sonho de vida.

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Confira a entrevista na íntegra nas páginas da Marie Claire de fevereiro. Já nas bancas!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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