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Veja publicação original: A cada meia hora um processo de violência contra mulher é aberto no ES
Justiça já recebeu 14 mil processos de violência doméstica em 2017
A cada 30 minutos, um processo de violência doméstica contra mulher é aberto no Estado. Os dados são do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Somente nos sete primeiros meses de 2017, foram 14.115 novos procedimentos instaurados. São cerca de 52 casos por dia.
Atualmente, 54.127 processos de violência doméstica transitam no Estado. E como tentativa de redução desses dados, em breve, a punição para homens que agridem mulheres pode aumentar. No Brasil, são mais de 1 milhão de ações relacionadas à violência doméstica na Justiça.
Isso porque projetos que tramitam no Congresso Nacional podem aumentar o rigor da Lei Maria da Penha. O assunto foi apresentado pela promotora de Justiça e integrante da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Copevid) Lindinalva Rodrigues, em um encontro no Ministério Público do Estado.
Uma das propostas legislativas apresentadas tem como objetivo criminalizar o descumprimento da medida protetiva. “Hoje essa desobediência não é criminalizada. Com esse projeto, quando o homem descumpre, além de poder ser preso, ele vai responder pelo crime de descumprimento de medida de proteção. Seria um novo processo”, revelou.
Perseguição
Outro ponto a ser alterado, caso aprovado, é a criminalização da perseguição, ou “stalking”, nomenclatura em inglês que seria utilizada para caracterizar o crime. Atualmente, não existe nada na lei que impeça um homem de perseguir uma mulher, desde que não exista uma ameaça evidente.
“Existem casos de mulheres que terminam as relações e passam a sofrer perseguição dos ex-companheiros. Eles mandam 800 mensagens, vão aonde ela trabalha, passam a tirar a paz. Ele não faz ameaças, somente persegue e atormenta com a própria presença”, explicou a promotora Lindinalva.
Outra alteração considerada importante pela representante do Copevid é sobre a divulgação de imagens íntimas. A “Lei Carolina Dieckmann” é uma arma para as mulheres que sofrem com esse tipo de crime, mas só atende vítimas que tiveram o conteúdo furtado.
“Muitas vezes um ex-parceiro tem esse conteúdo da época em que ainda tinha o relacionamento e, para chantagear ou constranger, acaba divulgando em redes sociais. Agora o objetivo é que isso também se torne crime e não somente com imagens e vídeos subtraídos ilegalmente”, ressaltou Lindinalva.
Indefinição
Nenhuma dessas propostas têm previsão para serem votadas no Congresso Nacional. E é justamente o projeto que não é bem-vindo pelos especialistas que está mais perto de ser implantado.
É a PL 07/2016, proposta que visa dar ao delegado de polícia o poder para conceder uma medida protetiva. O projeto já entrou em pauta no Senado Federal e está em tramitação para ser votado.
De acordo com a promotora Lindinalva Rodrigues, essa atribuição é exclusiva do Judiciário e poderia tornar o mecanismo de proteção das mulheres algo político.
“Nós julgamos a proposta como inconstitucional. No Estado democrático de direito, isso só pode ser decidido por um juiz e não por um delegado, que pode ser pressionado por superiores quando se deparar com o caso de um agressor de classe mais abastada”, concluiu.
Só mudar leis não resolve
Apesar de considerarem importantes as alterações na Lei Maria da Penha, especialistas ouvidos pela reportagem defendem que as mudanças podem não diminuir os casos de violência doméstica contra mulheres no Brasil.
A coordenadora estadual de Enfrentamento à Violência Doméstica, juíza Hermínia Azoury, diz que a educação é o fator principal para que se consiga avanço no assunto.
“Nós temos propostas de inserir a temática de violência contra a mulher no currículo escolar. Esses infratores são oriundos de família com violência doméstica e acham que é normal, porque é a realidade deles”, afirmou.
No meio acadêmico do Estado, o assunto vem sendo discutido entre jovens universitários, que participam até mesmo de eventos internacionais. É o caso da estudante de Direito Alice Gomes Lobos Martins, de 20 anos. Ela é estudante da Faculdade de Direito de Vitória (FDV) e foi selecionada para participar de um fórum internacional de diplomacia na área de Direito de gênero, em novembro, em Montreal, Canadá.
A jovem acredita que mudar leis não resolve o problema. “As leis surgem para combater, mas não necessariamente criminalizar vai diminuir. A gente vive uma cultura machista e lei não vai mudar isso. Tem que ser desde criança, inserir isso na mídia, falar desse tema”, ressaltou.
O secretário de Estado da Segurança Pública, André Garcia, também não é adepto da mudança de leis e acredita que, além da educação, toda a estrutura que engloba o tema deveria ser melhorada.
“Tenho a impressão de que a gente deveria mexer menos na legislação e mais nos órgãos, para que eles possam funcionar melhor, atender melhor as mulheres. A gente tem um caminho muito longo ainda para caminhar no aspecto da estrutura de toda a rede de proteção às mulheres”, concluiu Garcia.
As propostas para mudar a Lei Maria da Penha
Stalking
Hoje: Não é considerado crime desde que não aconteça a ameaça. Mulheres sofrem com a perseguição de agressores e nada podem fazer a respeito.
Nova proposta: Tipificar como crime a perseguição contra a vítima, mesmo que não exista nenhum tipo de ameaça. Somente o fato de perturbar acaba virando processo.
Divulgação de imagens
Hoje: Lei Carolina Dieckmann protege mulheres que tiveram imagens íntimas furtadas ou obtidas de forma não permitida, que depois são divulgadas.
Nova proposta: Considerar crime também a divulgação não autorizada de imagens obtidas de forma legal, cedidas pela própria mulher, mas que não tiveram a divulgação autorizada.
Medidas protetivas
Hoje: O homem que descumpre uma medida protetiva pode ser preso somente se forem preenchidos os requisitos de prisão preventiva e ele não responder por um outro processo.
Nova proposta: Somente o fato do homem descumprir uma medida protetiva se tornaria motivo para prisão e ele ainda responderia a um novo processo na Justiça.
Reeducação
Hoje: Não existe um projeto obrigatório de reeducação dos agressores de mulheres.
Nova proposta: Em uma comparação com casos de embriaguez ao volante, quando a pessoa tem que passar por uma reciclagem, o agressor também seria obrigado, judicialmente, a participar de cursos de educação em relação à violência doméstica.
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