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Vaidade, no Brasil, sempre foi sinônimo de bons negócios. Com um faturamento em torno de 42 bilhões de reais por ano*, o país ocupa a quarta posição no ranking de maior mercado de beleza do mundo, perdendo apenas para Japão, China e Estados Unidos.
Nos últimos dois anos, no entanto, a crise afetou também a indústria de higiene e cuidados pessoais. Em 2015, pela primeira vez em 23 anos, houve recuo de 8%. Se entre as gigantes do setor soou o alarme, para estas três empresas nacionais – Adcos, Beleza Natural e Vult Cosméticos –, as más notícias da economia não surtiram efeito. Pelo contrário, todas registraram crescimento em relação ao ano anterior. Em comum, essas marcas, consideradas de médio porte, têm foco bem definido e são lideradas por mulheres.
Uma pesquisa promovida pela Glambox, serviço de assinatura de produtos de beleza, com 4 321 pessoas, registrou que 83% das entrevistadas, mesmo mais cautelosas com o orçamento, não abririam mão de seus cuidados com a pele, o corpo e o cabelo. “Para a brasileira, beleza não é item supérfluo. Ela pode até migrar para produtos mais baratos, mas precisa estar feliz com sua imagem”, afirma Leila Velez, sócia da Beleza Natural, marca carioca de produtos para cabelos crespos.
A capixaba Ada Mota, que investiu no segmento de dermocosméticos com a marca Adcos, aposta em mais crescimento. “Se a indústria da pasta de dentes, um produto tão básico, cresce ano a ano, não há dúvida de que ganharemos muito público com, por exemplo, o protetor solar, que ainda não virou hábito diário de todas as brasileiras”, diz. A fundadora da Vult, Daniela Cruz Cunha, acredita que tem vantagem em relação às empresas estrangeiras – um diferencial em tempos de crise. “Conhecemos essa mulher de perto, temos as mesmas preocupações e desejos”, afirma. Veja, a seguir, o caminho que essas empreendedoras percorreram para chegar ao topo e como pretendem se manter lá.
Ada Mota, fundadora e CEO da Adcos
A capixaba Ada, 62 anos, sempre foi vaidosa. A paixão por cosméticos a levou, primeiro, à faculdade de farmácia e, depois, à especialização em bioquímica. Recém-formada, foi para a França em meio ao boom dos dermocosméticos e lá estudou ativos importantes para a área. Voltou quando a tendência começava a aparecer por aqui e abriu, em parceria com uma colega, uma farmácia de manipulação. “Eu queria envelhecer bem. Então, criava um produto com os melhores ativos para isso. Aí, fiquei grávida e não queria ter estrias. Então a história se repetia”, lembra.
Dez anos depois, quando a empresa já tinha seis unidades, a dupla construiu uma fábrica. O negócio deslanchou. A parceria se desfez e a executiva continuou a empreitada. Com o respaldo de profissionais da área da saúde, a Adcos conquistou um nicho de mulheres que buscam produtos customizados.
A média de crescimento é de 20% ao ano. “O mercado de dermocosméticos é imaturo ainda. Por um lado, isso é bom, porque tem muito para expandir. Por outro, é complicado. É preciso educar as pessoas sobre a importância desses produtos, mostrar que não é só estética”, diz.
Hoje, dois de seus quatro filhos fazem parte da empresa que viram a mãe tocar sozinha desde pequenos. “Fiz lição de casa por telefone várias vezes; nem sempre estava presente. Senti muita culpa, mas hoje eles dizem que reconhecem o esforço”, afirma. Como nunca fez especialização em gestão, contou com uma equipe dedicada e consultores de confiança. “Acho que, se eu soubesse a dimensão que aquela ideia inicial iria alcançar, não teria tido coragem de começar.”
Leila Velez, sócia-fundadora e CEO da Beleza Natural
Leila e sua sócia, Zika Assis, estavam frustradas com as propagandas de xampu com mulheres de cabelos lisos. As cariocas de cabelos cacheados – assim como 70% da população brasileira – não se sentiam representadas. “Era uma miopia muito grande. Então resolvemos investir. Reunimos cinco sócios, vendemos o Fusca do meu marido e demos tudo que tínhamos”, conta Velez, 43 anos. Fundada em 1993, a Beleza Natural hoje conta com 4 mil funcionários e cresceu, só no ano passado, 13%. Agora, se prepara para sua primeira empreitada internacional: uma loja no Harlem, em Nova York. “Se conseguimos driblar a umidade no Rio de Janeiro, garantimos a qualidade do produto em qualquer lugar”, diverte-se a executiva.
No começo, ouviram muitos “nãos”, principalmente de investidores. “Éramos jovens, negras e ninguém acreditava no potencial do cabelo cacheado”, lembra. Por anos, todo o lucro era reinvestido. O segredo, entretanto, estava na ligação com a consumidora, que sentia, pela primeira vez, que alguém entendia suas mechas.
Na empresa, os treinamentos são constantes e há muita preocupação em passar esse conhecimento para as clientes. Eles ensinam, por exemplo, a desembaraçar sem quebrar os fios, usar toalha para tirar a umidade sem deixar frizz, aplicar o produto sem errar na quantidade… Os sócios da Beleza Natural também acreditam em um modelo de lojas móveis para driblar a crise. São caravanas que levam os produtos a locais distantes, onde o mercado tem potencial. “As mulheres estão se empoderando, e o cabelo, que é tão importante para nós, brasileiras, faz parte desse processo.”
Daniela Cruz Cunha, sócia-fundadora e diretora da Vult Cosméticos
Arquiteta de formação, Daniela, 43 anos, não tinha nenhuma experiência no ramo de cuidados pessoais até um amigo de infância propor o desafio: criar uma marca de maquiagem a um preço acessível para a brasileira. Fundada em 2004, a Vult Cosméticos cresceu impressionantes 45% no ano passado. “Fizemos um planejamento centrado no produto, garantindo a qualidade e aumentando o valor dele com embalagens funcionais.”
Cautelosa, reduziu os investimentos em marketing, mas manteve o plano de multiplicar os pontos de venda – já são 44 mil espalhados pelo país, sendo 30 quiosques próprios. Enquanto isso, sua família crescia: mãe de duas adolescentes, ela teve um menino no ano passado. “Aprendi a delegar mais para dar conta.”
Para ela, as redes sociais tornaram-se grandes aliadas, porque permitem detectar tendências e entrar em contato direto com as consumidoras. “Outra vantagem é a rapidez com que conseguimos ensinar as mulheres a usar nossos produtos. No início, tínhamos que viajar para diversas cidades oferecendo workshops e aulas. Hoje, com vídeos tutoriais, as clientes aprendem tudo; o desejo de marca está criado”, conta Daniela.
A proximidade também mostrou que é cada vez mais importante ter uma empresa com valores sólidos. Por isso, preocupa-se em manter funcionários e parceiros tão satisfeitos quanto os clientes. Para o próximo ano, o plano é conservar essa base sólida, criar um instituto social da marca e fundar uma fábrica própria.
*Dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal
PUBLICAÇÃO ORIGINAL: Três empreendedoras que acertaram ao investir no ramo da beleza