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Filósofa combate ideia de que luta contra machismo é mero conjunto de doutrinas e comenta a criação do #partidA
Jornal GGN – O feminismo não é uma ideologia, um conjunto de ideias e doutrinas que orientam as ações de determinado grupo. Nada disso, feminismo é a politização da condição de gênero ou, em outras palavras, o reconhecimento de que a sociedade é construída em cima da divisão de classes, dentre elas a de gênero, diferenciando o tratamento entre indivíduos, homens e mulheres.
O argumento de que o feminismo é uma ideologia se trata, portanto, de uma forma de desconstruir a luta contra a desigualdade de tratamento, baseada na condição de gênero. O assunto foi um dos temas levantados no programa Na sala de visitas, com Luis Nassif, pela filósofa e artista plástica Marcia Tiburi. A edição completa você acompanha nesta quarta (19), a partir das 18h, aqui no GGN.
“Os ideólogos da religião que são os ideólogos do gênero. Mas por que fazem isso? É um discurso misógino para combater justamente o avanço dessa discussão, que é um avanço que acaba libertando, tornando as pessoas concretas e individuais, sujeitos singulares autônomos”, sustenta.
A professora destaca que, historicamente, as ondas feministas sempre foram controladas pelo sistema e, em muitos casos, com grande violência lembrando, por exemplo, que a caça às bruxas no período medieval foi uma espécie de controle.
“As mulheres sempre morreram, foram massacradas, violentadas, humilhadas simbólica e fisicamente dentro da história”, pontua Tiburi, completando que a diferença hoje é que a atual corrente feminista tem ao seu dispor algo que as mulheres do passado não tiveram para dar vazão à luta e construção do debate sobre a desigualdade de gênero: a internet.
“Hoje temos uma nova onda [feminista] que se tornou muito forte porque, por mais que os meios de comunicação ainda sejam muito controlados a partir dos donos desses meios, que são meios de produção da comunicação, existe um certo escape no sistema, nas redes [sociais]. E as mulheres começaram a se dar conta, as meninas sobretudo [da necessidade de emancipação], e daí tem o lastro cultural que foi sendo construído ao longo da história”.
A filósofa avalia, ainda, que “o feminismo é uma máquina de protagonização e, a mesma angustia que faz uma pessoa ir para o Facebook e falar todas as merdas, faz uma pessoa ir para o Facebook falar muitas maravilhas, e faz também as feministas chegarem e dizerem ‘eu sou feminista’”.
Tiburi enfatiza que mesmo que algumas mulheres, ao assumirem o discurso feminista publicamente, não entendam em princípio o que é o feminismo, o reconhecimento da condição de gênero se torna porta de entrada para a politização, salientando que o aumento das contradições sociais contribuiu para o aumento de manifestações feministas.
“As mulheres estão cada vez mais conscientes disso [das injustiças de gênero] e as redes sociais ajudam nisso, porque criam, como meio de produção do discurso, uma autorização, a mesma que o fascista tem para fazer seu vomitório, cria também para a politização. E aí o que é a política? É a luta por hegemonia e todo mundo no dissenso, uns construindo consensos aqui e ali, a luta dos diversos grupos, das diversas questões, mas uma angústia, um agonismo, uma confusão, muitas vezes, e isso é a vida política, é a vida dessa tensão”.
Em junho de 2015, Márcia Tiburi iniciou uma série de encontros para criar um partido feminista de onde saiu o movimento #partidA, hoje com núcleos em várias partes do país.
“Nossa discussão começou com a ideia de fazer um partido feminista, com a proposta ético-política feminista. O que que é uma [proposta] ético-política feminista? Uma democracia feminista? É uma democracia radical que parte desse feminismo interseccional que discute raça, gênero, sexualidade, idade, classe social, que coloca junto com a discussão de classe a discussão de gênero que, aliás, é típico da história também dos teóricos e dos ativistas da luta de classes pensar sempre na questão de gênero”.
O título que o movimento ganhou, #partidA, logo nas primeiras reuniões, vem da ideia de deslocamento, com a proposta de se distanciar dos modelos partidários vigentes e que acabam reproduzindo as desigualdades do sistema. “[O nome] a #partidA virou uma metáfora política e uma questão simbólica”.