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País sofre com a falta de políticas públicas que visem o combate à violência de gênero

Saiu no GLAMOUR

Veja a Publicação Original Abaixo.

Segundo estimativa do Fórum Econômico Mundial, só daqui a 135 anos o mundo talvez atinja a equidade de gênero. Enquanto isso, é necessário pensar em ações afirmativas e de educação que ajudem a diminuir agressões a mulheres

Carros voadores, viver entre robôs, povoar outros planetas: a cultura pop costuma pintar uma série de cenários no imaginário popular sobre como o futuro pode ser. No fim das contas, não há muito como saber. Ninguém da atual geração viverá para ver como o mundo será daqui a 135 anos, por exemplo. Se a Terra terá a roupagem futurista de Jetsons ou de De Volta Para o Futuro, não sabemos. O que se pode prever é que só daqui a 135 anos o mundo talvez consiga atingir a equidade de gênero. A estimativa é do Fórum Econômico Mundial, divulgada em março em seu relatório anual sobre o tema, o Global Gender Gap Report 2021. Até então, a previsão anterior era de 99 anos. Ou seja, em um período de 12 meses, por conta da pandemia da Covid-19, o mundo se distanciou ainda mais de uma sociedade em que homens e mulheres serão vistos e tratados como iguais.

Nociva por uma série de motivos, a desigualdade de gênero é o cerne de um dos maiores problemas enfrentados pelas mulheres desde sempre e em todos os lugares: da importunação sexual ao assédio, agressões, estupro ou feminicídio, todas lidam com essas diferentes formas de violência porque foi institucionalizado que isso poderia acontecer e que homens possuíam o direito de fazê-las. Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, avalia que essas condutas têm uma construção social que é machista e misógina.  “O assédio e a importunação sexual são pautados por uma relação de poder muito desigual entre homens e mulheres. Ao pensarmos em causa e solução, se o que está causando o problema é um padrão de masculinidade, a gente tem que transformar a realidade através da educação”, diz.

Coube ao apelo popular a criminalização de uma série de condutas, como aconteceu recentemente com a violência psicológica e com o stalking, que é a perseguição reiterada, por qualquer meio, como a internet, que ameace a integridade física e psicológica de alguém. Há três anos a importunação sexual também se tornava um novo tipo penal. Até 2018, era considerada uma contravenção, um crime de menor potencial ofensivo. “Acho importante que a gente tenha hoje no nosso código penal uma previsão de importunação sexual como um crime, por exemplo. Talvez seja uma das únicas formas de chamar a atenção das instituições públicas e da sociedade sobre a gravidade do problema”, afirma Samira.

Ainda assim, os números mostram que criar um novo tipo penal não vai, necessariamente, inibir nenhuma prática. Só no último ano, 17 milhões de mulheres foram vítimas de algum tipo de violência, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “O problema não é criar um novo crime. O problema é o que a gente entende como punição. No caso do Brasil, é botar alguém dentro da prisão. Mas a gente poderia ter programas comportamentais, que obrigam o agressor a frequentar determinados grupos. Mecanismos mandatórios que façam com que ele passe por um processo, ouça vítimas de abuso, entenda o que isso causa no outro.”
Dados do Banco de Monitoramento de Prisões, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostram que o país tem hoje 913.850 pessoas presas. Um dado mais desfasado, do Departamento Penitenciário Nacional, do Ministério da Justiça, apontava pouco mais de 700 mil presos no país em 2019. Desses, apenas 3,58% estavam encarcerados por crimes cometidos contra a dignidade sexual. A questão que surge é: prende-se pouco por crimes relacionados a gênero? Especialistas estimam que os dados são baixos porque as vítimas têm receio de denunciar – quando o tema é violência de gênero, a subnotificação se torna regra. O mesmo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que das 17 milhões de mulheres vítimas de violência no último ano, 4 em cada 10 sequer pediram ajuda ou denunciaram. Teresa Cristina Cabral Santana, juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), destaca que o estupro, por exemplo, possui uma pena alta, ao contrário das outras formas de violência. No caso da importunação sexual, a reclusão é de 1 a 5 anos. Se o réu é primário, ele dificilmente será condenado em regime fechado.

A magistrada reconhece que o projeto se pauta na redução de danos, quando o problema já aconteceu. Desta forma, a educação de base para todos é algo imprescindível para lidar com o problema na raiz. “Infelizmente existe uma deturpação da intenção. As pessoas acham que falando de violência de gênero a gente está impulsionando determinados comportamentos, tal como falar de educação sexual. Sendo que estamos falando isso para que essa mudança de postura possa acontecer. Quanto mais a gente conseguir fazer com essa molecada, melhor. A gente aprendeu dessa forma e é difícil desaprender. Por isso tem preconceito e má informação, a tendência é normalizar determinados comportamentos. É um grande desafio se reinventar”, diz. Outro projeto semelhante é o Tempo de Despertar, este desenvolvido pela promotora de Justiça Gabriela Manssur, do Ministério Público de São Paulo (MPSP). Seu principal objetivo também é romper com os ciclos de violência, diminuir a reincidência, responsabilizar e acompanhar os agressores, e principalmente desconstruir o comportamento aprendido, que é ligado ao machismo, à masculinidade tóxica e à agressividade.

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