Saiu no site REVERPSI
Veja a publicação original: 365 dias e a romantização da violência:
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Hoje eu assisti um filme bem bosta, e assisti esse filme bem bosta porque vi pessoas falando que ele era bom, que gostaram, que mal podem esperar a continuação…ai ai ai, eu tenho é medo dessa continuação. Enfim, o filme se chama “365 dias” e é tão ruim, que é possível dividir aquilo que é ruim, em tópicos, e, pensando bem, vou fazer isso.
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Antes, de começar, um resumo da história, trazida pelo filme (não pelo livro): A trama se desenrola a partir da história de Laura Biel, uma diretora de um hotel de luxo, e de Massimo Torricelli, um chefe da máfia Italiana, que assume os negócios da família após a morte da pai. Massimo cria uma obsessão por Laura, após uma experiência quase morte que teve, onde ela surgiu como uma “visão”, colocando ela então em um lugar de Toten. Laura namora um clichê dos namorados ruins de filme (o homem careca, baixinho, que não presta atenção na namorada e a trai). Magicamentena, em uma viajem, o destino os coloca na mesma cidade e eis que, rufem os tambores…. Massimo sequestra Laura!! Uau, super de boa né? Ele a sequestra e a leva para a sua mansão, onde lá propõe a ela que fique com ele por um período de 365 dias, para que ela se apaixone por ele, caso não aconteça (esse amor tão natural) ela estaria livre.
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Bom, vamos então aos tópicos:
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* A história é fraca, as atuações são ruins, as cenas são cortadas, de modo que a história fique desconexa. Ignorando o contexto que os personagens se unem, de uma hora para outra Laura se apaixona por Massimo, mas não vemos isso acontecer. Só vemos “provocações”, pouco diálogo, e, de repente uma transa que não acaba nunca que planta o amor. A partir daí o filme vira uma sequência de cenas eróticas e o relacionamento dos dois é só flores e eles já sabem que são alma gêmeas.
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* Massimo é violento com Laura, desde a primeira cena que tem juntos, onde a imobiliza, a “segura pelo pescoço”, lhe puxa os cabelos…o filme tenta colocar que existe uma tensão sexual no ar, logo de início, mas nossa né, quem na ia molhar a calcinha nessa situação?
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*Massimo obrigada Laura a ver ele transando com outra mulher…aqui vamos por partes:
1- forçar a pessoa a ver cenas sexuais, contra a sua vontade, caracteriza estupro…
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2- esse tipo de coisa parte da premissa que a mulher vai se apaixonar pelo pau do cara. Pensando bem, isso explica muita coisa, na verdade… Levanta a mão qual mulher nunca recebeu uma foto de um pênis, sem pedir, sem estar numa conversa de cunho sexual ou de alguém estranho que nunca conversou?
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* Massimo é o personagem, também clichê, dos romances: rico, bonito, tem tudo a sua mão. Aí vem o pessoal “queria ver não se apaixonar”. Mores, o problema não é ele ser clichê, rico, blá blá blá, o problema é a naturalidade com que é aceito a violência implícita nessa relação. Ele cerceou a liberdade dela, fez ela abandonar o emprego, e tudo normal, porque eles vão se apaixonar…(ah, e ele também aprovava as roupas dela)…
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* O filme, claramente, traz a premissa de que “não, na verdade quer dizer sim”, que tem que “insistir”, ou “disse não, mas gostou”, que tudo bem ficar de boa com quem forçou uma “relação”. Aí podem dizer “ah, mas foi consensual”. Foi? Ela não escolheu ficar com ele, ela foi forçada, e aí, a partir disso desenvolve um tesão inexplicável por ele.
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Não tô aqui criticando o fetiche (seja de ter um homem rico, possessivo, dominador, ou de ser submissa, ou o que quer que seja o fetiche). O porém é que tem que ser consensual. Quer praticar BDSM? Tudo certo! Consensual. Forçar alguém a participar, já caracteriza uma violência.
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Vocês já pensaram em quantos homens abusam de suas companheiras com o “não queria, mas bem que gostou”, ou com o “tava usando essa roupa pra me provocar”, não somente como forma de “justificar” um estupro, mas também de praticar violência doméstica e psicológica com suas esposas? E quantas mulheres que efetivamente acham que tudo bem em relação a isso, afinal, as coisas são assim, “ele é homem”, “eu tenho que me comportar porque se não vou perder ele”…
O desconforto em ver o filme vem disso, além da história péssima.
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Em fato, o filme até poderia ser um pornô (se tivesse cenas de sexo). Seria um pornô ruim, por óbvio.
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Mas não sendo, arrisco dizer que tem chances de ser o próximo vencedor do Framboesa de Ouro.