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Veja publicação original: A história das mulheres que comandam uma das docerias mais antigas do mundo
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A loja de doces Haci Bekir, de Istambul, tem vendido delícias turcas há dois séculos, graças, principalmente, às gerações de mulheres boas de negócios.
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Por Demetrios Ioannou
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Em uma tarde de verão, minha balsa se aproximava lentamente do porto Eminonu, em Istambul, onde a vista do cais é algo impossível de se acostumar, não importa quantas vezes eu faça o mesmo trajeto. Quando o sol começa a se pôr, a antiga cidade é banhada por um vermelho-dourado, e as silhuetas das grandes mesquitas me levam de volta ao período otomano, que começa por volta de 1300.
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Entre os muitos remanescentes dos tempos otomanos espalhados pela enorme cidade, talvez o menor – mas com certeza mais saboroso – fica a apenas uma curta caminhada do porto, em uma rua estreita atrás de Yeni Cami (Nova Mesquita), no distrito Bahçekapı de Istambul. É a loja Haci Bekir, que há mais de dois séculos vende delícias turcas a moradores e visitantes.
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Hande Celalyan me aguardava no interior da Haci Bekir, de fachada elegante e discreta, administrada por ela e pela irmã Nazlı İmre. “Agora somos duas meninas que gerenciam o lugar. Somos a quinta geração do negócio familiar”, contou-me com orgulho Celalyan, gesticulando em direção a um bufê glorioso abastecido com dezenas de sabores de delícias turcas, entre outros doces.
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MULHERES VALORIZADAS
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Gerenciar a empresa mais antiga do país – e uma das cem mais duradouras do mundo – não é tarefa fácil, especialmente para uma mulher em um país onde homens ainda são grande parte dos chefes de família. De acordo com uma pesquisa recente do World Business Culture, apenas 24% das mulheres turcas têm emprego, apesar de a Constituição do país defender direitos iguais para homens e mulheres no mercado de trabalho. Isto, no entanto, nunca foi um problema na empresa Haci Bekir. “As mulheres sempre foram valorizadas [em nossa família]. O preconceito contra mulheres no comando nunca foi uma questão”, disse Celalyan.
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Aberta em 1777 pelo trisavô de Celalyan, o confeiteiro Haci Bekir Effendi, a loja é responsável por criar as delícias turcas como são hoje conhecidas. Chamadas em turco de lokum, estes pequenos e gelatinosos cubos são os doces turcos mais amados mundo afora.
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Nascido e criado em Araç, uma cidade no norte da Turquia na província de Kastamonu, Bekir Effendi emigrou para o que hoje é Istambul, capital e centro de negócios do império otomano, para abrir seu negócio de lokum. Quando o amido de milho foi criado em meados do século 19, Bekir Effendi mudou sua receita original, substituindo a farinha pelo amido de milho como o ingrediente principal, o que deu ao doce uma consistência peculiar, que é exatamente o que o diferencia.
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Sua deliciosa criação – cuja receita, mantida em segredo, é a mesma usada por sua família até hoje – ganhou notoriedade na cidade, e sua fama chegou ao palácio otomano. O então sultão Mahmud 2º nomeou Effendi como confeiteiro-chefe do palácio, uma grande honra que sua família manteve até o fim do império otomano, em 1920. Parte do território forma hoje a Turquia.
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Embora um homem tenha começado o negócio, foram as mulheres que assumiram a engrenagem da companhia no último século. “Não há diferença entre ser homem ou mulher contanto que você seja bom no que faz”, comentou Celalyan.
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Celalyan tinha apenas 25 anos quando assumiu a chefia de Haci Bekir, em 1986. Embora tenha se formado com um mestrado em negócios pela Universidade de Zurique, na Suíça, ela ainda era nova e inexperiente no mundo dos negócios. Mas tinha um forte exemplo feminino: sua bisavó Reşide. O avô de Celalyan, Ali Muhiddin, era muito jovem quando foi encarregado de administrar a loja depois que seu pai morreu. Ele dependeu muito da mãe Reşide, que o apoiou como uma conselheira confiável.
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ERA DE OURO
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Sob os olhos observadores de Reşide, Haci Bekir se tornou um negócio conhecido internacionalmente. Como seu antepassado, Muhiddin assumiu a posição de confeiteiro-chefe do palácio otomano nos anos finais do império. Em 1911, ganha também o título de confeiteiro-chefe também do palácio do Egito. Ao longo das décadas seguintes, as confecções de Haci Bekir foram aclamadas por críticos de gastronomia em Nova York e Paris. “Aquela foi a era de ouro da companhia”, afirmou Celalyan.
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Embora Muhiddin fosse a imagem de Haci Bekir, Reşide continuou como sócia igualitária do negócio, ao mesmo tempo em que criava outros três filhos. Ela também ajudou seu filho a internacionalizar a empresa, o que era pouco comum para mulheres da época (ela foi uma das primeiras mulheres a ter um passaporte na recém-criada República da Turquia). Além disso, Reşide se engajou em trabalhos de caridade, pelo qual ela recebeu uma medalha da Associação do Crescente Vermelho Otomano, ligada à Sociedade do Crescente Vermelho Turco, a maior organização humanitária do país. “Ela foi muito à frente de seu tempo”, disse Celalyan.
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Como no sultanato otomano, a loja de lokum Haci Bekir tem sido passada de uma geração para outra. Como única filha de Muhiddin, Aliye Şahin (mãe de Celalyan) tornou-se a primeira mulher a oficialmente cuidar do negócio em 1974. Ela então passou a loja para Celalyan e sua irmã.
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“Todas nascemos neste negócio e o temos em nosso sangue. Ninguém nos forçou. Nós o temos como uma herança cultural mais do que um negócio”, disse. A filha de 29 anos de Celalyan, Leyla, já está trabalhando na loja e provavelmente terá um cargo de chefia junto com seu irmão Sahan.
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Muitos empregados também têm uma ligação geracional à Haci Bekir. A maioria é descendente dos primeiros funcionários. “Somos uma grande família”, disse Celalyan com um sorriso. “Não apenas a família dos donos mas nossos empregados e clientes também. Temos muitos clientes que conhecem o produto por seus avós. Tudo está mudando muito rápido no mundo, então se você vê algo familiar de sua infância, isso traz conforto.”
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Hoje, o negócio Haci Bekir inclui cinco estabelecimentos em Istambul, e eles distribuem sua famosa delícia turca para clientes ao redor do mundo. Embora a delícia turca seja o produto mais popular da marca, as lojas também vendem balas, halva (doce típico do Oriente Médio), biscoitos, bolos e outros doces.
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O segredo de sucesso deles é a inovação. “Temos que acompanhar as tendências e não ser apenas um gosto tradicional. Do contrário, você próprio e os clientes vão se cansar”, contou Celalyan enquanto eu mastigava uma delícia turca com sabor de gengibre. Embora os sabores de pistache e rosas sejam os mais vendidos, a loja também vende delícias turcas de menta, canela, laranja, limão, romã, geleia e até chocolate.
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“Temos centenas de sabores diferentes”, diz Celalyan com um largo sorriso.
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