Desde a denúncia do estupro coletivo de uma adolescente de 16 anos no Rio de Janeiro, mulheres foram às ruas protestar “por todas elas”. Além de pedir a punição dos envolvidos em estupros, as manifestantes buscam acabar com o ciclo de silêncio sobre abusos que começam desde a infância.
Após acordar com o tio passando a mão em seu corpo de oito anos, Tamires Costa, 28, conta que sentiu medo. “Nunca revelei para ninguém da minha família.”
Com o rosto riscado de batom, a estudante Marina Ortega, 19, lembra que aos sete anos teve uma experiência de abuso dentro de casa. “Era uma criança e meu primo, de 14 anos, tentou passar a mão na minha genitália.”
Essas são algumas das histórias contadas nos poucos metros do vão do Masp, em São Paulo, onde mulheres se encontraram nessa quarta-feira (8) para pedir o fim da cultura do estupro e dizer que “o silêncio mata”.
De acordo com os dados mais recentes, o Brasil tem um caso de estupro notificado a cada 11 minutos. Os números são do 9º Anuário Brasileiro da Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 70% dos casos, o abuso é cometido por parente, namorado ou conhecido da vítima.
Em casa, na rua, no metrô: mulheres relatam abusos
“Tenho um tio que sempre ia em casa aos domingos de manhã. Um dia, quando eu estava com oito anos, ele entrou no quarto onde eu e minha irmã dormíamos e me assediou, passou a mão em mim. Eu fiquei com medo e fingi que estava dormindo. É uma história que eu nunca contei para minha mãe, nunca revelei para ninguém da minha família. Esse tio ainda frequenta minha casa, mas eu evito qualquer tipo de contato. Depois que entendi melhor o que aconteceu criei repulsa por ele.”
Isabela Araujo, 18, estudante
“Era uma festa de família, entre amigos. Quando ficou tarde, eu e outras crianças fomos dormir, eu tinha cerca de oito anos. Acordei com o ex-cunhado do meu pai beijando meu corpo todo, por cima da minha roupa. Na época, eu não tinha a noção que tenho hoje, de que isso é um abuso. Então só saí do quarto e procurei meu pai, mas não contei nada. Eu tinha vergonha de falar.”
Yuwen Muang, 26, estudante
“Estava voltando para casa e, assim que desci do ônibus, notei um homem dentro de um carro mostrando as partes íntimas e se masturbando. Comecei a andar mais rápido e depois saí correndo. Quando cheguei à esquina, ele ligou o carro, passou por mim, parou o carro do outro lado da rua, abaixou o vidro e ficou me encarando. Eu fui embora correndo. Tinha 18 anos, fiquei com muito medo.”
Carolina Marano, 18, estudante
“Há mais ou menos três meses, eu estava dentro do vagão do metrô e um homem se jogava em mim toda vez que o trem parava. Eu mudei de lugar, fui para perto de outras pessoas e ele foi atrás. Sentei em uma cadeira e ele começou a esfregar as partes íntimas em mim. Me levantei chorando e desci na primeira estação.”
Regina Petrelli, 49, bióloga
“Eu trabalhava em uma multinacional quando tinha 26 anos e meu supervisor me perseguia. Sob a desculpa de acompanhar meu trabalho, ele se hospedava nos mesmo hotéis quando havia viagens, falava muitas coisas, me assediava mesmo. Durou um ano. Não aguentei e pedi transferência. Me mudei para outra cidade a 400 km de distância. Mudei o rumo da minha vida por causa dele.”
Marina Nascimento Schimidt, 28, veterinária
“QuanDo tinha uns 12 anos, sempre saía na rua do meu condomínio para ficar conversando com a turma. Um dia, eu e uma amiga saímos depois da escola. Tinha um grupo de 10 meninos, entre 14 e 16 anos. Eles decidiram fazer uma brincadeira de ‘atiçar’. Nós pedimos para pararem, mas eles fizeram uma roda em volta da gente e começaram a passar a mão. Me lembro de tentar chutar, dar soco, mas eles não paravam. Nós saímos correndo e eles ficaram nos xingando. E eles eram nossos amigos, um dia antes a gente estava junto.”