Saiu no site AZ MINA:
Veja publicação original: ‘Você é homem. Nunca vai passar por uma rua vazia e pensar que poderá ser estuprado’
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‘Você não precisa usar disfarces, você não precisa fingir ser simpático, você não precisa se proteger’
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Quando você se depara com vários homens em um local, seja num vagão do Metrô, numa calçada qualquer ou num bar (você só quer tomar uma cerveja, poxa vida!), o medo vem como um tapa na nossa cara. A gente acorda com aquele sinal de alerta que adquirimos desde muito pequenas, quando nos diziam para “sentarmos como mocinhas” porque tem sempre um homem olhando.
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Ontem eu me senti insegura com apenas um homem me olhando. Não apenas isso: falando comigo, estando lado a lado comigo, me filmando. Eu, sozinha.
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A faculdade está me enlouquecendo nesses últimos meses com trabalhos e pressões. Um deles está me deixando doente psicologicamente, cogitando até a ideia de não mais frequentar as aulas. Você pode imaginar o quanto minha saúde mental está em cacos. E de quebra, ainda tive que lidar com o medo de fazer um trabalho odioso da faculdade com um homem completamente desconhecido.
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O trabalho consistia em fazer umas filmagens. Eu já havia feito uma versão da filmagem com meu grupo de trabalho, mas o professor, um homem extremamente grosseiro, reaça, machista, arrogante e debochado, não gostou do resultado e exigiu que refizéssemos.
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Eu sou a pior pessoa do mundo para lidar com críticas e com homens escrotos, então minha autoestima já entrou em combustão a partir daí.
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Nós não tínhamos equipamentos adequados para isso, então tivemos que apelar para um homem indicado por um colega nosso. Chegou o dia da filmagem e os dois únicos homens membros do grupo não puderam me acompanhar. Ah não…
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A partir daí, o nervoso veio e veio com tudo. Não mais como um tapa, mas como um soco no estômago. Mas eu tinha que ir. Afinal, é um trabalho que vale nota. E para o meu nome não ocupar um lugarzinho numa possível lista de alunos odiados por esse professor.
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E lá fui eu. Três linhas do Metrô depois, cheguei ao ponto de encontro combinado. O cara me manda o seguinte áudio: “Oi Fernandinha, já cheguei aqui. Tô do lado de fora da estação porque fui comprar um cigarro aqui no bar, mas já tô aqui te esperando.”
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“Fernandinha”?
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Lá estava ele. Ok, me cumprimentou e foi educado. Provavelmente esse cara deve ter achado que conversas pelo WhatsApp deram a intimidade pra ele me chamar de “Fernandinha”.
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Até o local das filmagens, ainda precisávamos pegar um ônibus, que estava mais ou menos cheio. Uma boa parte das pessoas foi descendo nos pontos e alguns lugares ficaram vazios. Eu me sentei e ele sentou-se ao meu lado. Deusa, me proteja, mentalizei. Homens são espaçosos, e ele não era diferente nesse quesito: sentou muito próximo de mim, com as pernas abertas. Ótimo. Manspreading.
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Ele foi durante todo o trajeto falando sobre o trabalho de cinegrafista com as pernas abertas, bem de boa. Mas eu não estava de boa.
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Enfim, descemos e fomos andando até o local das filmagens, dentro do campus de uma grande universidade pública que fica bem vazia à tarde. Quando dei por mim, estava completamente sozinha com ele numa pequena rua de lá. Ai o medo bateu pra valer.
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Minha mente foi a mil: eu tenho que fazer esse trabalho mas ele pode me assediar, ele pode me tocar sem meu consentimento, ele pode me empurrar no matagal da raia olímpica e me estuprar. Caralho, eu tava sozinha com um homem no meio de uma rua sem movimento! É impossível não pensar nessas coisas quando você é mulher e está sozinha com um homem desconhecido.
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“Imagino o quanto deve estar sendo complicado né… Afinal, você tá sendo filmada por um alemãozão grandalhão, ogro e chucro”, ele comentou, notando meu nervosismo.
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Meu disfarce já tinha sido arrancado do meu corpo franzino quando entramos na rua vazia. E não moço, você não imagina não. Aliás, isso nunca passará pela sua cabeça. Você é homem. Você não precisa usar disfarces, você não precisa fingir ser simpático, você não precisa se proteger. Você nunca vai passar por uma rua vazia e pensar que poderá sofrer assédio ou ser estuprado.
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Nada disso aconteceu. Ainda bem.
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Voltei pra casa com o psicológico destruído. Ele voltou pra casa comemorando mais um trabalho feito e a grana depositada em sua conta”.
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