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Veja publicação original: Mulheres e drag queens chegam à chefia de baterias universitárias
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Por Leticia Dauer
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Mulheres e membros da comunidade LGBTQ estão fazendo mais barulho do que nunca em faculdades de São Paulo: ao menos dentro das baterias universitárias, que ganham suas primeiras presidentes e líderes, rompendo a hegemonia masculina.
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A presidente Gabriela Cesaro, 23, e a mestre Julia Thayna Bet, 21, são mulheres e comandam a Infanteria, bateria formada por 80 alunos da Universidade Federal do ABC (UFABC), por mais que 70% dos ritmistas da trupe ainda sejam homens.
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Desde sua fundação em 2009, é o primeiro ano que a Infanteria tem uma mestre do sexo feminino. “Os ensaios ainda não começaram e estou nervosa em ser a primeira mulher a liderar a bateria, pois há muitos ritmistas que são mais velhos do que eu e ex-alunos. Não sei qual será a reação deles ao ver uma mulher à frente”, diz Bet vestindo uma camiseta verde e preta, cores oficiais da bateria, enquanto ajeita os cabelos cacheados.
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Bet é responsável pelos ensaios da “Infanteria Show”, que faz apresentações em casamentos e cervejadas da universidade, principal meio de arrecadação da bateria. Diferente do repertório em torneios dominado pelo samba, esses shows têm músicas com ritmos de funk, MPB e até rap.
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Há três anos na bateria, Cesaro é a segunda mulher a ocupar a presidência e conta que nunca se sentiu desrespeitada no cargo. “Muitos meninos entram machistas e conservadores, porém vão se desconstruindo com a ajuda dos amigos e das entidades que frequentam, como a bateria”, afirma a presidente da Infanteria, que leva uma hora e meia para ir da sua casa, no Brooklin, na zona sul de São Paulo, até a UFABC em Santo André. Sob a sua batuta, a bateria venceu o Interbatuc 2017, torneio nacional de baterias universitárias.
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Drag no samba
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Guilherme Felício, 19, é estudante de publicidade e propaganda e nas horas vagas é diretor de criação na Bateria do Pucão, do curso de Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), porém isso não é tudo. O jovem também se divide em Samira Felicious. A drag queen conseguiu nascer e se desenvolver graças ao espaço acolhedor da bateria, na qual metade dos integrantes são LGBTQ.
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O ritmista relembra que logo em sua primeira apresentação estava usando salto alto e não parou mais. Sua primeira criação foi a Puqueleza, uma personagem com características caninas influenciado pelo Pucão, o cachorro que é mascote da bateria. Em seguida, inspirado pela drag youtuber Lorelay Fox, começou a se montar e se maquiar até o nascimento da Samira Felicious.
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Assim como a cantora Pabllo Vittar, durante suas montações, Felício se descobriu não-binário, ou seja, se identifica tanto com o gênero masculino quanto o feminino. “Eu comecei a me auto-afirmar nos espaços que eu frequentava, e que eram completamente heterossexuais. Então eu me senti forte o suficiente para me reencontrar. Hoje não me importo em ser chamada de ele ou ela”.
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Como não-binário e drag queen, ele espera inspirar outros estudantes a assumirem sua sexualidade e participarem das entidades da universidade. “Eu gosto da bateria e da atlética, porque hoje eles são abertos a entender o que eu digo e me respeitam. É importante também desvincular a imagem machista e conservadora das gestões passadas”, diz Felício que apesar de usar óculos de grau não esconde as sobrancelhas perfeitamente desenhadas.
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Uma bateria feminina
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A Bateria Cásper Líbero é dominada pela força feminina, sendo mulheres 40 dos 57 ritmistas. Além disso, em 20 anos, essa é a segunda vez que uma mulher ocupa o cargo de diretora de modalidade, correspondente ao de presidente. Manuela Barbosa, 19, conta que o ambiente da bateria é muito livre. “O repinique [um tambor pequeno com pele em ambos os lados], por exemplo, é um instrumento considerado masculino e normalmente só tem um por bateria. Entretanto nós temos seis mulheres tocando repiniques e eu sou uma delas”.
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Como diretora de modalidade, Barbosa é responsável pela comunicação entre a bateria e a atlética. Apesar da predominância feminina, durante as reuniões com os representantes das outras entidades, ela relata que não é ouvida ou recebida da mesma maneira que seu vice-diretor. “Quando assumi esse cargo, eu sabia que teria dificuldades por ser mulher, mas é algo que vale a pena. Sou apaixonada pela bateria desde a apresentação no dia do meu vestibular”.
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Em 2016, a apresentação da Bateria Cásper Líbero no Balatucada, um dos maiores torneios de baterias universitárias do Brasil, foi a prova que o samba também é símbolo de resistência feminina. No episódio, todas as mulheres tocaram um breque, enquanto os homens levantaram uma faixa na qual estava escrito “respeita as minas”.
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De baixa estatura, cabelos curtos e piercing no nariz, Barbosa conta que aproveitaram o torneio para fazer essa manifestação, porque o Balatucada é um grande evento que reúne as 30 baterias mais expressivas do país. “Levantamos a bandeira do feminismo para mostrar que também temos voz. As mulheres são a maioria na Cásper, por que não levantar essa pauta?”
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Sem instrumento de mulher
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Uma bateria se divide entre cozinha, que concentra os instrumentos de som mais grave e pesados, e a frente, de som mais agudo e leves. Basta assistir a uma apresentação para perceber a divisão de gênero. Normalmente as mulheres tocam agogô, tamborim, chocalho, enquanto os homens tocam surdo, caixa, repinique.
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O estigma da fraqueza ainda persegue as mulheres, inclusive no mundo do samba. A presidente da Infanteria, Gabriela Cesaro, diz que, de maneira inconsciente, muitos ritmistas ainda compactuam com essa divisão dos instrumentos a partir do gênero. “Eu toco chocalho que é um instrumento considerado de menina por ser mais leve. Eu não lembro, por exemplo, de ter visto um menino heterossexual tocando esse instrumento”, afirma Cesaro com a voz cansada, após conversar mais de uma hora com a reportagem.
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Para Dominick Gonche de Oliveira, 23, presidente da Liga Nacional de Baterias Universitárias (LNBU), a coordenação motora, o ritmo e a capacidade cognitiva são mais importantes para a composição ou reprodução de uma música. Tocar um instrumento é diferente de fazer um exercício, por isso não depende da força física. “O homem não dá a possibilidade para as mulheres tocarem o que quiserem, porque não acreditam que elas sejam capazes e na minha bateria não é diferente”.
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Oliveira também é ritmista da bateria Bandida da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (Each), que reúne cerca de 100 estudantes. Ela sorri quando fala, mesmo de assuntos como o degrau que as mulheres ainda têm de subir para chegar à igualdade nas baterias. “Os alunos, quando entram, não sabem que uma mulher é capaz de ser mestre tanto quanto um homem. Não sabem que homens e mulheres são capazes de tocar qualquer instrumento independente do peso”.
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