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Por que esperei até ter 40 anos para dizer que sou lésbica

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Veja publicação original: Por que esperei até ter 40 anos para dizer que sou lésbica

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Por Nicole Gilley

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“Sou uma mulher negra, criada por mãe solo e religiosa que nunca me incentivou a buscar nada senão Deus, um marido e filhos.

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Eu nunca quis ser lésbica. Fui criada por minha mãe solo, que me ensinou que a homossexualidade é a única abominação que Deus não perdoa. Durante minhas três primeiras décadas de vida, tentei de tudo para expulsar minha natureza. Eu passava noites incontáveis chorando de joelhos, suplicando para Deus tirar isso de mim, sem entender por que ele teria me feito carregar essa cruz se ser homossexual era realmente pecado. As noites que eu não passava rezando eram passadas embaixo de inúmeros homens cujos nomes eu nem me dava ao trabalho de descobrir. Eu pensava realmente que, se transasse com homens suficientes, isso faria minha heterossexualidade pegar no tranco. Não funcionou, é claro.

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Quando eu tinha 23 anos e estava morando em Los Angeles, comecei a trabalhar num call center, recebendo ligações para um serviço de encaminhamento a dentistas. Foi ali que me apaixonei para valer pela primeira vez, por uma colega de trabalho. Quando ela percebeu o que eu estava sentindo, graças à minha falta de sutileza, me denunciou para o call center inteiro.

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A humilhação me obrigou a sair da empresa e começar a trabalhar com vendas, onde continuei a evitar minha sexualidade e a transar com homens. Com 31 anos, me matriculei numa faculdade pública e continuei a fazer de tudo para fugir da minha sexualidade – trabalho, estudos, álcool, noitadas. Mas aos 32 anos fui internada às pressas, com diagnóstico de gastrite e duas úlceras. Entendi então que não conseguiria expulsar minha homossexualidade com orações. Finalmente admiti para mim mesma que eu era lésbica. Ali mesmo no leito do hospital, resolvi que em vez de ficar onde eu estava e evitar minha sexualidade, eu iria embora.

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Passei noites incontáveis chorando de joelhos, suplicando a Deus para tirar isso de mim, sem entender por que ele me fez carregar essa cruz de ser homossexual se isso era realmente pecado.

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Comecei a me candidatar a cursos universitários de quatro anos para onde pudesse pedir transferência, e pouco tempo depois de completar 33 anos, larguei meu emprego na Califórnia e me mudei para Nova York, onde fui morar no Harlem e estudar na NYU. Eu tinha uma meta na cabeça: ser verdadeira a mim mesma e abraçar minha sexualidade. Nova York me pareceu que seria o melhor lugar para fazer isso. Depois de me mudar para lá, entendi que não era a vergonha de minha mãe que me estava impedindo de ser quem eu era: era minha própria vergonha. Em Nova York, eu falava com minha mãe com frequência e pensava honestamente que poderia abraçar ser lésbica e conservar um relacionamento com ela. Nunca parei para refletir sobre os efeitos que manter segredo teriam sobre mim, minha vida amorosa e meu relacionamento com minha mãe.

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Mesmo estando a milhares de quilômetros de minha família, eu não conseguia simplesmente pressionar um interruptor e virar abertamente gay. Dois meses depois de me mudar para Nova York, finalmente criei coragem de ir ao meu primeiro bar de lésbicas. No frio, embarquei no metrô da linha D e fui para o centro. Quando cheguei perto do bar, vi algumas mulheres – imaginei que fossem lésbicas – do lado de fora, fumando cigarros, sorrindo e dando risada. Dominada pelo medo e a vergonha, passei reto e, em vez de ir àquele bar, fui a outro bar nas proximidades e bebi até afogar meu sentimento de vergonha. Tentei imaginar como aquelas mulheres podiam amar a si mesmas, sendo como eram. Como eu faria para chegar a isso? Voltando para casa, tomei a decisão de nunca mais tentar aquilo. Tinha me provocado ansiedade demais.

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Só consegui me sustentar em Nova York, vivendo na cidade e estudando na NYU, por um ano. Depois desisti. Eu não podia voltar para casa, então em janeiro de 2012 resolvi me mudar para Las Vegas e estudar na Universidade de Nevada. Seria a mesma ideia: eu seria lésbica em outro estado e conseguiria meu diploma de faculdade. Percebi que ir a um bar representava pressão demais para me relacionar com outras lésbicas, então em 2015 me aventurei no namoro online e conheci uma mulher. Estar com ela foi o início de meu processo de me compreender. Eu estava apaixonada e queria que o mundo inteiro soubesse, mas ela estava no armário. Foi uma coisa arrasadora, porque, além de meus próprios problemas de sentir vergonha de mim mesma, agora eu estava lidando com os dela também. No final, não consegui mais encarar, e nos separamos. Tudo o que eu queria era poder ligar para um serviço de terapia familiar pelo telefone e me abrir com quem atendesse, mas eu não podia.

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No final de 2015 eu estava com 38 anos, tinha me formado na faculdade e estava mais do que pronta para voltar para casa, para Los Angeles, mas ainda não pretendia me assumir como lésbica diante da minha família. Levei mais seis meses para decidir que eu precisava fazer terapia. Foi assim que me vi sentada diante de uma mulher branca de 30 e poucos anos, chorando loucamente e contando a ela que eu não queria ser gay. Tentei imaginar se ela teria condições de compreender realmente como é ser uma lésbica negra. Será que ela sabia que a comunidade negra é notoriamente homofóbica? Sou uma mulher negra, criada por mãe solteira e religiosa que nunca me incentivou a buscar nada senão Deus, um marido e filhos. O fato de ter crescido em conflito entre quem eu era e quem ela queria que eu fosse me provocava muita dor, confusão e depressão.

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Sou uma mulher negra, criada por mãe solteira e religiosa que nunca me incentivou a buscar nada senão Deus, um marido e filhos.

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Me perguntei se a terapeuta teria como me ajudar a encarar o fato de que sair do armário implicaria perder o amor e a aceitação de minha mãe. Ela poderia me ajudar a ganhar força suficiente para realizar o que eu me propunha a fazer? Uma vez por semana eu passava 90 minutos sentada num consultório bege com decoração discreta, aprendendo a dizer “sou lésbica”. Fiz cinco meses de terapia até começar a contar às pessoas.

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Pouco antes de completar 40 anos, resolvi contar primeiro a uma prima minha, e ela me deu todo o apoio. Outros amigos também me apoiaram, mas eu tinha medo de me assumir diante de minha melhor amiga. Ela nunca tinha mostrado apoio aberto à homossexualidade. Na realidade, os gays muitas vezes eram os alvos de suas piadas. Quatro meses depois de me abrir com minha prima, procurei minha amiga, e, para surpresa minha, ela me deu apoio total. Meu medo todo tinha sido desnecessário. Minha amiga passou os últimos 20 anos tentando servir de casamenteira para mim; acho que esse papel dela não mudou, só que agora ela me apresenta para mulheres, em vez de homens.

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Foi um alívio mostrar a minhas melhores amigas quem eu sou de verdade, mas eu ainda estava nervosa, sem saber como reagiriam meus familiares religiosos. Eles me rejeitariam? Depois de pouco a pouco começar a contar outros primos e parentes, percebi que essas pessoas todas gostavam de mim de verdade e não se importavam com quem eu namorasse. Só queriam que eu fosse feliz. Mas ainda faltava eu falar com minha mãe.

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Era uma noite de sábado. Minha mãe e eu estávamos sentadas num restaurante Roscoe’s Chicken. Inicialmente tentei dizer que eu era bissexual, na esperança de acostumá-la à ideia aos poucos. É claro que isso não funcionou – apenas lhe deu a falsa esperança de que eu ainda poderia namorar um homem. Ela disse terminantemente que nunca aceitaria que eu fosse lésbica, mas não chegou a dizer que isso era nojento ou que eu era nojenta.

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Desde então, tenho tido uma conversa contínua com ela. Quando a Tchetchênia promoveu um expurgo dos gays, minha mãe falou que é melhor que o governo os pegue antes que Jesus o faça.

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Dizer que aos 40 anos eu não anseio pela aceitação e aprovação de minha mãe seria mentira.

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Minha mãe me disse que, se eu me casar algum dia, ela não vai ao casamento. Embora seja isso que mais me doa, fui obrigada a entender que esse é um problema dela, não meu. Mereço ser feliz na vida, e não devo ter vergonha de ser quem eu sou. Minha mãe e eu ainda nos falamos, mas agora falta intimidade no nosso relacionamento. Ela não sabe nada da minha vida nem das mulheres com quem saio. E não quer perguntar sobre isso. Nosso relacionamento se limita a falar generalidades sobre política ou as coisas que estão acontecendo na vida dela. A posição dela sobre minha sexualidade não mudou, e, como ela tem 75 anos, não imagino que vá mudar.

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Dizer que aos 40 anos eu não anseio pela aceitação e aprovação da minha mãe seria mentira. Eu quero muito, mas percebi que não preciso disso para ser feliz. Alguns dias são melhores que outros, mas na maioria dos dias eu me vejo caminhando com uma nova visão de quem sou e com nova confiança, pelo fato de ser lésbica assumida.

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Sair do armário aos 40 anos foi a coisa mais libertadora que pude fazer por mim mesma, e a única coisa que lamento é não ter feito isso antes. Não passo mais minhas noites chorando, e, com o encorajamento de minha terapeuta, minhas amigas e mentoras, olho com confiança e prazer para o futuro, querendo aproveitar minha nova vida como lésbica e me libertar de qualquer resquício de sentimento de vergonha.

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*Este texto foi originalmente publicado no HuffPost US e traduzido do inglês.

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