Saiu no site HUFFPOST:
Veja publicação original: A artista plástica que encontrou na responsabilidade social uma forma de abraçar o mundo
.
Tudo que ela mais quer é estender a mão. Um gesto simples, ela sabe, mas que pode fazer bastante diferença. Há mais de dez anos, é o que ela quer para quem convive com o diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença degenerativa sem cura. Quem se depara com isso, pode achar que nem há o que fazer. Mas Silvia Tortorella, 51 anos, co-fundadora e diretora do Instituto Paulo Gontijo, quer ajudar a passar por esse momento. “O objetivo é disseminar informação e conhecimento sobre o que é a doença e cuidar dessas famílias após o diagnóstico, acolher. O diagnóstico é muito triste e as pessoas ficam sem saber o que fazer. A gente dá acolhimento e um pouco de colo para essas pessoas.”
.
Silvia calcula que atualmente cerca de 1.000 famílias por ano são atendidas pelo instituto. E o trabalho vai desde incentivar a pesquisa científica na área a informar sobre a doença, sobre os direitos que o paciente tem e emprestar equipamentos para melhorar o dia a dia e o tratamento. “Você vê que as pessoas são gratas e que você faz a diferença para essas famílias e às vezes com tão pouco… É a maior satisfação saber que estamos conseguindo ajudar. É o grão de areia no meio de um monte de dunas. É muito amor, engajamento.”
.
“O objetivo é disseminar informação e conhecimento sobre o que é a doença e cuidar dessas famílias após o diagnóstico. A gente dá um pouco de colo para essas pessoas.”
.
.
Sempre acreditou nisso. Artista plástica de formação, começou a se envolver com trabalhos sociais na década de 1990 quando morou na África com seu marido. Em Angola, que ainda estava em guerra civil quando ela chegou, ensinava artes para crianças em uma escola local. “Foi uma paixão”, lembra. Conseguiu unir ali seu lado profissional com algo maior: sua vocação. Ficou oito anos fora do país, sempre com essa atuação, e quando voltou ao Brasil começou a se engajar ainda mais nessa área. “Meu trabalho hoje é focado na responsabilidade social.”
.
Concilia a direção do instituto com um ateliê de cerâmica e continua dando aula de artes, aos fins de semana, mas seu foco vai todo para o trabalho social. E sonha grande. “Nosso projeto é crescer, queremos ser um centro de referência em ELA onde as pessoas possam chegar sempre. A gente constrói um mundo melhor ajudando que ele seja melhor de alguma forma. Você tem que escutar o outro… estamos aqui de passagem, o mundo não é só seu é de todos nós.”
.
“A gente constrói um mundo melhor ajudando que ele seja melhor de alguma forma. Você tem que escutar o outro… estamos aqui de passagem, o mundo não é só seu é de todos nós.”
.
Enquanto está por aqui, Silvia briga para melhorar uma parte desse mundo, mesmo que pequena. E sabe que precisa ser persistente. “De 2005 a 2014 o que foi mais difícil foi construir uma identidade, as pessoas entenderem o que é a ELA. A campanha do balde do gelo [que viralizou na internet há alguns anos] deu um boom em relação ao que é porque as pessoas realmente não conheciam. É a terceira doença degenerativa mais acometida do mundo. No nosso país era pouco conhecida e pouco diagnosticada.”
.
Além disso, a ELA é conhecida também por causa do físico Stephen Hawking – que viveu com o diagnóstico por mais de 50 anos e morreu em março deste ano. “A doença é cruel. Você fica totalmente lúcido, poucos são os casos em que tem demência. É muito difícil você ficar preso na sua mente. O Stephen Hawkings conseguia não ficar preso, fazer um trabalho, ele tinha um projeto. A gente fala muito isso para as pessoas que têm o diagnóstico…. Não deixa de ter um projeto. Tenha sempre, o projeto é transformador. Ter um objetivo, uma meta, isso dá uma força grande. Não podemos perder o projeto de vida.”
.
Esse tocar, cuidar, estar próximo para mim é o que tem de mais importante. Quando temos esse acolhimento temos amor, a gente abraça, está junto, acolhe de verdade. Quem não gosta de um abraço, um carinho?
.
.
Silvia nunca perdeu. E lembra bem disso. Aos 19 anos sofreu um acidente grave de carro. Fraturou todos os ossos da face, ficou 18 dias em coma, passou por quase dez cirurgias e foram três meses internada. “Comecei a enxergar a sorte que eu tive de não ter sequelas graves, estar inteira e poder continuar. Foi uma oportunidade de vida que eu tive.” Ali, naquele momento talvez sem grandes projetos, ela encontrou o que tanto valoriza. “Tinha um residente que ia ao meu quarto e eu falava que estava enjoada, não estava legal e ele apertava meu dedo e falava que ia melhorar. E melhorava. O que eu queria era que alguém pegasse em mim, alguém perto de mim. Eu jamais esqueci desse detalhe.”
.
Ela não ia mesmo esquecer de alguém que pegou na sua mão. “Esse tocar, cuidar, estar próximo para mim é o que tem de mais importante. Quando temos esse acolhimento temos amor, a gente abraça, está junto, acolhe de verdade. Quem não gosta de um abraço, um carinho?” Todo mundo gosta.
.
Um gesto simples.
.
.
Ficha Técnica #TodoDiaDelas
.
Texto: Ana Ignacio
.
Imagem: Caroline Lima
.
Edição: Andréa Martinelli
.
Figurino: C&A
.
Realização: RYOT Studio Brasil e CUBOCC
.
.
.
.
.