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Sista Kátia: Artista, gorda, feminista e tantas outras coisas que não cabem aqui

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Veja publicação original: Sista Kátia: Artista, gorda, feminista e tantas outras coisas que não cabem aqui

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“Você tá lenhada, quero ver como você vai amarrar isso tudo aí. Ninguém vai entender nada”, disse Sista Kátia, ao fim da conversa com o HuffPost Brasil. Realmente, tentar enxugar num texto tudo o que essa mulher de 31 anos faz não é tarefa fácil. De maneira sucinta, podemos dizer que ela é grafiteiraprodutora cultural, instrutora de defesa pessoal para mulheres, ativista do veganismo e das gordas, digital influencer e que até fez uma pontinha como modelo na última São Paulo Fashion Week.

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A culpa, diz ela, está no signo de gêmeos com ascendente em libra. Para quem é de astrologia, os nascidos sob essa conjunção astral costumam ser inteligentes, versáteis, indecisos e ligados à comunicação. “Não tem jeito, só tem ar no meu mapa”, brinca. Aos céticos, basta dizer que Sista faz tanta coisa que até a entrevista ficou por conta dela. A única pergunta feita foi a seguinte: “você pode me contar toda a sua história, desde Cajazeiras? “. O resto, como de praxe em toda situação em que se mete, o controle ficou sob sua alçada.

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“Toda a minha construção como pessoa veio a partir desse contexto, de ser uma mina que não era da Bahia, morando num bairro de extrema periferia, com uma mãe solteira e desempregada.”

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Sista nasceu em São Paulo, mas veio para Salvador aos sete anos de idade e nunca mais saiu da Bahia.

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Sista nasceu em São Paulo, mas veio para Salvador novinha, com sete anos de idade. Foi direto para Cajazeiras, primeiro bairro planejado da capital baiana e que possui mais de 60 mil habitantes – é também, não por acaso, o segundo em população negra da cidade. Ela conta que a mudança para a Bahia com a mãe e os irmãos funcionou como uma revolução em sua cabeça, principalmente por ter acontecido logo após a separação dos pais. “Toda a minha construção como pessoa veio a partir desse contexto, de ser uma mina que não era da Bahia, morando num bairro de extrema periferia, com uma mãe solteira e desempregada”.

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Maria Helena, sua mãe – que também é geminiana –, é descrita pela artista como sua maior inspiração e talvez tenha sido a grande mola propulsora para que Kátia viesse a se tornar “multifunção”. Além de cuidar dos filhos e da casa, era artesã, fazia bolos e doces para vender, se fantasiava de Papai Noel e de palhaço nas festas infantis, produzia lembrancinhas para aniversários… “Tudo o que você puder imaginar e sempre ligada nessas questões de criatividade e artes. Às vezes a nossa maior referência está dentro do nosso convívio e a gente nem dá conta. Foi uma loucura, vários perrengues, mas sempre um rolê muito afetivo”, resume.

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“As mulheres gordas do meu bairro viviam de uma maneira bem tranquila em relação ao corpo delas. Nesse contexto da periferia, elas sempre usavam roupas curtas e apertadas, nunca se escondiam.”

Na pré-adolescência Sista se deu conta de uma coisa que, para ela, até então não importava: ser gorda era um problema.

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Entre as brincadeiras da quase-cidade-de-interior que é Cajazeiras, as favoritas eram dar soco na cara dos meninos, correr pra lá e pra cá e ficar em cima de árvores o dia inteiro, sem se importar com coisa alguma. Quando a pré-adolescência chegou, no entanto, Sista se deu conta de uma coisa que, para ela, até então não importava: ser gorda era um problema.

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Aos 12 anos, quando entrou em contato com a cultura do skate e suas consequentes vertentes – o rock, o hardcore, o feminismo e o anarquismo – passou a vislumbrar a cobrança social que existe para com o corpo feminino. “As mulheres gordas do meu bairro viviam de uma maneira bem tranquila em relação ao corpo delas. Nesse contexto da periferia, elas sempre usavam roupas curtas e apertadas, nunca se escondiam. Quando eu fiquei um pouco maior e passei a frequentar outros lugares percebi que o meu corpo poderia ser um problema para mim mesma! Aí bateu a bad: ‘nossa, ser gorda é um problema, que bizarro'”.

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Foi quando caiu em si em relação a esse aspecto que Sista começou a frequentar “rolês de coletivos feministas”. Segundo ela, a maior lição que tirou dessas conversas é que é preciso entender o nosso corpo, e não aceitar: “a gente não está condicionado a aceitar e se acomodar. Se a pessoa não está satisfeita, ela tem que fazer alguma coisa para tentar ficar feliz. Eu não acredito nisso de aceitar, você não tem que aceitar nada”.

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“Enquanto fui crescendo, fui relacionando essa minha luta à relação do combate a violência contra a mulher.”

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Para ela, a maior lição que tirou das conversas sobre feminismo e condição da mulher é que é preciso entender o nosso corpo, e não aceitá-lo.

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Kátia entendeu que era gorda e que não tinha problema algum nisso e que poderia falar sobre essa aceitação em outros espaços. “Enquanto fui crescendo, fui relacionando essa minha luta à relação do combate a violência contra a mulher, aprendi defesa pessoal e passei a dar aula para outras meninas; entendi que o meu corpo é violentado pela sociedade e não só o meu como o das fêmeas de qualquer espécie, então me envolvi também com o veganismo; quando comecei a grafitar, montei coletivos com outras meninas…”. “Perainda”, Sista, deixa eu contar essa parte da história.

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Nesse processo de trilhões de questionamentos, se aproximou da cultura hip-hop e se encantou com seus quatro elementos, o break, o rap, o DJ e o grafite – e como já ficou bem claro, é óbvio que ela daria um jeito de fazer parte de pelo menos um deles. Decidiu por eliminação: não sabe cantar, é uma péssima MC e não tem ‘flow’ nenhum; habilidade nas picapes muito menos; “break? Imagina eu dando aqueles giros maravilhosos com zero coordenação”. Sobrou o grafite.

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“Nada mais justo do que as mulheres falarem por elas mesmas e saírem dos bastidores. Nós queremos ser protagonistas também.”

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Kátia, então, entendeu que não tinha problema algum em ser uma mulher gorda e que poderia falar sobre essa aceitação.

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“Eu falei: pô, vou grafitar, deve ser bem mais fácil. Mas foi aí que eu vi que eu tava enganada. Eu não sabia desenhar nem um O com um copo”, admite. De qualquer jeito, começou a colar com amigos em mutirões de grafite e acabou pegando prática pela coisa. E claro que não ia deixar o empoderamento feminino de lado: montou crews femininas, fez workshops de defesa pessoal voltado para situações nas quais as meninas ficam expostas quando saem para grafitar nas ruas e trouxe para Salvador uma edição do Encontro Nacional das Grafiteiras, evento que reúne anualmente artistas do Brasil inteiro. “O hip-hop é tão machista quanto nossa sociedade. Nada mais justo do que as mulheres falarem por elas mesmas e saírem dos bastidores. Nós queremos ser protagonistas também”.

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De 2009 para cá, assinou painéis gigantescos pela cidade como o mural do Hospital da Mulher e uma parede da nova Concha Acústica do Teatro Castro Alves. Mas sua marca registrada é uma personagem específica: a sereia. Quem bate o olho já sabe que é dela: “eu quis ter personagens que parecessem mais comigo e com as pessoas que estão próximas a mim, porque sempre nas artes houve uma predominância de mulheres brancas e magras. Daí eu pensei em fazer umas mulheres com outra cor de pele, com tatuagens, gordas, peitudas, barrigudas, com dobras. E como eu sempre fui péssima em desenhar pernas optei pela cauda [risos]”.

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Sista afirma que para tentar equilibrar tanto ativismo ela se divide: numa época do ano se dedica ao veganismo – tem um canal no Youtube onde ensina receitas veganas acessíveis e populares –, em outro fica mais voltada ao grafite; e num último, ainda consegue tempo para trampar com moda, já que também acabou se tornando ‘digital influencer’. “Imagina só, eu sou blogueira sem ter blog. Até me falam para juntar tudo que eu faço num blog, porque ficaria mais fácil de as pessoas me entenderem. Aí eu fico pensando: o que eu ia botar nesse blog? Um dia grafite, no outro uma receita, no dia seguinte um post de moda. Quem ia entender? Só eu… ou pessoas de gêmeos”.

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“Bom, você pediu ‘conte sua história desde Cajazeiras’ e eu contei”. E contou bem para caramba. Se eu amarrei direitinho, são outros quinhentos. Tenho ascendente em peixes, sabe como é que é…

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Ficha Técnica #TodoDiaDelas

Texto: Clara Rellstab

Imagem: Juh Almeida

Edição: Andréa Martinelli

Figurino: C&A

Realização: RYOT Studio Brasil

 

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