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O feminismo ganhou a eleição nos EUA

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE:

 

Veja publicação original:   O feminismo ganhou a eleição nos EUA

 

O que temos a aprender com a as mulheres que derrubaram um candidato misógino e racista nos Estados Unidos esta semana

 

Se houve algum herói nesta semana, certamente foi mulher. Não uma, milhares. E negras. Ao sul dos Estados Unidos, no Alabama, elas salvaram a eleição para o representante no Senado e impediram que chegasse lá o candidato acusado por abuso sexualpedofiliaracismo e misoginia favorito da maioria da população – e do presidente Trump. Feito histórico: há mais de duas décadas o estado mais conservador do país não elegia um democrata.

 

 

Ali, onde a população negra representa 28% do eleitorado e o voto não é obrigatório, elas não se deixaram intimidar e uniram forças até mobilizar 98% de todas as votantes negras contra o republicano Roy Moore. “É exemplo de que a resistência também pode ser uma plataforma política”, diz a militante negra e ex-Secretária Adjunta de Políticas para as Mulheres da Prefeitura de São Paulo Juliana Borges. “Esse episódio é sobre feminismo, a representatividade das mulheres negras que se sabem minoria absoluta e se engajam até conquistar o protagonismo.”

 

 

Em um de seus famosos discursos, o ativista Malcolm X (1925-1965) bradou: “A pessoa mais desrespeitada da América é a mulher negra. A pessoa mais desprotegida da América é a mulher negra. A pessoa mais negligenciada da América é a mulher negra”. E, no ano passado, não à toa foi parafraseado num estandarte pop, o último disco de Beyoncé, na música “Lemonade”: se, nos anos 60, a mulher negra era a minoria da minoria, hoje não parece ter mudado tanta coisa. Isto é, salvo a resistência de que Juliana fala: num ano que jogou luz no feminismo como nunca, que condenou assédios mundo afora, fez cair por terra homens em posições privilegiadas de poder – mas incapazes de respeitar o sexo oposto –, e consolidou a necessidade de nomearmos e condenarmos os abusos mais cotidianos, a velha dinâmica de poder parece estar mudando.

 

 

No Twitter, a hashtag #BlackWomen chegou aos trending topics. Dentro e fora dos Estados Unidos, o agradecimento às mulheres negras pela quebra do status quo se deu em textos e vídeos emocionados, otimistas. “É impossível separar a política norte-americana da história racial dos Estados Unidos, que também é a história dos grupos minoritários. Desde os anos 70, os negros votam mais nos democratas, porque os republicanos insistem na segregação. Também não foi a primeira vez que as mulheres negras votaram em bloco com um objetivo consciente [em 2016, durante a corrida presidencial, 97% delas votaram contra Trump]. Mas só o fato de esse episódio específico ter chamado a atenção e recebido o crédito mostra que algo está mudando na sociedade”, afirma Adilson José Moreira, doutor em direito constitucional pela Universidade de Harvard.

 

 

Além-mar, às vésperas das eleições de 2018, essa representatividade ganha força por aqui, aos poucos. Mas ainda há muito a ser feito. “No Brasil, ainda nos falta coragem para assumir a soberania popular. A invisibilidade da mulher negra se silencia ante as instituições públicas e privadas, dirigidas na maioria por homens brancos, católicos, heterossexuais. Além da educação e informação, o feminismo é uma ação necessária para esse engajamento”, diz Eunice Prudente, das poucas docentes negras na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) que hoje é presidente do Conselho de Transparência da Administração Pública.

 

A eleição do Alabama ressoa para além do espaço-tempo porque não é só resultado, mas também sintoma: é certo, tem valido a pena lutar. Me fez lembrar do título da antologia escrita pela feminista Barbara Smith nos anos 80: Todas as mulheres são brancas, todos os negros são homens, mas algumas de nós são corajosas (em tradução livre). Que siga dando o tom: sejamos como as mulheres negras, tenhamos coragem.

 

 

 

 

 

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