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A mulher, a violência doméstica, os números

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Veja publicação original:   A mulher, a violência doméstica, os números

 

Joelma D’Arc da Silva Santos nasceu em julho de 1976, em Recife (PE). Mudou-se para Franca quando ainda era um bebê, por conta da separação dos pais. Aqui na cidade ela cresceu, estudou fez amigos. Casou-se aos 17 anos, grávida de seis meses. Tinha de início um relacionamento saudável: eram jovens com pequenas ambições e chegaram a conquistar os primeiros bens materiais juntos. As coisas mudaram drasticamente quando o rapaz começou a se envolver com crack.

Ele foi se afundando nas drogas e Joelma viu seu casamento se degradar a cada dia. Ela conta que lutou o quanto pôde, pois o amava, mas a relação chegou a um ponto insustentável. Aos 21 anos, grávida do segundo filho, ela decidiu se separar. O marido não aceitou. Ficou violento, a ameaçou e tentou disparar um tiro contra a cabeça de Joelma. “Ele puxou o gatilho e a arma travou. Se foi um acaso da sorte ou do destino, não sei. Só sabia que não poderia deixar que meus filhos vivessem episódios tão violentos dentro de casa”, disse ela. Um levantamento realizado em 2014 pela Central de Atendimento à Mulher registrou que 80% das vítimas tinham filhos. No total, 64,35% destas crianças presenciaram atos violentos vindos dos pais e 18,74% eram vítimas diretas junto com as mães.
Apesar do medo, Joelma encarou a situação e manteve sua decisão. Ela também assumiu a tarefa de criar os filhos sozinha, uma vez que não recebeu pensão. Joelma faz parte do grupo de 31% de mães brasileiras que criam os filhos sem a ajuda dos pais.
Algum tempo depois, Joelma conheceu e passou a se interessar por um vizinho. “Ele era religioso e aparentava ter um bom coração. Tratava meus filhos com carinho, parecia ser o homem da minha vida”. Começaram a namorar, e com pouco tempo de relacionamento foram morar juntos. Parecia a escolha certa. Mas não foi. Pouco depois de casada, Joelma descobriu que o marido era viciado em jogo e não queria trabalhar. Ela trabalhava em uma banca de pesponto e sustentava a casa sozinha. “Enquanto isso, ele ficava em casa e obrigava meus filhos a fazerem as tarefas domésticas. Também exigia que eu comprasse as coisas para ele”, disse ela.
Em meio a essa situação, ela descobriu que estava grávida do terceiro filho, mas decidiu pedir o divórcio. Mais uma vez, lidou com a violência. “Ele começou a me ameaçar e disse que se eu me separasse, ele me picaria inteirinha”. A violência psicológica, por ser subjetiva, nem sempre é percebida. Ela gera culpa e é feita em forma de chantagem, controle, ciúmes, humilhações ou ironias. Atualmente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a tortura psicológica como uma forma de violência contra a mulher, tanto quanto a física, moral e sexual, apesar de ser negligenciada muitas vezes pelo desconhecimento ou alienação da vítima diante da conduta do parceiro.
Durante toda a gestação, Joelma foi escrava do medo. Era ameaçada com objetos cortantes, e passou a sofrer violência física do parceiro que dava socos em sua cabeça. “Eu apanhava em lugares estratégicos para não ficar marcada”, disse. Os reflexos da violência física e moral se refletiram nos exames de pré-natal de Joelma. O bebê morreu ainda em seu ventre. Vergonha e medo de ser assassinada são percebidos pela população como as principais razões para a mulher não se separar do agressor, de acordo com pesquisa do Data Popular/Instituto Patrícia Galvão, 2013). Segundo a pesquisa, 85% dos entrevistados concordam que as mulheres que denunciam seus agressores correm mais risco de serem assassinadas. E 92% concordam que, quando as agressões ocorrem com frequência, podem terminar em assassinato.
Joelma tinha medo de denunciar o marido, contar toda a verdade à polícia, e sempre que se mostrava confiante a tal ato, ele aparecia arrependido. “Ele chorava muito, pedia perdão. Aturei essa situação por 15 anos, na ilusão de que algo fosse mudar”. Estudo da OMS (Organização Mundial da Saúde) constatou que cerca de 20% das mulheres agredidas fisicamente pelo marido no Brasil permaneceram em silêncio e não relataram a experiência nem mesmo para outras pessoas da família ou para amigos.
Como a situação só piorava, depois de anos, Joelma decidiu enfrentar o medo e rompeu a relação. Para se manter sozinha, procurou cursos profissionalizantes e começou a trabalhar na área da beleza. Hoje Joelma é cabeleireira, micropigmentadora de sobrancelhas, esteticista, pedicure, manicure, e maquiadora profissional. Tem seu próprio salão, lidera cursos de beleza e diz que procura ensinar tudo o que aprendeu. “Sinto hoje que tenho até uma missão: cuidar da beleza das mulheres e estimulá-las a cuidarem de si próprias, a terem coragem. Gosto de contar minha história, pois acredito que ela pode servir de inspiração para muitas mulheres que abaixam a cabeça, que acham que não conseguem. Mas conseguem”.
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