Saiu no site EL PAÍS:
Veja publicação original: The Wing, o clube para mulheres resistirem aos EUA de Trump
Por MARÍA TRIGO
O feminismo já tem seu ‘meeting point’ em Manhattan. No clube, há eventos culturais só para mulheres
Não é por acaso que o The Wing nasceu em março de 2016. Exatamente por ocasião da comemoração do Dia Internacional da Mulher, Audrey Gelman, a alma mater do projeto, e Lauren Kann (cofundadora) põem mãos à obra e dão vida a um espaço onde as mulheres, e somente as mulheres, podem ir para se reunir, trabalhar e se nutrir pessoal e profissionalmente. “Audrey conversou comigo, e a sua proposta de me integrar me pareceu engenhosa e bastante conveniente para uma pessoa como eu, que escrevo em casa. Ali eu teria um local para editar que não fosse uma cafeteria ou um escritório custando o olho da cara”, conta a escritora Sloane Crosley, uma das fundadoras.
Gelman vem do universo da política. Iniciou sua carreira colaborando na campanha de Hillary Clinton para se candidatar pelo Partido Democrata à presidência em 2008. Seu nome integra a lista da Forbes das 30 pessoas com menos de 30 anos que devem ser levadas em conta em Direito e Política, além de ser considerada uma das 50 mulheres mais poderosas de Nova York, segundo o The NY Daily News. Embora tenha decidido deixar Washington e se afastar da política ao criar o The Wing, cujo conceito inicial se centrava de forma mais dirigida para ser um ‘coworking’ e um clube social, aquele background e o início da era Trump fizeram com que o projeto adquirisse um viés ainda mais engajado.
Isso se solidificou durante a Women’s March de janeiro passado. Dentre as mais de 500 mil pessoas que se manifestaram em Washington em defesa dos direitos das mulheres, da comunidade LGBT ou do direito à saúde, estava um grupo de 100 mulheres do The Wing, que se deslocaram para lá de ônibus. Durante os dias que antecederam o evento, o clube manteve as portas abertas para todas as mulheres que se sentiram ameaçadas depois da posse do presidente (entre elas, várias imigrantes), e que organizaram a marcha no local.
Um espaço de trabalho aberto com biblioteca, mesas, sofás, cafeteria, sala para amamentar, salas para conferências, espaço com penteadeiras e “um bom wifi”, como diz o site do estabelecimento. Como disse Sloane Crosley ao EL PAÍS: “O The Wing é um lugar bastante tranquilo para ficar. Durante o dia, há um clima de biblioteca que se estabelece naturalmente, e, se as mulheres não falam em voz baixa, são pelo menos cuidadosas a ponto de fazer conversas rápidas ou deixa-las para os pontos mais movimentados do espaço. Como qualquer pessoa que vive neste mundo poderia dizer, trata-se de um traço feminino”.
No que se refere ao aspecto de clube social e de lugar para praticar o ‘networking’, a escritora relata sua experiência: “Embora tenha conhecido ali muitas mulheres interessantes – advogadas, estilistas, jornalistas… –, não uso muito o espaço para me socializar. Mas isso tem mais a ver com o fato de que eu sou uma loba solitária de 38 anos, e existem elementos de socialização no The Wing que são provavelmente mais adequados para uma geração mais nova. Quando estou ali, ouço muitas conversas sobre marcas e aplicativos que não conheço. Mas sei que eu teria sido bem feliz se tivesse existido alguma coisa como o The Wing quando eu tinha 25 anos, e o único lugar comparável a isso era a Soho House”.
O que mais caracteriza o The Wing, porém, são os ‘happenings’ realizados ali por e para mulheres. Entre os futuros eventos está uma mesa redonda sobre a experiência das mulheres negras na América, um encontro dedicado à história de Sylvia Plath e o ‘baby shower’ no terraço de uma de suas fundadoras, Marianna Martinelli, inspirado na estética de Beyoncé e de sua pose para fotos grávida de gêmeos. Também passaram ali, para falar de poesia, as meninas de Lenny Letter, Jenni Konner e Lena Dunham, amiga de Andrey Gelman desde o colegial. Lena conta que se baseou nela para criar o personagem de Marnie em ‘Girls’.
As origens do The Wing podem ser encontradas nos primeiros clubes de mulheres surgidos no século XIX e começo do XX. “Mulheres pioneiras que se apoiavam mutuamente e também a comunidade no momento em que mais se precisava disso. Havia cerca de 600 grupos desses em Nova York e cerca de 5.000 nos Estados Unidos nos anos 30”, registra o site do espaço. Há também uma influência dos grupos feministas dos anos 70, como o W.I.T.C.H., sobretudo na identificação entre feitiçaria e feminismo e o conceito de um sabá como reunião de mulheres empoderadas. “Somos uma assembleia de bruxas, não uma irmandade”, definem-se em seu perfil no Instagram.
O projeto está crescendo. À sua sede em Manhattan se somará ainda neste semestre um outro local no Brooklin, o The Wing SoHo, que oferecerá um espaço semelhante e as mesmas possibilidades de encontros para suas sócias. Além disso, há a intenção de se expandir ainda mais. No próprio site, há uma pergunta sobre para qual lugar você gostaria de levar o The Wing, o que pode ser respondido também pelas redes sociais usando o “hashtag #BringTheWing”. As condições para pertencer ao clube são “não ter pênis”, como diz Sloane Crosley, e pagar uma mensalidade de 215 dólares (700 reais).
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