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Suicídio: a vida não pode parar

Saiu no site MENTE SAUDÁVEL: 

 

Veja publicação original: Suicídio: a vida não pode parar

 

É chocante, mas 60% das pessoas conhecem alguém que se matou. Apesar da alta incidência do problema, é possível preveni-lo na maioria dos casos

“É para aliviar de vez a minha dor.” Assim o designer Felipe*, de 31 anos, enxerga o suicídio. Um remédio amargo e definitivo contra o sofrimento. Vítima de violência doméstica, abuso sexual e bullying, Felipe, que já recebeu o diagnóstico de depressão, faz parte de uma população negligenciada, porém estatisticamente significativa.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida todo ano – e um número muito maior ao menos cogita ou tenta se suicidar. A morte voluntária já é a segunda maior causa de óbito entre jovens de 15 a 29 anos. São cifras que seguem avançando. Sorrateiramente.

“O silêncio em torno do assunto dá a impressão de que ele não é importante ou que simplesmente não acontece”, avalia Teng Chei Tung, médico do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (IPq-USP). Os dados internacionais mostram que a realidade está longe de ser assim. “Existe suicídio desde o início da humanidade. Por ter permanecido como tabu durante séculos, precisamos de muita conscientização para tratá-lo como a questão de saúde pública que de fato representa”, reflete o psiquiatra Humberto Correa, presidente da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio.

Um problema varrido para debaixo do tapete

Apesar de figurar entre as principais causas de morte no planeta, o investimento em pesquisas e campanhas na área é um dos menores quando comparado a outras condições médicas. “Como vamos avançar com esse desequilíbrio, tanto nos estudos quanto na promoção de políticas públicas?”, questionou a psiquiatra Alexandrina Meleiro, professora do IPq-USP, durante palestra realizada no Centro Universitário São Camilo, na capital paulista. Organizada pelos próprios estudantes da faculdade, a conferência foi um sucesso de público. No Facebook, quase 2 mil pessoas confirmaram presença e 10 mil demonstraram interesse.

O auditório lotado foi um sinal de que o silêncio está começando a ser quebrado. E não há como negar que o fenômeno tem a ver com a repercussão da série de TV americana 13 Reasons Why (Os 13 Porquês). A produção da Netflix mostra a trajetória de Hannah Baker, uma adolescente vítima de bullying, violência e abusos que comete suicídio e grava 13 fitas para explicar seus motivos. Um sucesso de audiência… e alvo de controvérsias entre especialistas em saúde mental. Veja o trailer:

 

https://youtu.be/JebwYGn5Z3E

 

A psicóloga Michele Silva esteve no evento da São Camilo para se atualizar na discussão das condutas com os pacientes. “Por causa dessa história da série, e até do jogo, as pessoas estão perdendo o medo de falar a respeito e o tema começou a aparecer mais no meu consultório”, conta. O jogo mencionado é o Baleia Azul, que causou barulho nas redes sociais. Composto de 50 desafios, ele estimula jovens a se automutilarem e, no fim, instiga o suicídio em si. Não se sabe ao certo sua origem, mas o primeiro caso de morte registrado ocorreu na Rússia em fevereiro.

Segundo a psicóloga Karen Scavacini, coordenadora técnica do Instituto Vita Alere, em São Paulo, o Baleia Azul é um crime que precisa ser combatido. E a série, por sua vez, tende a ser perigosa quando romantiza o tema. “Ao gerar identificação e imitação, a história pode se transformar em um fator de risco para o suicídio”, justifica. Aliás, o papel da TV, da internet e de outros meios de comunicação é bastante significativo nesse contexto. “Estima-se que hoje a mídia seja o terceiro maior motivador de comportamento suicida, superado apenas pelo desemprego e pela violência, em qualquer faixa etária”, revela o psicólogo Adriano Schlösser, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Felipe, que hoje faz terapia online e assistiu ao seriado com os olhos de quem sente na própria pele o problema, também achou que, apesar de trazer o assunto à tona, a produção foi irresponsável em alguns aspectos. “A série dá a entender que os dilemas de pessoas como Hannah são em parte culpa delas e elas estariam se vingando ao cometer suicídio, o que não é uma verdade”, analisa.

Mas o que leva uma pessoa a querer colocar um ponto final na própria vida? “Essa é uma das questões mais complexas da interação humana”, adianta o psicólogo Gabriel Fernandes, da UFSC. A presença de um transtorno psiquiátrico, em especial a depressão, dá as caras em 94% dos casos. “Tanto no nível individual, como no plano de políticas públicas, o diagnóstico e o tratamento efetivo são uma boa forma de resguardo”, afirma Correa. O desafio é que existem outros fatores entremeados nesse enredo, como ter passado por conflitos, violência, abuso e isolamento.

“Meu pai se matou quando eu tinha 10 anos. E eu ainda sofri muito bullying no colégio. Xingamentos e até agressão física passaram a fazer parte da minha rotina. Sempre fui uma criança alegre, mas logo comecei a me fechar”, relata a estudante universitária Bianca, de 20 anos, que tentou tirar a própria vida. Seu relato corrobora os achados de um estudo do Instituto Karolinska, na Suécia, que investigou a relação entre adversidades na infância e o risco de suicídio em adolescentes e jovens adultos. Depois de observar 548 721 pessoas, constatou-se que as atribulações no começo da vida têm peso significativo nessa equação – quanto maior o número de percalços, maior a probabilidade de ter ideias suicidas.

 

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