Saiu no site G1:
Por Roney Domingos, G1
Era outubro de 2013 quando a autônoma Sarah Monteiro acordou com mensagens de amigos e até de um ex-namorado alertando que estava circulando pela internet uma mensagem com uma foto dela nua. Foi apenas o começo de um pesadelo.
(O G1 publica uma série de entrevistas com vítimas de boatos nesta semana mostrando as consequências da proliferação de notícias falsas na web)
Sarah foi vítima de uma montagem. O agressor ou agressora pegou do Facebook ou do Instagram dela uma foto em que ela aparecia de biquíni e óculos escuros, sentada em uma espreguiçadeira. Ao lado da foto “comportada”, foi colocada a foto de uma mulher nua, deitada em uma cama, com as pernas abertas. Junto com a montagem, havia o nome de Sarah, dando a entender que as duas imagens eram da mesma pessoa.
Sarah diz nem conhecer a pessoa que aparece nua. A montagem, no entanto, viralizou no WhatsApp e no Facebook, especialmente em Belém (PA), onde mora. Ela acredita que todos os moradores da cidade tenham sido alcançados de alguma forma pela publicação.
A jovem afirma que a repercussão do boato foi tão grande que ela decidiu mudar o chip do celular. Ao mesmo tempo, resolveu bloquear seguidores na web e apagar todos os comentários ofensivos que apareciam em sua timeline. Mas, em vez de manter fechados seus perfis nas redes sociais, decidiu abri-los ainda mais, para que todo mundo soubesse que aquele boato não combinava com seu estilo de vida.
Em meio ao caos, ouviu um conselho da mãe que agora replica a quem passa por isso: “Tem gente que, quando acontece isso, se mata, se esconde. Acho que não é por aí. Se for boato, se não for mesmo a gente, a gente tem de falar, botar a cara a tapa, escrever a nossa versão. Porque cada história tem os dois lados da moeda. Na hora que aconteceu, eu tive medo, porque a repercussão foi muito grande. Acho que na minha cidade inteira não teve uma pessoa que ficou por fora. Por isso tive medo de sair na rua. Depois, a minha mãe falou para mim: ‘Olha, minha filha, pegue essa foto, coloque no Facebook e mostre que não é você. Você não tem que ter vergonha, você não precisa ter medo, porque não é você'”, lembra.
Ela postou, então, um desabafo no Facebook. Junto, colocou o boletim de ocorrência que fez para denunciar o caso e uma foto para mostrar que não era ela que aparecia pelada nas redes sociais.
“O que a gente tem de fazer é não baixar a cabeça para esse tipo de coisa. Se fosse outra pessoa, teria ficado retraída dentro de casa. Eu não fiquei por muito tempo. Eu fiquei até tomar as rédeas, tomar coragem para botar a foto da menina no Facebook e um textão. Acho que, hoje em dia, as mulheres estão tomando voz porque não têm mais medo de nada. Estão botando textão no Facebook, estão se organizando, se juntando, para justamente ganhar voz no meio do povo. Optei por ir lá e resolver a situação. Postei a foto do boletim de ocorrência. Depois, coloquei para o público ver todas as minhas postagens, fotos, amigos, as minhas publicações. Deixei aberto para todo mundo ver.”
“O que a gente tem de fazer é não baixar a cabeça para esse tipo de coisa. Se fosse outra pessoa, teria ficado retraído dentro de casa. Eu não fiquei por muito tempo. Eu fiquei até tomar as rédeas, tomar coragem para botar a foto da menina no Facebook e um textão”
Agora casada e mãe, ela recorda que o episódio gerou bastante sofrimento. “Meu pai quase foi parar no hospital. Desmaiou, ficou triste, chorou. Ele foi saber acho que três dias depois porque não tive coragem de falar com ele. Depois, pude conversar com ele, mostrar que não era eu”, conta. Sarah diz que ficou um mês em casa, sem coragem de ir a festas. Tinha vergonha de ir até a reuniões da própria família, uma vez que suas primas acreditaram na postagem e a condenaram. Mas reagiu.
Sarah explica que há muitas diferenças entre ela e a mulher da foto. “A menina era muito parecida comigo, só que tinha muita coisa que mostrava que não era a mesma pessoa. A coxa da menina era imensa. Ela era bombada, fortona. Eu sempre fui do tipo magrinha, nunca tive minha perna grossona. Os dedos do pé da menina eram imensos também, o meu, não. O meu é curtinho. Os dedos da mão dela também eram largos e o meu, não. O cabelo dela vai até o ombro e o meu vai até o bumbum”, diz.
A origem do boato ainda não foi descoberta, mas Sarah destaca que a imagem dela de biquíni e óculos foi tirada de perfis sociais que eram vistos apenas por pessoas do seu círculo de amizade, ou seja, foi pega por uma pessoa conhecida. Na época, ela havia começado o relacionamento com seu atual marido. Por isso, suspeita que essa possa ter sido a causa do atentado à sua imagem. “A única coisa que eu estava fazendo na época que poderia explicar isso que aconteceu foi meu relacionamento. Nunca fiz mal para ninguém”, diz. Se a intenção do boato era provocar um término, no entanto, não surtiu efeito. “Meu marido resolveu me ajudar. Não me abandonou, não me deixou de lado”, afirma.
“A pessoa que fez o crime saiu ilesa. As pessoas só fazem o que fazem porque não vai acontecer nada com elas”
Sarah diz que o boletim de ocorrência foi a única providência que conseguiu obter da polícia. “A polícia não fez nada, não tomou nenhuma atitude. A pessoa que fez o crime saiu ilesa e eu saí com uma mão na frente e outra atrás, enquanto eu pago todos os impostos. As pessoas só fazem o que fazem porque não vai acontecer nada com elas.”
Procurada pelo G1, a Polícia Civil do Pará não dá informações sobre o caso.
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Veja publicação original: Jovem posta BO, faz desabafo e reage após falsa foto de nudez na web: ‘Não dá para baixar a cabeça para esse tipo de coisa’